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Decisão do TPI abre precedente global
Mandados anteriores de prisão contra chefes de Estados no poder partiram de tribunais temporários
Processo contra Bashir foi acompanhado por aumento da violência em Darfur; crise pode pôr em xeque primeira eleição geral desde 1986
DA REDAÇÃO
O mandado de prisão contra
o ditador sudanês Omar al Bashir é um ponto de virada na
Justiça internacional, que traz
uma nova dinâmica política
com consequências imprevisíveis. Vista como uma ameaça à
estabilidade regional pela
União Africana (UA) e a Liga
Árabe, a decisão foi celebrada
por ativistas humanitários.
A decisão do Tribunal Penal
Internacional (TPI) introduz
um elemento inédito de responsabilização de governantes
em uma corte permanente, disse Reed Brody, da Human
Rights Watch -em casos anteriores, como o do sérvio Slobodan Milosevic, o mandado de
prisão foi expedido por tribunais especiais e temporários.
Rechaçada por Cartum, a decisão do TPI não será cumprida
imediatamente, mas torna o
governo de Bashir insustentável a longo prazo.
Há quase duas décadas no
cargo, o ditador sudanês tem
poderes limitados, afirmaram
analistas ouvidos pela Folha.
"Não é um governo de um homem só. O poder é compartilhado com os militares", afirmou Brody, que prevê um acirramento da disputa entre setores pragmáticos e os de linha
dura, liderados por Bashir.
A divisão de poderes no governo pode ser um atenuante
para Bashir -que, segundo alguns analistas, teve participação direta limitada no conflito
de Darfur. Cartum tem buscado afastar-se das milícias árabes Janjaweed, armadas pelo
regime para resistir aos rebeldes de Darfur. O líder da milícia está detido.
Para Fouad Hikmat, especialista em Sudão do Internacional Crisis Group, o governo terá de responder a pressões internas e regionais que podem
agravar a instabilidade no Sudão. "O processo contra Bashir
provocou uma reação em cadeia. Todos os grupos insurgentes querem estar em posição de força para negociar a
paz", disse Hikmat.
Conflagrada há seis anos
apesar das iniciativas de paz, a
região de Darfur enfrentou nos
últimos meses um recrudescimento da violência, com ataques à Unamid, missão de paz
conjunta da ONU e da UA.
A crise diplomática coloca
em suspensão o futuro da missão, estabelecida em 2007. A
Unamid esforçava-se para
manter relação cordial com
Cartum, o que lhe custou a hostilidade de facções do Exército
de Libertação do Sudão e do
Movimento Justiça e Igualdade -principais grupos rebeldes
da Darfur, cindidos por divergencias internas.
Com menos da metade dos
31 mil homens previstos, a
Unamid falhou em conter a
violência, mas é considerada
essencial para a segurança e
credibilidade das eleições gerais sudanesas, previstas para
julho de 2009 -as primeiras
desde 1986.
O cerco a Bashir deve realçar
divisões no regime. O ditador,
que chegou ao poder em 1989
com apoio de militares e islamistas, enfrentou a dissidência
de líderes islâmicos do sul do
país, insatisfeitos com a concentração de poder e renda pelos sudaneses de língua árabe.
"Mas Bashir continua em posição de poder no governo,
mesmo porque seus prováveis
sucessores são alvos potenciais
do TPI", ressalvou Brody. O
TPI já decretara a prisão do ministro sudanês de Direitos Humanos, Ahmed Haroun, por
crimes em Darfur. Mesmo foragido, ele foi indicado para o
comitê que monitora a Unamid.
(CLARA FAGUNDES)
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