|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Prossegue mistério do cardeal escondido
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Não há nenhuma certeza de que
o enigmático 118º cardeal do próximo conclave tenha sua identidade revelada a tempo de participar da sucessão de João Paulo 2º.
Ele foi nomeado "in pectore"
(intimamente, secretamente) pelo papa, em outubro de 2003, no
mesmo consistório no qual 31 nomes ascenderam ao cardinalato,
entre eles Renato Martino, que
presidiu a Comissão Pontifícia
Justiça e Paz, e o "papabili" Angelo Scola, patriarca de Veneza.
A lei canônica diz que o próprio
pontífice deve revelar o nome
desse cardeal para que ele exerça
seus direitos. Um documento devidamente autenticado do papa
defunto, dizem especialistas, seria
suficiente. O prelado também
precisaria ter menos de 80 anos.
Os jornais italianos especulam
que o personagem misterioso seja
um chinês ou então o polonês Stanislaw Dziwisz, o secretário particular de João Paulo 2º.
A história dos cardeais "in pectore" já tem alguns séculos na longa cronologia da igreja. Surgiu no
pontificado de Paulo 3º (1534-1549). Antes dele, Martinho 5º indicara um prelado sem revelar
seu nome, que era no entanto conhecido pela cúpula romana.
No século 19 os papas nomearam 57 cardeais "in pectore". O
pontífice também era naquele período o chefe de um Estado com
interesses temporais, o que o levava, pela lógica, a fazer alianças e lidar com governos hostis. A nomeação sigilosa permitia não
atrair sobre o nomeado alguma
forma de retaliação política.
Entre 1900 e 2005 o número de
cardeais nomeados "in pectore"
foi bem menor: apenas 12.
O primeiro deles, o português
Antônio Mendes Bello, nomeado
em novembro 1911, teve sua identidade revelada no consistório de
1914. Havia sido expulso de Lisboa porque as autoridades seculares o acusavam de infringir a separação entre igreja e Estado.
O exemplo seguinte viria apenas em 1933 e envolveu o italiano
Federico Tedeschini, cuja nomeação se tornou pública dois anos
depois. Ele era núncio apostólico
(embaixador do Vaticano) na Espanha, quando da instituição da
República e da emergência de um
forte sentimento anticlerical.
Os três casos mais misteriosos
do século 20 aconteceram durante o pontificado de João 23. Em
1960 ele nomeou três cardeais "in
pectore". Nunca se soube a identidade de nenhum deles.
A Guerra Fria e a repressão religiosa nos países comunistas estiveram na raiz das três nomeações
"in pectore" do pontificado de
Paulo 6º. A mais trágica envolveu
Iuliu Hossu, bispo romeno, preso
entre 1948 e 1964 e recluso num
mosteiro até sua morte, em 1970.
Sua condição de cardeal foi revelada apenas em 1973.
Os dois outros cardeais "in pectore" do pontificado também vinham de países comunistas, mas
foram identificados ainda em vida. O primeiro, um tcheco, chamava-se Frantisek Tomasek, foi
nomeado em maio de 1976 e identificado em junho do ano seguinte. Joseph-Marie Trinh-nhu-khue, arcebispo de Hanói, tornou-se cardeal em outubro de
1974. Mas sua condição viria a público só em maio de 1976.
João Paulo 2º nomeou quatro
cardeais "in pectore". Três deles
tiveram suas identidades reveladas. Foi primeiramente o chinês
Ignatius Kung Pin Mei, bispo de
Xangai, que em 1979, ao ser nomeado, cumpria pena de prisão
perpétua. Sua identidade foi revelada em 1991 e ele morreu no exílio (Estados Unidos) em 1998.
Dois outros cardeais, o letão Janis Pujatz e o ucraniano Marian
Jaworski, foram designados em
1998 e identificados em 2001.
Texto Anterior: Texto do papa deve ser divulgado; sepultamento será em "terra nua" Próximo Texto: A morte do papa: Santa Marta é quase um hotel de luxo Índice
|