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ENTREVISTA
Presidente mexicano acredita que a América Latina deva integrar-se para ter mais força nas relações internacionais
Fox crê que México vá dar alento a Mercosul
FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL À CIDADE DO MÉXICO
O presidente Vicente Fox inicia
hoje sua segunda visita ao Brasil e
ao Mercosul com o propósito de
fazer do México o quarto membro associado do bloco econômico sul-americano. Trata-se de um
parceiro de peso: o país é hoje a
maior economia latino-americana e o 7º exportador mundial
-mais de 80% vão para os EUA.
"Parece-me que a chegada do
México vai dar [ao Mercosul]
uma grande vitalidade, injetar-lhe
nova energia", disse Fox, 62, à Folha em entrevista concedida em
Los Pinos, sede do governo.
Político egresso da iniciativa
privada, Fox é um entusiasta dos
tratados comerciais. "Ninguém
pode falar como o México das
vantagens do livre comércio."
Mas culpa justamente a economia pela má avaliação de seu governo: "Se aos cidadãos interessa
algo, são empregos, renda e crescimento econômico. São variáveis
sobre as quais nenhum país pode
falar nos últimos três anos".
O presidente mexicano chega
ao Brasil hoje à noite. Amanhã cedo, tem um encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Segundo a Chancelaria mexicana,
os dois anunciarão a criação de
uma comissão binacional, que se
reunirá anualmente.
À tarde, viaja a São Paulo, onde
se reúne com empresários dos
dois países. No fim do dia, pega
uma carona com Lula até Puerto
Iguazú (Argentina), para participar da cúpula do Mercosul.
No ato mais importante da viagem, Fox formalizará ali o pedido
de adesão ao bloco como membro associado -o mesmo status
do Chile, da Bolívia e do Peru. A
proposta tem um tom mais político, já que não é ainda um tratado
pleno de livre comércio.
O pedido mexicano então será
avaliado pelo Mercosul, mas a
aprovação é tida como certa.
Folha - O México já tem o Nafta
(Acordo de Livre Comércio da América do Norte) e acordos comerciais
no Mercosul. Qual é a motivação
para ingressar como membro associado no bloco sul-americano?
Vicente Fox - O México tem
acordos de livre comércio com 42
países. Temos com a União Européia, o Japão, a América do Norte,
a Colômbia e a Venezuela, e tem
sido de nosso interesse construir
acordos bilaterais com o Brasil e a
Argentina. Fizemos também um
acordo de livre comércio com o
Uruguai e temos um com o Chile.
O passo natural é entrarmos, num
primeiro passo,
no Mercosul como membro associado e, posteriormente, avaliar a
possibilidade de
haver um acordo
comercial Mercosul-México. A razão? Integrar mais
a América Latina.
A razão política é
estar mais perto
de nossos sócios
comerciais no sul.
Finalmente, para
que essas economias grandes da
América Latina
-Chile, Argentina, Brasil e México- tenham a capacidade de impulsionar o desenvolvimento para o
resto da região.
Folha - O presidente chileno, Ricardo Lagos, disse
esperar que a entrada do México
gere uma maior coordenação política do Mercosul nos fóruns internacionais e citou a UE como exemplo. O que o sr. acha?
Fox - Concordo totalmente. O
que precisamos na América Latina é de uma maior integração.
Não temos sabido ainda nos integrar com sucesso em blocos, como já fizeram a Ásia, a Europa,
como fizemos aqui na América do
Norte, onde estamos nos saindo
extraordinariamente bem. O México é a nona economia do mundo. Hoje, o México é a maior economia da América Latina e a sétima potência exportadora mundial e exporta mais mercadorias
que toda a América Latina junta.
O que precisamos
na América Latina
é de uma maior
integração. Não
temos sabido ainda nos integrar
com sucesso em
blocos, como já fizeram a Ásia, a
Europa e a América do Norte
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Folha - Mas um perfil mais político inclui uma reforma do Mercosul?
Fox - No momento, não temos a
qualidade de membro permanente, não somos parte da definição
do futuro, mas aspiramos integrar-nos. Agora, vejo muito entusiasmo no Mercosul, muita vontade política de impulsionar a integração, de fortalecer o bloco. Parece-me que a chegada do México
vai dar-lhe uma
grande vitalidade,
injetar-lhe nova
energia. E, obviamente, ao México
também. É natural que nos integremos.
Folha - Por que
não foi possível um
acordo comercial
mais amplo?
Fox - Vamos
passo a passo. Em
primeiro lugar, os
acordos bilaterais.
E, dentro desses
acordos, primeiro
escolhemos alguns setores em que não tivemos
dificuldades. Só nos falta avançar
com o Paraguai. Temos um acordo de livre comércio com o Chile
que funciona extraordinariamente bem. Agora, entramos numa
etapa em que teremos voz, já vamos participar dos planos de desenvolvimento do Mercosul, já
vamos estar próximos dessas economias para fazer mais investimentos e comércio, e o resultado
final, natural, será, no futuro, chegar a um acordo de livre comércio
completo, buscando uma maior
integração e formando esse grande bloco latino-americano, que
terá muito sucesso neste século.
