São Paulo, domingo, 06 de agosto de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Meta é incentivar consumo, diz governo

O czar antidrogas boliviano, Felipe Cáceres, diz que nova lei vai abaixar o lucro dos atravessadores e o preço final da coca

Segundo o ex-produtor de coca, repressão ao tráfico cresceu com Morales, mas falta uma maior cooperação antidrogas com o Brasil

DA REPORTAGEM LOCAL

O czar antidrogas do governo Evo Morales, Felipe Cáceres, disse que o objetivo do governo com a liberação do comércio da coca aos produtores é incentivar o consumo e a industrialização da folha na Bolívia, diminuir o lucro dos atravessadores e abaixar o preço final. Ex-produtor de coca como Morales, Cáceres teve sua plantação erradicada por forças do Exército entre os anos de 1996 e 1997. Hoje, ocupa o cargo de vice-ministro de Defesa Social. Leia sua entrevista à Folha por telefone.  

FOLHA - Quais são as principais mudanças do governo Morales com respeito ao cultivo da coca e ao narcotráfico?
FELIPE CÁCERES
- A lei 1.008, aprovada em 1988, previa apenas a repressão e a violência contra a coca, como se ela, em seu estado natural, fosse cocaína. Por isso, se fala de zonas tradicionais, onde a coca é legal. Mas na zona excedente, essa coca seria cocaína. É uma tipificação absurda. Em segundo lugar, a luta contra o narcotráfico estava dirigida apenas aos plantadores de coca, na qual o atropelo dos direitos humanos era fatal. Nossa política nova é narcotráfico zero, cocaína zero. Há informes da Força Especial de Luta Contra o Narcotráfico de que até agora foram apreendidas mais de duas toneladas de droga, entre cocaína e maconha. Muitos diziam que, com este governo, haveria mais droga. Não. Nos governos anteriores, se faziam cerca de 200 operativos por ano. Sob a minha direção, fizemos 350 operativos. Até agora, erradicamos 2.000 hectares de cultivos de coca. Sem repressão, sem violência, de maneira consensual e voluntária.

FOLHA - O sr. disse que a Bolívia tem hoje 27 mil hectares de coca, quando deveriam existir 18 mil hectares. No entanto a lei 1.008 prevê 12 mil hectares. Por que esse aumento de 6.000 hectares?
CÁCERES
- Pela simples razão: quando foi aprovada a lei 1.008, eram necessários 12 mil hectares de coca. Hoje, a população e este governo estamos fomentando nossa cultura tradicional e ancestral, ou seja, revalorizando a folha de coca. Isso significa um aumento de consumo. Depois, estamos defendendo o estudo do mercado legal da folha de coca. Além disso, queremos fazer a industrialização da folha de coca, fabricando farinha, cosméticos etc.

FOLHA - Outra mudança anunciada que provocou críticas foi a expansão do comércio de coca, hoje limitada a apenas dois mercados. Para a oposição, isso facilita o acesso do narcotráfico à folha.
CÁCERES
- Os partidos tradicionais monopolizaram a folha de coca. Apenas 5.000 pessoas podiam comercializar -os varejistas, que tinham licença para isso. Em La Paz, a libra de coca (0,45 kg) custa 14 bolivianos (US$ 1,75). Mas chega a Santa Cruz por 28 bolivianos (US$ 3,50). Hoje, pretendemos que essa coca não custe mais do que 18, 20 bolivianos. Com a nova regulamentação, estamos fazendo com que os varejistas não lucrem com a comercialização, mas que se fomente o maior consumo da folha.

FOLHA - O Brasil é o principal destino da cocaína produzida no país. Essa tendência deve continuar?
CÁCERES
- Creio que vamos reduzir. O Brasil instruiu suas forças para aumentar o controle na fronteira boliviana. À parte isso, o Brasil também é um país de trânsito. Na Bolívia, por exemplo, das 92 toneladas de cocaína apreendidas, quase 45% são peruanas. Estão utilizando a Bolívia e o Brasil como caminho para a Europa.

FOLHA - Falta uma maior cooperação entre os dois países?
CÁCERES
- O presidente Evo Morales tocou no tema sobre como fortalecer os mecanismos de controle com o presidente Lula, mas isso está sendo feito pela Chancelaria para um convênio mais efetivo. Nós temos sido muito dependentes dos EUA, mas seria muito bom que, no futuro, como países latino-americanos, houvesse um acordo mais estreito para combater as drogas.


Texto Anterior: Ministro de Cuba critica fala de Rice
Próximo Texto: Convenção inicia nova Constituição na Bolívia
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.