São Paulo, sábado, 05 de dezembro de 2009

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CLÓVIS ROSSI

Dilma e Honduras, nem tudo a ver


Ministra, quase candidata, estreia em temas de política externa dizendo que eleição "tem de ser considerada"


A MINISTRA Dilma Rousseff fez sua estreia ontem, até onde minha memória registra, em temas de política externa. Foi durante a viagem de trem da comitiva presidencial entre Berlim e Hamburgo. O presidente Lula e sua turma viajaram em um vagão pintado de verde e amarelo, deferência especial da Deutsche Bahn, a estatal que gere o extraordinário sistema ferroviário alemão e cujas cores são vermelho e branco.
Já na metade final da viagem, Dilma passou para o, digamos, andar de trás, onde estávamos os jornalistas à espera de Lula, vamos ser francos, não de sua eventual sucessora.
A estreia da ministra revela uma visão algo diferente daquela que os porta-vozes oficiais do governo têm expressado sobre Honduras, a começar do próprio presidente. "Este novo processo [a eleição de Porfirio Lobo] vai ter de ser considerado. Nós vamos fazer uma avaliação disso e vamos nos posicionar", diz Dilma.
É verdade que a ministra, como seu chefe e seus colegas, afirmou depois que "você não pode desconhecer o fato de que houve um golpe de Estado".
Insisto para ter certeza de qual é o ponto de vista de Dilma: Folha: "Você não pode desconsiderar o golpe, mas também não pode desconsiderar o fato de que houve uma eleição...". Dilma: "É isso que estou falando. Vamos ter de levar isso [em conta]".
É um pouco diferente do que Lula dissera sobre o assunto, ao deixar Portugal na terça-feira, quando respondeu "não, peremptoriamente" à hipótese de reconhecer o novo governo hondurenho.
OK, eu sei que entre considerar o fato de que houve uma eleição e reconhecer o governo que dela emergiu há uma certa distância, mas, até agora, o governo brasileiro tratava a eleição como um não evento, por ter sido promovida por um governo ilegítimo.
Não é, portanto, uma situação simples. Ao contrário, é "bastante turbulenta", como diz Dilma.
O caso Honduras surgiu porque a Folha quis puxar a política externa para a conversa, até então centrada no tema favorito da ministra (infraestrutura, no caso o trem de alta velocidade que ela chegou a fingir que dirigia, ao lado de Lula).
Afinal, há indícios de que, pela primeira vez nas eleições brasileiras, política externa poderá ser um tema, do que dá prova a polêmica sobre a visita do presidente do Irã, atacada pelo governador José Serra, por sua vez atacado por Marco Aurélio Garcia. Dilma, que admitiu que "tudo indica" que vá ser pré-candidata já em fevereiro, não tem traquejo nem histórico nessa área.
Mas se considera "uma testemunha ocular especial", por ter acompanhado o presidente Lula em conversas com diversos mandatários, de George Walker Bush a Barack Obama, passando por Nicolas Sarkozy, Gordon Brown e o chinês Hu Jintao.
"Então, de uma certa forma, a política externa brasileira é do meu conhecimento. Não tenho nenhum problema para lidar com ela, não", afirma. "De certa forma" será pouco se vier a substituir o "superstar" Luiz Inácio Lula da Silva.

crossi@uol.com.br


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