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ARTIGO
Estratégia para uma América dividida
CHARLES A. KUPCHAN
PETER L. TRUBOWITZ
DA "FOREIGN AFFAIRS"
Uma brecha perigosa se
abriu entre os compromissos
globais dos EUA e a vontade política necessária para mantê-los. Como deixou claro o choque do presidente George W.
Bush com o Congresso sobre o
Iraque, republicanos e democratas não mais dividem uma
visão comum sobre como os
EUA devem agir no mundo.
Se isso for ignorado, os alicerces políticos da arte americana de governar vão continuar
a se desintegrar, expondo o país
aos perigos de uma política externa errática e incoerente.
Achar um novo ponto de equilíbrio que alinhe os compromissos do país com seus meios políticos talvez seja o maior desafio para o próximo presidente.
Durante boa parte da Guerra
Fria, a política partidária não
ultrapassou a linha que dividiria democratas e republicanos.
Ambos tinham um ponto comum no liberalismo internacional, uma linha de governo
que se baseava no poder e nas
parcerias. Os EUA não hesitavam em projetar seu poder no
exterior, mas preferiam garantir a defesa de seus interesses
via cooperação internacional.
Esse acordo ruiu. Hoje, republicanos e democratas defendem ou o poder ou as parcerias,
mas -e isso é importante- não
as duas coisas juntas. A maioria
dos republicanos no Congresso
crê que a segurança dos EUA
dependa sobretudo da posse e
do uso do poderio militar e
apóia firmemente o esforço do
governo Bush no Iraque. Já para os democratas, a promoção
dos interesses dos EUA depende mais da diplomacia multilateral do que da coerção militar.
Eles estão à procura de uma
porta de saída do Iraque.
A crescente brecha entre os
dois partidos se evidencia no
público. Pesquisa recente revelou que, para 70% dos eleitores
republicanos, "a melhor forma
de garantir a paz é pelo poderio
militar". Só 40% dos eleitores
democratas compartilharam
essa visão, sendo que a maioria
deu preferência à diplomacia
em lugar do uso da força.
Alimentado por essas divisões ideológicas, o sectarismo
crescente vem dominando
Washington. De acordo com
um índice largamente usado, o
Congresso está mais polarizado
hoje do que esteve em qualquer
momento dos últimos cem
anos. Esse confronto partidário
constitui uma receita para a paralisia no âmbito doméstico e a
liderança fracassada no exterior. A arte de governar americana corre o risco de oscilar de
maneira incoerente entre alternativas distintas e totalmente opostas. O impasse doméstico pode até despertar o sentimento isolacionista, como fez
na década de 1930.
Foco
Restaurar a solvência política exigirá a redução dos compromissos americanos e sua
adequação a recursos menores,
além de barganhas políticas
que superem rixas partidárias.
É esse o caminho para a segurança. É melhor para os EUA
uma estratégia maior mais discernidora, que goze de apoio
doméstico, do que uma polarização autodestrutiva.
Para isso é preciso deixar que
blocos regionais como a União
Européia, o Conselho de Cooperação do Golfo e a União
Africana arquem com uma parte maior da defesa, além de refrear os adversários pelo diálogo, usando a diplomacia inteligente para amainar a competição com rivais como a China.
Na luta contra o terrorismo, os
EUA devem focar a destruição
das redes terroristas e, ao mesmo tempo, usar meios políticos
e econômicos para fazer frente
às fontes perenes de instabilidade no Oriente Médio.
Os EUA devem favorecer as
parcerias pragmáticas mais do
que as instituições rígidas.
Agrupamentos informais, como o Quarteto para o Oriente
Médio, emergem como os veículos mais eficazes para a diplomacia. Num clima polarizado, menos é mais: trabalho de
equipe, esforços coordenados
flexíveis e coalizões para a realização de tarefas específicas
precisam tornar-se as bases de
uma nova arte de governar.
Será preciso reforçar o apoio
público a uma visão nova, mesmo que mais modesta, do papel
dos EUA no mundo. O bipartidarismo não garante uma diplomacia eficaz, mas a boa liderança requer a capitalização de
oportunidades para que democratas e republicanos identifiquem objetivos comuns. Os democratas talvez se dispusessem a apoiar o livre comércio se
os republicanos topassem investir em programas para treinar funcionários. O acesso das
grandes empresas a mão-de-obra barata pode ser coerente
com o lobby pró-imigração.
O candidato que compreender a urgência de um novo
equilíbrio entre os objetivos
dos EUA e seus meios políticos
terá condições de colher uma
recompensa dupla: ele ou ela
provavelmente atrairia apoio
popular e, se eleito, fortaleceria
a segurança americana com
uma política externa que não só
satisfizesse as necessidades
geopolíticas do país mas também restaurasse a solvência política necessária para uma estratégia nacional coerente.
CHARLES A. KUPCHAN é professor da Universidade Georgetown e membro do Council on Foreing Affairs. PETER L. TRUBOWITZ é professor
na Universidade do Texas em Austin e membro
do Centro Robert S. Strauss de Segurança e Direito Internacional
Tradução de CLARA ALLAIN
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