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São Paulo, domingo, 06 de julho de 2003

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EUA

Para analistas, promessas de ajuda são verniz humanitário, mas viagem é centrada no combate ao terror e no fornecimento de óleo

Bush visita a África de olho no petróleo

FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

George W. Bush inicia hoje sua primeira visita como presidente dos EUA à África em meio ao anúncio de boas intenções, críticas e no limiar do envio de tropas americanas à Libéria. Bush vai a cinco países em seis dias: Senegal, África do Sul, Botsuana, Nigéria e Uganda. Será a terceira visita de um presidente norte-americano à região e a segunda de Bush, que já esteve em Gâmbia em 1992 representando o pai, o ex-presidente George Bush (1989-93).
Ele será também o primeiro chefe de Estado a visitar a África do Sul sem ter um encontro com Nelson Mandela. Pouco antes da Guerra do Iraque, Mandela disse que o presidente americano não conseguia "pensar direito".
Antes da partida, Bush voltou a anunciar um ambicioso plano de combate à Aids na África. Cerca de 29,4 milhões de pessoas (de um total de 42 milhões no mundo) estão infectadas pelo HIV na região. Cerca de 18 milhões já morreram com a doença.
Bush disse também que pretende aprofundar o comércio e a ajuda americana para a região.
Segundo algumas das principais organizações não-governamentais ligadas à África consultadas pela Folha, a visita de Bush à região, apesar do verniz humanitário, se encaixa na política de defesa, combate ao terrorismo e de proteção a reservas de petróleo que tem orientado as ações da atual administração americana.
"Bush tem conseguido apresentar-se como mais simpático que outros à causa africana, mas há uma enorme dose de manipulação para mostrar compaixão", diz Salih Booker, diretor-executivo da Africa Action, ONG baseada em Washington.
Da promessa inicial feita em janeiro de gastar US$ 15 bilhões em cinco anos (US$ 3 bilhões ao ano) para combater a Aids em 14 países da África e do Caribe, a Casa Branca enviou ao Congresso um pedido de apenas US$ 1,5 bilhão para o ano fiscal de 2004.
Também gerou protestos no meio médico ligado ao assunto a indicação, na semana passada, do empresário Randall Tobias, ex-executivo do laboratório Eli Lilly e conhecido financiador de campanhas republicanas, para coordenar o novo programa dos EUA de combate à Aids.
O Departamento de Defesa norte-americano também vem delineando um ambicioso plano para incrustar bases militares em vários países africanos. A localização atende ao objetivo comum de vigiar países suspeitos de abrigar terroristas e áreas ricas em reservas de petróleo.
Bill Fletcher, diretor do TransAfrica Forum, afirma que países ricos em petróleo da África, como a Nigéria, merecem cada vez mais a atenção dos EUA "apenas por causa do petróleo".
O comércio total do EUA com a África em 2002 somou US$ 24 bilhões, com US$ 18 bilhões em importações, de petróleo principalmente, e US$ 6 bilhões em exportações, concentradas em maquinaria para extração do óleo.
Os investimentos diretos dos EUA na região, de US$ 10,2 bilhões, também se concentram em equipamentos petrolíferos.
Emira Woods, economista de Harvard e diretora do Foreign Policy in Focus, afirma que os norte-americanos têm planos de dobrar, em dez anos, a participação dos países africanos no fornecimento de óleo para os EUA, hoje na faixa de 15% do consumo.
"O objetivo é diminuir a dependência do Oriente Médio a todo custo", diz Woods. Segundo ela, a aproximação dos EUA com alguns governos da África tende a reforçar uma política de controle que não deve resultar, necessariamente, na melhora geral do padrão de vida dos africanos.


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