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Guerra dita vida e campanha de veterano
Passado de prisioneiro e retórica sobre Iraque atraem votos em grupo que supera 70 milhões de pessoas
FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A PHOENIX
(ARIZONA)
Um panfleto de campanha do
republicano John McCain traz
na capa uma foto borrada de
um soldado, que se funde à da
bandeira dos EUA, sob a inscrição: "It"s hard to understand
their sacrifice..." (É difícil entender o sacrifício deles). Na
página interna, a continuação:
"...Unless you lived it" (...A menos que você o tenha vivido).
Então um texto conta o "distinto histórico de serviços"
prestados por McCain às Forças Armadas do país, os 22 anos
como aviador da Marinha, as
medalhas recebidas e, claro, a
experiência como prisioneiro
de guerra no Vietnã -a credencial definitiva para fixar no hoje
pré-candidato a presidente o
rótulo de herói da pátria.
A peça enumera as promessas do republicano para os militares e veteranos de guerra e,
por fim, pede apoio político e financeiro para a campanha.
Filho e neto de militares e pai
de outros dois -um deles estaria servindo no Iraque, algo que
o senador não comenta-,
McCain formou-se na Academia Naval em 1958 e continuou
na ativa até 1981. No Vietnã, teve seu avião abatido, quebrou
dois braços e uma perna ao cair
num lago. Em mais de cinco
anos como prisioneiro, ficou
em solitárias e foi torturado.
Passados 35 anos da sua libertação e quase 33 anos do fim
da Guerra do Vietnã, a memória militar de McCain está viva
e pulsando como nunca na corrida presidencial americana,
usada por seus seguidores e críticos para apoiá-lo ou rejeitá-lo.
Um dos principais defensores da Guerra do Iraque e do
envio de mais soldados ao país
entre os concorrentes à sucessão de George W. Bush, o republicano martela em seus discursos a cantilena de que o plano democrata para retirar as
tropas significaria a "rendição".
Veteranos
A seção do Arizona do Departamento de Assuntos dos Veteranos fica num prédio moderno e imponente na região central de Phoenix. Abriga repartições como "Atendimento a paralíticos" e "Divisão dos prisioneiros de guerra".
O departamento é um órgão
federal, que atende os 24,3 milhões de veteranos de guerra do
país provendo-lhes serviços
médicos e psicológicos, financiamentos etc. Considerando
que os benefícios se estendem a
suas famílias, calcula-se que 70
milhões de pessoas sejam atendidas, ou quase um quarto da
população dos EUA.
Junte-se a esse contingente o
1,36 milhão de militares na ativa, e chega-se a um grupo de peso eleitoral imenso. Tradicionalmente, é para os republicanos que vão esses votos, o que
deve se manter desta vez, como
pôde constatar a Folha em
conversas com veteranos ontem no tal prédio em Phoenix.
E, como seria previsível, o veterano McCain está bem cotado.
"Voto em McCain porque ele
é um veterano, tem experiência parlamentar e é conservador do ponto de vista fiscal e liberal no lado social", afirma
Mark Preston, 59, soldado no
Vietnã entre 1970 e 1971.
Há casos em que o corporativismo é escancarado. "Ele
[McCain] sabe o que é preciso
para nos ajudar. Propôs criar
um cartão que nos dê acesso a
qualquer hospital, não só ao
dos veteranos", disse Eri González, 41, que esteve na Guerra
do Golfo (1991) e na do Iraque e
pensa em escrever um livro
com sua história -pede uma
força para lançá-lo no Brasil.
Um entrevistado revelou que
votaria no republicano Ron
Paul, igualmente veterano e
que reclama para si a primazia
no grupo. "Ele parece honesto,
não mente. Gosto de ouvi-lo, e
isso basta", conta Alfred Bannatt, 60, um ano de Vietnã.
Cabeça de POW
A alguns quilômetros dali, na
periferia de Phoenix, um centro comercial concentra parte
da comunidade vietnamita da
cidade. Há o mercadinho Vien
Dong, a joalheria Kim-Hoan, a
sinuca Phuong Hoang e o restaurante Old Saigan.
Seja por trauma, por reserva
ou por não falarem inglês, os
mais velhos, que chegaram aos
EUA em sua maioria depois da
guerra, simplesmente se negam a dar entrevista.
Mas a segunda geração, já de
americanos, não poupa
McCain. "O problema não é político, é pessoal. Ele tem cabeça
de POW [sigla em inglês para
prisioneiro de guerra], é perturbado, vai ter raiva a vida inteira", critica Michael Lam, 24,
que toca o mercadinho Vien
Dog com os pais, que migraram
do então Vietnã do Sul em 1976,
um ano após o fim do conflito.
"Nossa família não é comunista, mas isso não muda nada.
Meus pais não estão registrados para votar, mas, se estivessem, jamais votariam no
McCain", diz ele. Ao seu lado, a
mãe confirma, em vietnamita.
Lam, apesar de preferir Hillary, votaria em Obama. "O
mundo é sexista, não está preparado para ela."
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