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ARTIGO
Popularidade e prazo de validade
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
O plebiscito de domingo na
Venezuela parece demonstrar
que popularidade é como desodorante: tem prazo de validade.
Esgotado o prazo, cheira mal.
Vale para a Venezuela, vale
para o Brasil, dada a simetria
entre os amigos-rivais Hugo
Chávez e Luiz Inácio Lula da
Silva: Chávez mantém elevada
popularidade, mas a tentativa
de manter-se indefinidamente
no poder foi derrotada -resultado improvável nas circunstâncias em que se votou.
Lula também tem bom índice de popularidade, mas dois de
cada três eleitores, conforme o
Datafolha publicado domingo,
preferem que ele fique dentro
do prazo de validade constitucional, no caso 2010.
Bem feitas as contas, o resultado do plebiscito de ontem é
um dos poucos em que a votação não se deu com o bolso.
Fosse pelo bolso, Chávez teria
conseguido fazer passar a sua
Constituição. A Venezuela
cresceu à média de 9,5% ao ano
nos três anos mais recentes, índice mais que asiático.
Desempenho ainda mais impressionante quando se considera que, nos anos 80 e 90, o
país havia sido o de maior retrocesso na América Latina,
com uma queda na altura de
40%. Nesse período, governaram os que hoje estão na oposição e pediram o voto "não".
Mais: desde que Hugo Chávez chegou ao poder, em 1999, a
pobreza reduziu-se de 42,8%
para 33,9% no ano passado.
Perder nessas circunstâncias
é um desastre formidável, para
qualquer governante. Muito
mais ainda para um líder com
nítidas tendências messiânicas
e megalomaníacas.
Considerado o desempenho
econômico e social da gestão
Chávez, só se pode atribuir a
sua derrota ao apreço pela democracia de parte do eleitorado venezuelano.
Não por acaso os venezuelanos ficaram em terceiro lugar,
empatados com os bolivianos,
no mais recente "Latinobarómetro", o melhor metro para
medir os humores dos latino-americanos.
Sessenta e sete por cento deles acreditam que "a democracia é preferível a qualquer outro tipo de governo". À frente
da Venezuela, apenas Costa Rica e Uruguai. No Brasil, só 43%
cravam idêntica resposta.
Chávez tentou argumentar
-exatamente como o fez seu
colega brasileiro Luiz Inácio
Lula da Silva- que o espanhol
Felipe González ficou 14 anos
no poder e, Tony Blair, dez,
"sem que ninguém os chamasse de ditadores. Por que eu não
posso fazê-lo? Porque aqui somos negros ou índios?".
O eleitorado venezuelano
não comprou a tese, aliás falaciosa, na medida em que Blair e
González governaram no parlamentarismo, com sistemas de
controle diferentes do presidencialismo -e diferentes da
situação venezuelana, em que
Chávez assumiu poderes sem
os contrapesos normais mesmo no presidencialismo.
Que o resultado foi determinado por esse excesso de poder
fica fácil de deduzir a partir dos
novos atores no campo oposicionista. Primeiro, o partido
"Podemos", que era chavista
até recusar-se a se dissolver no
Partido Socialista Unido da Venezuela, que Chávez criou.
Depois, os estudantes, que se
transformaram nos principais
agentes oposicionistas, movidos a tal exatamente pelo excesso de poderes em mãos do
presidente. Por fim, um general, Raúl Baduel, que foi essencial para reverter o golpe de
2002 contra Chávez, levado a
cabo pela direita retrógrada.
Voltando à simetria Lula/
Chávez, o resultado na Venezuela tende a representar o último prego no caixão do terceiro mandato para Lula, se é que
os lulistas interessados nele
prestam atenção aos fatos, o
que é discutível.
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