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Ex-ministros são "indignos", escreve Fidel
Em artigo, ex-ditador ataca ex-colaboradores Pérez Roque e Carlos Lage um dia após Raúl Castro tirá-los de postos-chave
Ex-líder nega "antifidelismo" em mudança; analistas creem que projeção externa dos afastados pode ter
sido a motivação de Raúl
FLÁVIA MARREIRO
DA REPORTAGEM LOCAL
O ex-ditador convalescente
de Cuba, Fidel Castro, classificou ontem como "indignos" e
seduzidos pelo "mel do poder"
seus outrora íntimos colaboradores Felipe Pérez Roque e
Carlos Lage, removidos respectivamente da Chancelaria e da
função de "premiê de fato" na
ampla reforma de gabinete
anunciada anteontem.
Em mais "reflexão", os textos
publicados ou postados na internet nos quais ele segue opinando sobre a vida na ilha, Fidel rejeitou a tese, endossada
pela maioria dos analistas, de
que as substituições em 12 cargos representem a saída de "fidelistas" para a entrada de uma
equipe mais afim a seu irmão
Raúl, no poder formal desde fevereiro do ano passado.
"A maioria dos substituídos
nunca foi proposta por mim",
escreve o cubano, para depois
afirmar que foi consultado sobre a reforma ministerial. Ataca duramente "os dois mais
mencionados" pela imprensa,
Pérez Roque e Lage. Diz que,
ambiciosos, representaram alimentaram as esperanças "do
inimigo externo". Arremata
com uma exaltação da equipe
de beisebol cubano.
A nota oficial sobre a reforma
ministerial não mencionava
consultas a Fidel sobre as escolhas, tampouco dizia o motivo
porque os "companheiros", um
tratamento respeitoso, haviam
sido "liberados". Não foram indicadas novas funções para os
dois, que seguem integrantes
do Conselho de Estado, o órgão
executivo da ilha.
Pérez Roque, 42, que era
chanceler desde 1999, e Lage,
57, que como secretário do
Conselho de Ministros foi artífice da estratégia econômica na
crise dos anos 90, figuravam na
lista de analistas e diplomatas
como prováveis líderes cubanos pós-Castros.
Pode ter vindo dessa projeção deles fora da ilha, especialmente a do "reformista" Lage, a
razão de suas quedas, diz uma
fonte da diplomacia brasileira
familiarizada com o regime. Ela
lembra que o hermetismo cubano desaconselha análises definitivas. "Lage ser visto como
simpático potencial sucessor
parece ter sido o caminho para
ser queimado internamente."
No caso de Pérez Roque, que
foi secretário pessoal de Fidel e
por essa via subiu na hierarquia
comunista, observadores cubanos enfatizam prática comum
no ex-ditador, a de descartar
ex-colaboradores. "Nunca foi
característica sua ter compromissos sérios. A relação é funcional", diz o sociólogo cubano-dominicano Haroldo Dilla.
"O ex-chanceler antes de Pérez Roque caiu sob as mesmas
acusações. É comum com descartados", diz o dissidente Oscar Chepe, que militou no Partido Comunista até os anos 80.
Raulismo, Chávez, Obama
Apesar dos protestos de Fidel, analistas sustentam que a
reforma do gabinete tem como
marca a chegada de mais "raulistas", entre eles militares, a
funções-chave, independentemente de isso ser recebido ou
não como afronta pelo Castro
mais velho.
"Obviamente, Raúl não passaria por cima de Fidel, não é
uma oposição. Para mim, ele
[Fidel] não sabe mais o que fazer para chamar atenção. Aparece por aí, escreve para dizer
que foi consultado", diz Dilla.
Para o sociólogo, a saída de
Lage e Pérez Roque põe em
questão dois fatores: 1) a consolidação do pacto de poder feito
pelo general Raúl, com a união
entre militares -sua poderosa
base- e a parte mais dura do
partido; 2) e a retirada de cena
de atores ativos na relação com
o aliado Hugo Chávez.
Dilla diz que foi um acerto de
contas entre facções. Dada a
aliança que fez, Raúl pôde prescindir dos "jovens", quer pragmáticos como Lage, quer dogmáticos como o ex-chanceler.
"Mas o mais importante é a
relação com Chávez. Agora,
Raúl vai lidar diretamente com
ele, e não os dois que deram
mostras de submissão." O sociólogo cita declarações de Lage e a aparição de ambos com
camisas "bolivarianas vermelhas", para agradar Caracas.
A fonte diplomática brasileira corrobora a impressão de
que os dois afastados eram vistos como próximos demais de
Caracas, mas frisa que a gestão
Raúl não pretende nem pode se
afastar da Venezuela. Diz que
não é segredo que Raúl tem menos química com Chávez do
que Fidel. O venezuelano não
comentou as mudanças.
Para Dilla, o novo chanceler
Bruno Rodríguez, 51, que era
vice na pasta, pode ajudar na
relação com o governo Barack
Obama. "Parece uma boa escolha. Ele serviu em Nova York,
fala inglês, tem contatos lá."
Leia o artigo de Fidel Castro
www.folha.com.br/090624
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