São Paulo, quinta-feira, 04 de março de 2004

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ARGENTINA

Atual chefe da Armada diz que escola da Marinha foi usada para violações aos direitos humanos indesculpáveis

Militar admite "barbárie" durante ditadura

CAROLINA VILA-NOVA
DE BUENOS AIRES

O chefe da Armada (Marinha) argentina, almirante Jorge Godoy, admitiu ontem que a Esma (Escola de Mecânica da Armada) foi utilizada durante a última ditadura no país (1976-83) "para a execução de atos qualificados como aberrantes e ofensivos à dignidade humana, à ética e à lei".
"Assim como não se pode tapar o sol com a peneira, não se pode encontrar argumentos válidos para negar ou desculpar a ocorrência de atos violentos e trágicos" na Esma, disse Godoy, para quem o lugar se tornou "um símbolo da barbárie e da irracionalidade".
É a primeira vez que um oficial em atividade da Armada faz um "mea culpa" sobre os crimes cometidos na Esma, principal centro de repressão da ditadura. Organizações de direitos humanos estimam que 5.000 pessoas tenham sido torturadas e mortas ou tenham desaparecido no local.
A reação variou da indignação à surpresa. "É um discurso hipócrita e sinistro de um homem que quer lavar uma culpa que nós não perdoaremos", disse em nota a Associação das Mães da Praça de Maio.
"É uma surpresa", disse Nora de Cortiñas, da Mães da Praça de Maio, Linha Fundadora. "É a primeira vez que um militar em atividade fala assim tão abertamente", disse. Ela exigiu resultados concretos nas investigações sobre os crimes cometidos.
As declarações do almirante têm um conteúdo político importante para o presidente Néstor Kirchner, que adotou os direitos humanos como um dos eixos de seu governo. Recentemente, Kirchner anunciou que a Esma será um museu para as vítimas da repressão.
Estima-se que cerca de 30 mil pessoas tenham sido mortas ou desapareceram durante a "guerra suja" - termo usado para descrever a campanha de detenção ilegal, tortura e assassinatos impulsionada pelos militares.
Os crimes cometidos na Esma estão sob investigação judicial no país, em causa reaberta ano passado depois que o Congresso argentino anulou as leis de "Obediência Devida" e "Ponto Final", que anistiava os militares envolvidos em violações aos direitos humanos.


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