São Paulo, domingo, 06 de agosto de 2006

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Artigo

Nasrallah só quer a destruição de Israel

CLAUDE LANZMANN
ESPECIAL PARA O "LE MONDE"

Sabra, Chatila, Jenin, Qana quatro anos atrás, Qana agora outra vez: o mesmo clamor se desencadeia, nas ruas árabes, nas nossas ruas, nas colunas dos jornais a mesma pressa em condenar, a atribuir toda a responsabilidade apenas a Israel, a considerar insignificantes as mortes israelenses e a chuva de bombas que se abate diariamente e pela primeira vez atinge em tamanha escala a população civil de um pequeno país do tamanho da Bélgica, forçando 350 mil de seus cidadãos a procurarem refúgio "mais ao sul", onde mesmo assim outras bombas poderão vir a atingi-los nos próximos dias, porque Israel está desprovido de profundidade estratégica.
Se for revelado que Israel é de fato responsável, teremos em mãos um equívoco deplorável e não, como gritam tantas vozes estridentes, um "crime de guerra". "Não instruímos nossos soldados a matar inocentes", disse Ehud Olmert.
Israel vem alertando a população libanesa há dias, por meio de panfletos e pelo rádio, sobre as áreas que serão bombardeadas por sua aviação, a fim de permitir que os civis escapem, e já está estabelecido que o Hizbollah abriga seus caminhões lança-foguetes em aldeias xiitas habitadas, das quais eles saem para disparar suas armas e às quais voltam em seguida. Uma palavra sonora surgiu em mil bocas políticas, o termo "desproporção".
Diz-se que Israel está destruindo o Líbano por conta de três desafortunados soldados capturados, um pelo Hamas, dois pelo Hizbollah. Mas raras vezes é mencionado que os foguetes já estavam sendo disparados contra Sderot e o sul de Israel antes da captura do cabo Shalit, e que o Hizbollah capturou os seus dois prisioneiros em uma emboscada na qual oito de seus companheiros de tropa foram mortos. Também é convenientemente esquecido o fato de que, antes da emboscada, já estavam sendo disparados foguetes contra os kibbutz da Galiléia.
Os soldados capturados pelo Hizbollah representam uma declaração de guerra a Israel, sem qualquer relação com o conflito entre israelenses e palestinos: Mahmoud Abbas e Ehud Olmert, seguindo o caminho aberto por Ariel Sharon, se abraçaram em Amã, na presença do rei da Jordânia, e não se tratava, nem de uma parte, nem de outra, de um beijo de Judas.
Mas essa paz entre israelenses e palestinos é a menor das preocupações para o líder do Hizbollah. Ele estava se preparando para a guerra desde que Israel desocupou o sul do Líbano, planejando uma grande ofensiva e construindo uma rede de fortificações subterrâneas, bem como acumulando um arsenal dos foguetes disponíveis em profusão graças à Síria e ao Irã.
O presidente do Irã, Ahmadinejad, já afirmou que o problema fundamental do mundo muçulmano era a erradicação do Estado de Israel e do sionismo. Será que se trata de bazófia que não devemos levar a sério e não merece nem mesmo uma pergunta?
Hassan Nasrallah, o líder do Hizbollah, respondeu a essa pergunta muda. O que está em curso no momento é o primeiro ato, a abertura, dessa guerra, cujo objetivo final, como há 60 anos, é a destruição do Estado de Israel.
Israel teria deixado de existir há muito tempo se não reagisse de maneira desmesurada. O Hizbollah não ignorava o que poderia acontecer. Sabia o valor que o exército israelense atribui à vida de seus soldados e que Israel não deixaria passar em branco o ataque. Os bombardeios e suas inevitáveis vítimas civis são parte do processo, e o Hizbollah se beneficia em duas frentes: a da propaganda e a do despreparo militar de Israel para travar esse guerra de um novo tipo apesar de toda a alta tecnologia de que Israel dispõe. De acordo com uma doutrina do exército, são recrutas de 18 anos de idade que terminam encarregados de desmantelar as fortificações inimigas, ao custo de pesadas baixas.
Mas é lícito perguntar para que serviu o acordo de paz de Oslo e o que resta das esperanças que ele suscitou. Uma coisa sabemos: os inimigos de Israel puderam se armar até os dentes e o fizeram sem qualquer empecilho.


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