São Paulo, sexta-feira, 04 de setembro de 2009

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Ataques com seringas fazem ressurgir crise étnica na China

Dois meses após conflitos que mataram 197, chineses voltam às ruas em protesto

Cidadãos pedem renúncia do secretário-geral do PC em Xinjiang após relatos de que 476 pessoas foram alvos de ataques na Província


RAUL JUSTE LORES
DE PEQUIM

Cerca de 2.000 chineses da maioria étnica han protestaram ontem nas ruas de Urumqi, capital da Província de Xinjiang, após uma nova onda de violência étnica. Os manifestantes alegam que centenas de pessoas foram atacadas com seringas nos últimos dias.
Segundo a TV estatal de Xinjiang, 476 pessoas foram atacadas com seringas, mas o governo chinês não confirma o dado. Quinze pessoas foram presas. O jornal "China Daily" diz que ninguém foi contaminado ou envenenado nos ataques.
Há dois meses, na mesma cidade, 197 pessoas foram mortas em confrontos entre han e a minoria muçulmana uigur.
Na manhã de ontem, os manifestantes portavam bandeiras chinesas, pediam mais segurança e "punição severa aos baderneiros". Também exigiram a renúncia do secretário-geral do Partido Comunista na Província, Wang Lequan, o homem mais poderoso de Xinjiang, há 15 anos no cargo.
Protestos e violência acontecem a menos de um mês do principal evento do ano na China, a comemoração dos 60 anos da chegada ao poder do Partido Comunista, em 1º de outubro.
A violência étnica estourou em julho, após o assassinato de jovens uigures em uma fábrica no sul da China.
Após perder o emprego, um colega da maioria han espalhou boato de que uigures estavam estuprando chinesas. Ao menos dois uigures foram mortos em um linchamento na fábrica.
Um mês depois, centenas de uigures protestaram em Urumqi contra a falta de investigação ou punição por parte do governo chinês das mortes dos uigures. A polícia reprimiu a passeata, e a situação saiu do controle.
Relatos de testemunhas dizem que centenas de uigures se uniram aos manifestantes e começaram a atacar com facas e porretes qualquer chinês han que vissem pelas ruas.
No dia seguinte, milícias de chineses retribuíram, matando uigures e destruindo suas lojas.
Houve toque de recolher por vários dias, inclusive com feriado e proibição de tráfego de carros nas ruas de Urumqi. Desde então, a maior parte dos serviços de internet na região está bloqueada. Cerca de 200 pessoas foram presas e aguardam julgamento.
Os uigures reclamam que não têm as mesmas possibilidades econômicas dos chineses, que são enviados para lá aos milhares pelo governo central. Muitos nem sequer falam o mandarim -90% dos uigures vivem na zona rural, longe da bonança que acontece em Urumqi, graças à indústria do gás e do petróleo em Xinjiang.
Como no Tibete, há dezenas de acusações de falta de liberdade religiosa e de discriminação por parte de Pequim.
Nos últimos anos, algumas políticas governamentais aumentaram a divisão étnica. Funcionários públicos uigures são proibidos de usar barba ou véu. O centro histórico de Kashgar, a principal cidade uigur, começou a ser destruído em março "por questões de segurança e fragilidade dos prédios", segundo o governo chinês. Uigures no exílio chamam de genocídio cultural.
Já os han reclamam das ações afirmativas do governo, que permitem aos uigures ter mais de um filho por família e lhes garantem mais vagas nas universidades.
Até 1950, 90% da população de Xinjiang era uigur. Hoje, são 45%. Na capital, os han já se transformaram em maioria -são 70% da população.


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