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ENTREVISTA
Presidente do Senado, Mironov refuta acusação de que democratização falhou no país e prevê boas relações com Brasil
Rússia é livre graças a Putin, diz líder político
Mladen Antonov - 12.mar.2004/France Presse
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Homem passa por retrato do presidente Vladimir Putin em foto feita antes da eleição, em março |
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
Quando publica seus manifestos, a imprensa oposicionista não
percebe que fala de uma Rússia
antiga, na qual o dinheiro roubado era a base do Estado e da sociedade. Mas, graças ao presidente
Vladimir Putin, a Rússia tornou-se um país livre e democrático.
A afirmação é de Serguei Mironov, 51, presidente do Conselho
da Federação (Câmara Alta do
Parlamento da Rússia), terceiro
homem na hierarquia de poder
do país e candidato à Presidência
na eleição ocorrida em meados do
mês passado.
Segundo analistas, ele entrou na
disputa para evitar que seu amigo
Putin se tornasse candidato único
caso os outros abandonassem a
competição eleitoral.
Leia a seguir trechos da entrevista que Mironov concedeu à Folha, anteontem, num hotel da zona oeste de São Paulo. Ele termina
hoje sua visita oficial ao Brasil.
Folha - Quais são os maiores problemas russos, que Putin terá de
resolver em seu segundo mandato?
Serguei Mironov - Infelizmente,
a Rússia tem muitos problemas
atualmente. Quando foi eleito
presidente pela primeira vez, em
2000, Putin estabeleceu as principais direções de suas políticas externa e interna. Foi por conta dessa definição que ele pôde obter
uma vitória indiscutível na última
eleição, na qual 71% dos eleitores
escolheram dar-lhe um segundo
mandato. Isso significa que os objetivos do presidente são bem claros aos olhos do eleitorado.
Folha - Quais são, então, os objetivos da política interna de Putin?
Mironov - O primeiro -e mais
importante- objetivo de Putin é
melhorar a qualidade de vida da
população. O Ministério do Desenvolvimento Econômico, o das
Finanças e o das Questões Sociais
já receberam instruções precisas
nesse sentido, pois o presidente
lhes deixou claro que se trata de
seu principal objetivo.
Assim, eles sabem que sua grande tarefa é melhorar o modo como vive a população russa. Por
exemplo, num prazo de no máximo três anos, o número de pessoas que vivem abaixo da linha da
pobreza deverá cair 60%, segundo
as diretivas de Putin.
Outra prioridade é dobrar o PIB
[total de riquezas produzidas no
país] até 2008. O presidente também pretende dar continuidade à
reforma administrativa que já
vem sendo feita na Rússia. A reforma das Forças Armadas é outro objetivo de Putin. Há ainda
uma série de outros pontos, porém esses são os principais.
Folha - Como fazer para dobrar o
PIB até 2008 se a economia russa é
dependente do preço internacional
do petróleo e do gás natural e se seria impossível dobrar sua capacidade de produção em pouco tempo?
Mironov - Trata-se de uma ótima
pergunta. A solução passa por
uma modificação das estruturas
da economia da Rússia, buscando
fugir a essa forte dependência de
recursos naturais. É necessário,
portanto, uma significativa elevação do peso dos produtos de alta
tecnologia na economia russa.
Acreditamos que isso seja possível sobretudo no âmbito da indústria militar russa, pois, atualmente, existe um número muito
alto de pessoas de bom nível educacional que já trabalham no setor militar. A tecnologia de ponta
é a solução de nossos problemas.
Afinal, o PIB só poderá ser duplicado se dermos ênfase ao setor
da alta tecnologia. Mesmo que
conseguíssemos dobrar nossa
produção de petróleo em tão pouco tempo, isso não seria suficiente
para dobrar o PIB [que, em paridade de poder de compra, foi de
cerca de US$ 1,4 trilhão em 2002].
Folha - Muitos especialistas ocidentais afirmam que a democratização fracassou na Rússia, visto
que seu governo está se tornando
cada vez mais autoritário. Qual é
sua opinião a esse respeito?
Mironov - Não concordo com isso. A Rússia é um país livre e democrático. Por exemplo, a liberdade de imprensa é garantida pela
Constituição russa. É claro que, às
vezes, podemos não gostar de algumas publicações da imprensa
oposicionista. Quero salientar
que ela existe na Rússia. Porém
não podemos fechar esses meios
de comunicação porque a Constituição estabelece que a liberdade
de imprensa deve ser respeitada.
Por exemplo, [Boris] Berezovsky [empresário de mídia que
era próximo do Kremlin e hoje está exilado], que gosta de dizer que
é inimigo de Putin, publica seus
artigos na imprensa russa com
certa freqüência, afirmando que a
democratização falhou na Rússia.
Aliás, é importante para Berezovsky que Putin seja visto como
seu inimigo. Evidentemente, todavia, o presidente não lhe dá
muita atenção. O problema é que,
quando publica seus manifestos
na imprensa russa, Berezovsky
não percebe que fala de uma Rússia antiga, na qual o dinheiro roubado era a base do Estado e da sociedade. Graças a Putin, contudo,
a Rússia mudou e transformou-se
num país livre e democrático.
Quando um presidente se reelege com 71% dos votos, fica claro
que ele trabalha pela democracia
e que isso é reconhecido pela população. Caso contrário, ele não
seria apoiado por tanta gente.
Folha - Não há, portanto, uma
campanha de cerceamento do trabalho da imprensa na Rússia?
Mironov - De jeito nenhum! O fato de as pessoas poderem falar sobre o tema mostra que essa acusação não é verdadeira. Quem violou as leis russas e teve de fugir do
país por conta disso diz coisas que
não têm base na realidade.
Vale lembrar que pessoas como
Berezovsky e [Vladimir] Gusinsky [outro empresário de mídia] estão fora do país hoje por
causa de suas atividades ilícitas.
Se houvesse uma campanha contra a liberdade de imprensa, eu seria o primeiro a denunciá-la.
Folha - Como o Brasil e a Rússia
poderão estreitar suas relações?
Mironov - Até alguns anos atrás,
os países mais desenvolvidos ou
promissores eram os EUA, a Rússia, a China e a Índia. Hoje, porém, as coisas evoluíram por conta do desenvolvimento político-econômico do Brasil e da consolidação da União Européia. Vivemos um momento em que os líderes regionais são vitais.
Assim, a Índia, a China, a Rússia, o Brasil e a África do Sul ganharam bastante força na cena internacional. O século 21 permitirá
que a Rússia fortaleça suas relações com os outros líderes regionais. Temos relações históricas
com a Índia e com a China e estamos aprofundando nossa ligação
com o Brasil. Minha visita ao Brasil e a de Putin em novembro ajudarão a fortalecer nossas relações.
Há vários pontos que nos unem,
como a construção de aviões, a
exploração pacífica do espaço e a
ampliação de nossas capacidades
energéticas. Além disso, nossos
povos têm um modo de pensar
bastante semelhante.
Folha - Sua visita tem ligação com
a intenção do Brasil de comprar caças para suas Forças Armadas?
Mironov - Não, trata-se de algo
que já estava planejado. Mas, se
resolver comprar os aviões russos, o Brasil não cometerá um erro. O Brasil e a Rússia vão surpreender o mundo neste século.
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