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A MORTE DO PAPA
Santa Marta é quase um hotel de luxo
Local confortável custou US$ 20 milhões, tem 110 suítes e hospedará pela primeira vez os cardeais que elegerão o novo papa
JASON HOROWITZ
DO "NEW YORK TIMES", EM ROMA
Dentro do saguão ensolarado,
com piso de mármore encerado e
um balcão de recepção com listas
de convidados, a Casa Santa Marta
se parece com qualquer bom hotel do centro de Roma.
Mas um busto de bronze de
João Paulo 2º, logo após as portas
de vidro da entrada, indica que
não é um local tão comum. Os 117
cardeais que elegerão o novo papa
ficarão ali hospedados. O Vaticano gastou US$ 20 milhões para
construir o alojamento, logo atrás
de seus pesados portões laterais.
Anteontem pela manhã o edifício de cinco andares passou a receber seus hóspedes especiais.
Mesas antigas com pernas douradas estavam desempoeiradas e
brilhantes. Um pequeno elevador
estava pronto para os cardeais
com dificuldades de locomoção.
Um cartaz negro indicava em três
idiomas o restaurante.
Os funcionários do Vaticano
que moram na Santa Marta deixaram seus aposentos com a chegada dos cardeais. Cozinheiros,
confessores e médicos estão à disposição dos ocupantes das 110
suítes e de alguns quartos simples.
"Milagre no conclave: os cardeais terão um chuveiro", disse
em título de reportagem o semanário "L"Espresso", no ano passado, ao revelar detalhes sobre o local de hospedagem.
Os banheiros privativos certamente serão apreciados, mas
muitos se indagarão se, com tanto
conforto, os cardeais não abandonarão a pressa que se espera deles
para eleger um novo papa.
Pelas regras em vigor, se depois
de duas semanas de conclave dois
terços dos cardeais não votarem
no mesmo nome, a maioria simples passa a prevalecer. Isso pode
levar cardeais a ganhar tempo até
que seu candidato se aproxime da
metade dos votos.
Mas outros argumentam que,
depois de tantos anos com um papa de saúde precária, os cardeais
se apressariam para a escolha de
um pontífice que imprimisse um
dinamismo imediato às questões
mais urgentes do Vaticano.
Em 1271, depois de quase três
anos de conclave, católicos chegaram a trancar o local da reunião
pelo lado de fora e a "estimular" a
pressa dos cardeais por meio de
uma dieta de pão e água.
Naquela oportunidade, para
também incitar a motivação dos
eleitores, o teto do local foi removido. Em razão de tamanho estímulo, enfrentando a chuva e o sol,
os cardeais por fim decidiram eleger Gregório 10º.
As condições melhoraram bastante em 1978, ano dos últimos
conclaves. Mesmo assim, comparando-se com os padrões de moradia a que está acostumada a
maioria dos cardeais, as condições eram bem precárias.
Camas eram emprestadas do
colégio de missionários local. As
lâmpadas eram muito fracas para
permitir a leitura noturna. O "luxo" era dado por uma pia para a
limpeza do corpo, algumas folhas
de papel para anotação e uma
modesta escrivaninha.
O cardeal Giuseppe Siri, arcebispo de Gênova naquela época,
queixou-se de modo ruidoso das
condições que enfrentou naquele
verão sufocante de Roma. Disse
sentir-se dentro de uma sepultura
desprovida de ventilação.
Ele não foi evidentemente o
único a sentir tamanho desconforto. Depois do conclave e da
eleição de João Paulo 1º, o papa teve um curtíssimo pontificado, e o
encontro do qual saiu João Paulo
2º enfrentou condições igualmente precárias de alojamento. O cardeal Silvio Oddi, que morreu em
2001, queixava-se da dureza das
condições de alojamento durante
esses dois conclaves romanos.
"Os cardeais são em sua maioria
bastante idosos, com problemas
de próstata, cansados e maltratados pela existência de um banheiro para cada dez pessoas", ele disse, segundo citação da reportagem do "L"Espresso".
"Eu dormia bem perto do banheiro. E então testemunhava esses pobres idosos atravessando
um corredor de 70 metros para se
aproximar da porta e encontrá-la
fechada".
Além disso, todos os cardeais
eram obrigados a arrumar as camas em que haviam dormido.
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