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São Paulo, domingo, 05 de outubro de 2003

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RÚSSIA

Desde 94, estima-se que 62 mil pessoas tenham morrido

Direitos humanos são violados por Moscou e por rebeldes tchetchenos

DA REDAÇÃO

Violações aos direitos humanos, cometidas tanto pelas forças russas quanto pelos rebeldes tchetchenos, são moeda corrente no conflito na república independentista da Tchetchênia, deixando a população civil sem saída aparente e provocando um grande movimento de refugiados.
"A situação dos direitos humanos é dramática na Tchetchênia. Primeiro, como sua austeridade em relação aos guerrilheiros lhe valeu a eleição presidencial, em março de 2000, o presidente [Vladimir] Putin tem apostado numa solução militar para o conflito, o que abre caminho para abusos", indicou Andrew Bennett, da Universidade de Georgetown (EUA).
"Segundo, como sua popularidade se mantém elevada e o 11 de Setembro lhe propiciou um ótimo pretexto para massacrar os rebeldes, Putin não vê razão para mudar de método. Mesmo assim, nos últimos meses, ele tem se esforçado para mostrar que a "normalidade" está voltando à região. Assim, parte do Exército foi retirada da Tchetchênia, porém ela foi substituída pelo FSB [Serviço de Segurança Federal], o sucessor da KGB [serviço secreto soviético]", acrescentou Bennett.
Contudo, para Mark Kramer, da Universidade Harvard (EUA ), o Kremlin não é o único culpado pela escalada da violência no Cáucaso nos últimos quatro anos.
"Os tchetchenos controlaram a cena política da república de 1996 a 1999, no entanto não conseguiram recolocá-la numa situação razoável. Por conta de disputas pelo poder e do não-cumprimento da promessa russa de ajudar financeiramente na reconstrução, a região transformou-se num bastião de ilegalidade", disse Kramer.
Segundo uma estimativa publicada há duas semanas no jornal independente russo "Novaya Gazeta", cerca de 12 mil militares russos morreram nas duas guerras na Tchetchênia, desde 1994.
Mas, como salientou Bennett, "a conta dos russos não é transparente, pois, por exemplo, eles não classificam os soldados que são feridos na Tchetchênia, mas que morrem em outras partes da Rússia, de baixas do conflito tchetcheno". "Assim, o número de mortos é bastante superior ao anunciado oficialmente", indicou Bennett.
"Além disso, do lado tchetcheno, as mortes de civis não são computadas, o que também enviesa a análise dos fatos. É muito complexo obter provas concretas que sustentem qualquer tese relacionada ao número de vítimas, já que fontes imparciais não têm acesso à região", completou. Organizações de defesa dos direitos humanos dizem que cerca de 50 mil tchetchenos -civis e rebeldes- morreram nos últimos dez anos em razão do conflito.
A Anistia Internacional (AI) publicou, na última quinta-feira, um relatório sobre a Justiça russa e os direitos humanos no país. No texto, ela faz duras críticas ao Kremlin por conta dos abusos verificados na Tchetchênia, que incluem desaparecimentos, mortes e estupros cometidos por militares. De acordo com a AI, 178 mil pessoas tiveram de abandonar suas casas por causa dos combates. A população tchetchena é de cerca de 1 milhão de habitantes.
O silêncio da comunidade internacional acerca das atrocidades cometidas por tropas russas contra civis tchetchenos e por rebeldes separatistas contra civis russos tem levado organizações de defesa dos direitos humanos a exigir uma tomada de posição dos líderes políticos ocidentais.
Contudo, na cena internacional, o fator humanitário não é o único que leva os países mais poderosos a agir. "Quando fatores econômicos e de segurança, além dos direitos humanos, apontam para uma resposta drástica, como ocorreu por ocasião da invasão do Kuait pelo Iraque [1990], o Ocidente intervém", disse Bennett.
"Na Tchetchênia, o conflito não afeta os interesses dos países ocidentais nem ameaça disseminar-se. Assim, a preocupação passa a ser exclusivamente humanitária. Entretanto, para o Ocidente, as boas relações com a Rússia são prioritárias", acrescentou.
(MÁRCIO SENNE DE MORAES)


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