São Paulo, sexta-feira, 05 de agosto de 2011

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MOISÉS NAÍM

Interpretação errada dos EUA


Wall Street, Vale do Silício, universidades e outras fontes de onde emana o poder continuam sólidas

DE ACORDO com o comentarista Christopher Hitchens, "a crise financeira dos EUA é o exemplo mais recente da tendência que ameaça colocar esse país no nível de Zimbábue, Venezuela ou Guiné Equatorial". Não, contra-ataca Nicholas Kristof, influente colunista do "New York Times": "É a má distribuição da renda que põe os EUA no mesmo nível de repúblicas de bananas como Nicarágua, Venezuela ou Guiana". Nada disso, afirma Vladimir Putin: "O que acontece é que os Estados Unidos são um parasita que vive à custa da economia global".
Para Mitt Romney, pré-candidato presidencial republicano, o problema é que "os EUA estão a ponto de deixar de ser uma economia de mercado". E Barack Obama lamenta que seu país "não tenha um sistema político AAA, condizente com seu crédito AAA".
Nos últimos dias, vem sendo demasiado fácil concluir que os EUA são um desastre e não poderão continuar a ser o país mais poderoso do mundo. Para quem ainda tinha dúvidas, o vergonhoso processo de negociação sobre o limite da dívida foi a confirmação final: a superpotência se encontra em queda livre.
Essa conclusão, que parece tão óbvia, está errada. Por pelo menos quatro razões.
Primeiro: Wall Street, o Pentágono, Hollywood, o Vale do Silício, as universidades e outras fontes de onde emana o poder americano continuam sólidas. Haverá cortes orçamentários que afetarão setores como as Forças Armadas. Mesmo assim, a vantagem atual dos EUA nesses setores sobre rivais de outros países é tão enorme que os cortes não o tirarão do primeiro lugar mundial.
Exemplo: só a frota da Guarda Costeira dos EUA tem mais navios que todas as embarcações das 12 maiores Marinhas de guerra do globo. Não é em vão que os EUA gastam mais com a defesa que o resto do mundo. As demais fontes de poder dos EUA enfrentam mais competidores, mas sua vantagem sobre seus rivais também é imensa.
Segundo: o poder absoluto não importa. O que importa é o poder relativo aos rivais. Embora os EUA possam estar se enfraquecendo e declinando em poder absoluto, seus competidores também estão passando por problemas e enfrentam desafios difíceis e ameaças internas e externas, políticas e econômicas.
Terceiro: a demografia. Em quase todos os países ricos, a população está crescendo muito lentamente ou está diminuindo. Nos EUA, está crescendo. Apesar de suas medidas recentes anti-imigrantes, os EUA continuam a ser o mais forte polo de atração de talentos do mundo. Também é país que integra os imigrantes mais rapidamente e os aproveita melhor -especialmente os imigrantes mais bem formados.
Quarto: a influência de ideias radicais e debilitantes será transitória. A ascensão de grupos com ideias radicais que ganham rapidamente influência significativa e dominam o cenário político, para depois sumirem com igual rapidez, é fenômeno recorrente nos EUA. O macartismo e os vários movimentos populistas são exemplos. Ross Perot é outro. E o Tea Party será mais um.
Os EUA enfrentam problemas enormes? Sim. Estão enfraquecidos? Sim. Mais que outros países? Não.

Twitter @moisesnaim

Tradução de CLARA ALLAIN

AMANHÃ EM MUNDO
Paul Krugman


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