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AMÉRICA LATINA
Capital vai punir camelôs, flanelinhas e grafiteiros; para opositores da medida, ela criminaliza a pobreza
Cidade do México adota "tolerância zero"
FERNANDO CANZIAN
ENVIADO ESPECIAL À CIDADE DO MÉXICO
A Cidade do México adotará em
dois meses um dos mais duros regimes de "tolerância zero" em todo o mundo.
A nova lei prevê prisões e multas para guardadores de carros,
para menores que limpam vidros
de automóveis em semáforos, para pessoas que vendem serviços
irregulares e para grafiteiros.
Prostitutas e seus clientes também estarão sujeitos às regras.
A Comissão de Direitos Humanos do Distrito Federal, onde fica
a Cidade do México, afirmou que
a medida significará a "criminalização da pobreza" na cidade.
A lei foi aprovada na sexta-feira
pela Assembléia Legislativa por
32 votos contra 25 e deu prazo de
60 dias para que as autoridades se
preparassem para aplicá-la em toda a cidade, de cerca de 18 milhões
de habitantes.
As novas regras foram discutidas e votadas por sugestão da
consultoria Giuliani Group, do
ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani (1994-2002), contratada há mais de um ano pelo
megaempresário mexicano Carlos Slim para dar assessoria à administração local.
Giuliani foi o implementador de
uma política bem-sucedida de redução de criminalidade em Nova
York, conhecida como "tolerância zero" -o registro de violência
caiu pela metade em seu primeiro
mandato.
Slim, 64, por sua vez, é o homem
mais rico da América Latina e dono da Telmex, que acaba de adquirir a brasileira Embratel.
O empresário é dono de dezenas de projetos imobiliários e de
restaurantes na Cidade do México
e está à frente de um enorme projeto de recuperação do centro velho da capital mexicana.
A nova lei dobrou para 43 o número de "faltas administrativas"
que poderão ser objeto de punições das autoridades locais.
A Secretaria da Segurança Pública da capital será a responsável
por reprimir comportamentos
corriqueiros na cidade e que garantem a subsistência de milhares
de pessoas.
As penalidades vão variar de
multas de dez salários mínimos
diários (o salário mínimo na Cidade do México é equivalente a
R$ 11,6 por dia) à detenção por
períodos entre seis e 36 horas, dependendo da infração.
Com base na nova lei, todos os
infratores serão fichados. Em caso
de reincidência, a punição automática será a detenção, em regime de incomunicabilidade, por
um período mínimo de 36 horas.
As autoridades locais vêm sendo pressionadas nos últimos meses por setores empresariais para
reprimir a criminalidade e o assédio constante de pedintes e vendedores na Cidade do México.
Nos semáforos da cidade, dezenas de jovens e crianças simplesmente saltam sobre os capôs dos
veículos para limpar os pára-brisas em troca de alguns pesos.
Há flanelinhas por todos os cantos e dezenas de pessoas (os
"coiotes") oferecendo serviços irregulares, de transportes ao
preenchimento de formulários.
Outra ação também deverá
"limpar" o centro histórico da cidade da ação de camelôs, que serão deslocados para algumas galerias subterrâneas, hoje abandonadas, a três metros abaixo do nível do solo.
Fernando Coronado, diretor-geral da Comissão de Direitos
Humanos do Distrito Federal,
disse à Folha que a nova lei "criminalizará condutas antes toleradas".
"A medida afetará pessoas que
não produzem vítimas e não se
encaixa em um regime democrático", disse Coronado. Ele estima
em cerca de 15 mil o número de
jovens de até 18 anos que atuam
nas ruas da cidade.
Embora conte com uma taxa de
homicídios por 100 mil habitantes
equivalente a menos da metade
da registrada em São Paulo, a Cidade do México é temida pela freqüência de assaltos e, principalmente, de seqüestros.
Aos turistas, por exemplo, há a
recomendação de somente tomarem táxis em locais específicos, já
que "motoristas piratas" em carros com as cores regulares recolhem passageiros pela cidade para
roubos e seqüestros.
Apesar do rigor da nova lei, o
policiamento na Cidade do México não é ostensivamente percebido, e a polícia é considerada corrupta e temida por muitos. O desrespeito às leis de trânsito é generalizado e o acúmulo de lixo é desconcertante.
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