São Paulo, terça-feira, 06 de fevereiro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Gasto com terceirização explode nos EUA

Tendência de duas décadas se acentuou no governo Bush; despesa com prestadores de serviço chegou a US$ 400 bi em 2006

Até investigação de contratos sob suspeita é terceirizada; 20 maiores provedores gastaram US$ 300 mi em lobby desde 2000

SCOTT SHANE E RON NIXON
DO "NEW YORK TIMES", EM WASHINGTON

Em junho, por falta de pessoal para investigar casos de incompetência e fraude em empresas contratadas como prestadoras de serviços ao governo dos Estados Unidos, a Administração Geral de Serviços (GSA, na sigla em inglês) adotou a resposta automática da atual administração para quase qualquer problema: contratou mais um prestador de serviços. Aparentemente não fazia diferença que a empresa contratada, a CACI International, tivesse ela mesma evitado recentemente uma suspensão de seus contratos federais, ou que o trabalho, que envolvia o estudo de arquivos de investigação de outros provedores de serviços, pudesse envolver conflito de interesses, ou que os serviços de cada profissional fornecido pelo grupo custassem US$ 104 por hora aos contribuintes.
Sem debate público ou anúncio formal de decisão, os prestadores de serviços se tornaram virtualmente um quarto ramo do governo. Os gastos com contratos federais de terceirização de serviços explodiram de vez nos anos Bush, superando a marca dos US$ 400 bilhões, no ano passado, ante US$ 207 bilhões, em 2000, estimulados pela guerra no Iraque, pelos gastos mais elevados com a segurança interna e pelo furacão Katrina, mas também por uma filosofia que encoraja a terceirização de praticamente todas as funções de governo.

Registro de atas
Empresas contratadas constroem navios e satélites, mas também arrecadam o Imposto de Renda e organizam os orçamentos de agências federais, pilotam aviões de espionagem não-tripulados e registram as atas nas reuniões do governo sobre a política referente à guerra no Iraque. O número de terceirizados supera em muito o dos servidores públicos diretamente contratados.
A explosão de serviços terceirizados suscita questões de fiscalização, custo e responsabilidade legal que há muito vêm incomodando os grupos de defesa dos interesses públicos. Embora casos flagrantes de fraude e desperdício conquistem manchetes, a preocupação vai além dos simples delitos. Entre os temas que atraem atenção estão:
1) A concorrência entre os prestadores de serviços parece ter se reduzido acentuadamente. Em 2005, apenas 48% dos contratos foram disputados em condições de concorrência aberta, ante 79% em 2001.
2) Funções governamentais secretas e delicadas em termos políticos, como a coleta de informações e a preparação de orçamentos, estão cada vez mais sendo transferidas a prestadores de serviços, apesar dos regulamentos que proíbem a terceirização de trabalhos "inerentemente governamentais".
3) Muitas agências públicas sofreram redução em sua capacidade de buscar os preços mais baixos e supervisionar os fornecedores de serviços porque o número de funcionários diretos do governo trabalhando na fiscalização de contratos se manteve o mesmo, enquanto os gastos se multiplicaram.
4) Os provedores de serviços de maior sucesso nem sempre são os que fazem o melhor trabalho, mas aqueles que dominaram as técnicas necessárias para vender ao governo. Os 20 maiores provedores de serviços terceirizados gastaram quase US$ 300 milhões em lobby e doaram US$ 23 milhões a campanhas políticas de 2000 para cá. A maior fornecedora do governo federal, a Lockheed Martin, que gastou US$ 53 milhões em lobby e US$ 6 milhões em doações de campanha de 2000 para cá, recebe mais verbas federais anualmente do que os departamentos da Justiça ou de Energia.
5) A terceirização de funções quase sempre reduz a fiscalização pública, já que programas governamentais ficam ocultos por trás das portas de empresas privadas. Empresas, diferentemente das agências públicas, não estão sujeitas à Lei de Liberdade de Informação. O Congresso está tentando há dois anos, sem sucesso, obrigar o Exército a explicar os contratos dos seguranças fornecidos pela Blackwater USA para serviço no Iraque.

Burocracia
Até mesmo os maiores críticos da prática reconhecem que o governo não pode operar sem provedores externos de serviço, que oferecem capacidades adicionais para enfrentar crises sem expandir a burocracia permanente. Os provedores de serviços também fornecem capacidades especializadas de que um governo não dispõe. A cautela quanto à concessão de contratos públicos remonta a 1941, quando o então senador Harry Truman declarou que "nunca encontrei um provedor externo que, se não for vigiado, não deixe o problema para o governo resolver".
Mas o recente boom das terceirizações nasceu dos esforços de "reinvenção do governo" empreendidos pela administração Clinton [1983-2000], que cortou os quadros do funcionalismo federal ao seu menor patamar desde 1960 e enxugou os métodos de concessão de contratos.


Tradução de PAULO MIGLIACCI

NA INTERNET - Leia íntegra http://www.folha.com.br/070362

Texto Anterior: Orçamento reduz ajuda a Equador e Bolívia
Próximo Texto: Direitos civis: Governo chinês impede ativista de sair de casa
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.