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Venezuela e Irã lucram com elo ideológico
Chávez e Ahmadinejad anunciam 200 convênios que totalizam US$ 9 bi em vários setores; Ortega e Morales seguem exemplo
Negócios e parcerias que vão de fábricas de bicicletas a de laticínios surgiram de afinidade geopolítica, mas laço entre líderes é criticado
FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS
Enquanto projetos regionais
como o Gasoduto do Sul emperram, a Venezuela e o Irã
vêm inaugurando empreendimentos bilionários e anunciando outros em ritmo alucinante,
numa parceria em que motivações geopolíticas aparentam
predominar sobre o cálculo
econômico.
Somente neste ano, foram
inauguradas na Venezuela uma
empresa estatal de laticínios e
outra de plástico, ambas construídas com tecnologia iraniana, e uma fábrica de automóveis de capital misto.
Outros projetos binacionais
estão sendo implantados, entre
os quais a construção de 7.000
casas populares, além de fábricas de cimento, suco, pólvora,
ônibus e até de bicicleta.
Também há projetos do outro lado do Atlântico. O presidente Hugo Chávez fez a sua
sexta visita ao Irã no início de
julho para inaugurar uma fábrica petroquímica de capital misto. A planta, em Asaluyeh (sul),
tem capacidade para produzir
anualmente 1 milhão de toneladas de metanol (solvente industrial). Uma fábrica semelhante está em construção em
Sucre, leste da Venezuela.
Caracas também foi a quem o
Irã recorreu em julho para contornar seu problema de racionamento de gasolina -rico em
petróleo, o país tem pouca capacidade de refino. Chávez
concordou em exportar o produto, mas o volume e o preço
estão sob sigilo.
Ao todo, os dois países já assinaram cerca de 200 convênios,
envolvendo ao menos US$ 9 bilhões, segundo declaração recente do vice-ministro iraniano para a Pequena Indústria,
Mohsen Shaterzadeh.
O maior símbolo da aproximação entre os dois países é o
vôo semanal da estatal venezuelana Conviasa entre Caracas e Teerã, com escala em Damasco (Síria). Ridicularizado
na época de seu lançamento,
em março, a rota é um sucesso
de vendas: na sexta-feira, só havia assentos disponíveis a partir do dia 6 de outubro, a maioria tomada por funcionários
dos dois governos.
"Irmão ideológico"
A aliança com Irã talvez seja
a mais bem-sucedida do esforço de Chávez para se aliar com
países diplomaticamente mais
distantes dos EUA, como a Rússia, seu principal fornecedor de
material bélico, e a China, interessada nas imensas reservas
de petróleo venezuelanas.
Nenhuma dessas aproximações, no entanto, repete a química entre Chávez e o colega
iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, a quem chama de "irmão
ideológico". E seus principais
aliados na região parecem seguir o mesmo rumo: o presidente nicaragüense, Daniel Ortega, esteve em Teerã em junho, e o boliviano Evo Morales
fará o mesmo em setembro.
"A aliança se baseia em se
aproximar de países que têm o
interesse de minar a influência
americana em suas regiões",
disse à Folha o cientista político americano Daniel Hellinger,
especialista em Venezuela.
Para o analista, a aliança econômica faz sentido na medida
em que são países que têm uma
visão nacionalista sobre a produção de petróleo. Hellinger,
no entanto, critica a relação
pessoal entre Chávez e Ahmadinejad -que costuma negar o
Holocausto judaico e mantém
um criticado programa nuclear
sancionado pela ONU.
"É perfeitamente razoável
para a Venezuela construir relações cordiais com o Irã, mas a
relação pessoal entre Chávez e
Ahmadinejad é outra questão.
Tenho muito mais simpatia pelos palestinos do que por Israel,
mas ao mesmo tempo Ahmadinejad foi muito além de qualquer declaração razoável ao falar sobre o Holocausto."
Durante dez dias, a Folha
reiterou diversas vezes um um
pedido de entrevista com o vice-ministro venezuelano para
o Oriente Médio, Vladimir Villegas, mas não teve resposta.
Na Venezuela, a aliança com
Irã sofre duras críticas da oposição. "É um país que de alguma maneira financia grupos
terroristas e, dessa perspectiva,
não é bom ver Caracas associada a um governo que tem uma
claríssima má imagem no cenário internacional", diz Timoteo Zambrano, porta-voz do
Um Novo Tempo (UNT), principal partido opositor.
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