Folha - Que tipo de Alca interessa
ao México, que já tem o Nafta e o
Mercosul?
Fox - Para nós, essas três pistas
não são interesses contraditórios.
Ninguém pode
falar como o
México das
vantagens do livre
comércio, temos
sido beneficiados.
Somos a sétima
potência
exportadora do
mundo porque
abrimos essa rede
de acordos
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Uma é bilateral, outra é para fazer
acordos regionais, como o Mercosul, e outra é um possível acordo continental para o futuro. Parece-nos importante que as três
avancem. Ninguém pode falar como o México das vantagens do livre comércio, temos sido beneficiados de forma muito direta. Somos a sétima potência exportadora do mundo porque abrimos essa rede de acordos comerciais.
Folha - O Conselho de Segurança
da ONU pode passar por reforma
em 2005. É possível que o México
passe a apoiar a candidatura brasileira a um assento permanente?
Fox - Isso não está excluído, e a
idéia não é apenas ter um posto
permanente para o Brasil. A idéia
é que haja uma representação
ampla, regional e democrática para que o CS seja mais forte, com
mais representação. As participações do Brasil e do México não
são excludentes. O importante é
fortalecer o CS. Estamos respondendo ao chamado do secretário-geral da ONU, Kofi Annan, e formando um grupo de países encabeçado pelo México para levar
propostas à ONU para uma reorganização total.
Folha - No domingo, a Folha publicou dados do governo norte-americano segundo os quais nunca
houve tantos brasileiros cruzando
a fronteira via México. De que forma isso preocupa seu governo?
Fox - É um tema muito importante para o México, para a América Central e agora vejo que é para o Brasil. Nós trabalhamos intensamente com os EUA para
chegar a um acordo integral sobre
imigração, já que há muitos problemas, mas também muitas
oportunidades. Vamos seguir trabalhando nessa direção. Pode ser
um tema que tratemos com Lula.
Folha - Como o sr. tem acompanhado a polêmica envolvendo o influente analista americano Samuel
Huntington, que acusa os mexicanos de ameaçar os EUA?
Fox - Discordo totalmente de
Huntington. Creio que os EUA
conheçam a integração de culturas, raças, nações. É uma nação de
imigrantes. E aí estão os hispânicos, os mexicanos,
fazendo uma
enorme contribuição para a economia. São muito
leais, sempre trabalhando duro.
Talvez Huntington não venha
conversando com
eles. Sua maior
ambição é que
seus filhos façam a
universidade.
Folha - Nos imensos protestos contra a violência da
semana passada
pelo México, houve
pedidos de uso dos
militares na segurança pública. O sr.
concorda com isso?
Fox - Não, discordo tanto da pena de morte, que
também pediram
na marcha, quanto da militarização da segurança. A Constituição
dá uma tarefa ao Exército. Eu já fiz
um plano de dez propostas imediatas para somar ao que já temos
feito. Se trabalharmos juntos
-governos federal, estadual e
municipal, o Legislativo e a sociedade-, vamos ganhar essa batalha. Vai levar tempo, mas tenho
certeza de que vamos alcançar as
metas.
Folha - Em pesquisa do jornal "El
Universal" publicada hoje [ontem],
o sr. aparece com uma boa aceitação, mas não o seu governo. Por
que há essa dissociação entre a sua
liderança e as as ações de governo?
Fox - É muito claro. Na pesquisa
feita pelo diário mais importante
do México, tenho 60% de aprovação, o que não é nada mau. De fato, nas pesquisas do Latinobarômetro, feitas em todos os países
latino-americanos, é muito sólido
ter 60% de apoio, pois, normalmente, esses níveis só são alcançados na eleição. E depois vem a
queda. Sou o presidente latino-americano que,
em três anos e
meio no poder,
tem o melhor reconhecimento.
Agora, sobre essa base, as outras
expressões que
aparecem na pesquisa são muito
compreensíveis,
tivemos três anos
muito difíceis,
sem crescimento
econômico. Se aos
cidadãos interessa
algo, são empregos, renda e crescimento econômico. São variáveis sobre as quais
nenhum país pode falar nos últimos três anos. Felizmente, agora a
economia mexicana está respondendo com muito vigor. Os mercados internacionais estão se recuperando e estamos fortalecendo o interno.
Folha - No entanto o seu partido
foi derrotado nas eleições regionais de domingo.
Fox - Não perdemos, não éramos fortes nesses Estados. Agora
virão Aguascalientes e outros lugares onde devemos ganhar. O
governo não perdeu, simplesmente ganharam os que estavam.
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