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Quem não quer não fica no Mercosul, diz Lula
Presidente reage com conformismo à ameaça de Chávez de deixar bloco, mas faz defesa da participação da Venezuela
Lula afirma em Lisboa que
a relação com Caracas é "extraordinária" e que vai discutir problemas em conversa com venezuelano
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LISBOA
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu
com conformismo ao
"ultimato" de seu colega venezuelano, Hugo
Chávez, aos Congressos brasileiro e paraguaio para que aprovem até setembro a
entrada da Venezuela no Mercosul,
sob pena de solicitar a retirada
do pedido de ingresso no bloco.
"Para entrar [no Mercosul] tem
que ter regras, mas para sair
não tem regras. Quem não quer
ficar não fica", disse Lula.
Não escondeu que prefere
que a Venezuela fique. Primeiro, ao qualificar de "extraordinária" a relação do Brasil com a
Venezuela, citando o gasoduto
que se pretende construir,
"atravessando toda a América
do Sul", e os projetos conjuntos
entre as estatais Petrobras e
PDVSA para a construção de
refinarias em ambos os países.
Depois, o presidente brasileiro afirmou que "acabou o tempo em que ganhávamos algo de
costas um para o outro".
Lula não quis estabelecer um
debate via mídia com seu colega venezuelano. Preferiu jogar
os esclarecimentos para uma
conversa pessoal com Chávez.
"Não faltará tempo e conversa
para saber o que está acontecendo de verdade", disse Lula.
Lamentou que essa conversa
não pudesse ter sido feita na recente reunião de cúpula do
Mercosul, no Paraguai, pela ausência de Chávez -que estava
em viagem à Rússia.
Mas o presidente brasileiro
teve que ouvir uma dura crítica
do presidente da Comissão Européia, o português José Manoel Durão Barroso, à não-renovação da concessão do canal
RCTV pelo presidente Chávez.
"Nós defendemos em qualquer parte do mundo a liberdade de expressão. Sempre que há
uma redução do pluralismo, temos o direito e o dever de expressar nossa preocupação",
disparou Barroso durante a entrevista coletiva de encerramento da 1ª Cúpula Brasil/União Européia.
A portas fechadas, Lula e seu
chanceler, Celso Amorim, fizeram uma exposição sobre o
processo de integração sul-americano, durante a qual defenderam a participação venezuelana. Amorim lembrou que
a diversidade de opiniões enriquece o processo, citando o
exemplo da própria Europa, em
que há freqüentes divergências
entre os 27 países que fazem
parte do bloco europeu.
Na véspera, Amorim havia sido criticado por Chávez, que
considerou "impertinente" a
sugestão do chanceler para que
ele fizesse "um gesto" em direção ao Congresso brasileiro, para dissolver o mal-estar que
causou ao chamar o Parlamento de "papagaio" dos EUA.
É a primeira vez que Chávez
critica diretamente um membro do governo Lula. Até então,
as críticas eram ou ao Congresso (que tem forte maioria lulista) ou a uma difusa "direita"
que supostamente estaria interessada em bloquear a entrada
da Venezuela no Mercosul.
Coincidência ou não, Amorim ontem ficou longe das vistas dos jornalistas o dia todo, o
que não é habitual nele.
Na reunião com Lula, os europeus não fizeram exatamente uma cobrança sobre a Venezuela, mas o premiê português,
José Sócrates, não deixou de
observar, com uma pitada de
ironia, que ele e Durão Barroso
conhecem bem o Brasil, o suficiente para saber que não se fazem no país há algum tempo
discursos como "os que temos
ouvido de outros governantes".
Os europeus perguntaram
também sobre as relações Brasil/Cuba. Explica-se a curiosidade: está começando um tímido processo de diálogo entre a
União Européia e Cuba, e é natural que o bloco europeu queira ouvir um governante como
Lula com antigas relações com
a ilha caribenha.
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