São Paulo, quinta-feira, 07 de janeiro de 2010

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Argentina ordena abertura de documentos da ditadura

Governo Cristina diz que sigilo é "contrário à política de memória, verdade e justiça"

Objetivo da medida é facilitar julgamentos de militares retomados após a revogação de leis de anistia no governo Néstor Kirchner


SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES

A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, determinou ontem o desbloqueio dos arquivos confidenciais referentes à atuação das Forças Armadas durante a última ditadura militar no país (1976-1983).
A documentação fica disponível à Justiça para subsidiar a apuração de violações aos direitos humanos pelo regime.
O decreto que dispõe a medida observa que a reativação das causas por crimes contra a humanidade, após a revogação, na gestão do marido e antecessor de Cristina, Néstor Kirchner, das leis de anistia promulgadas no governo Raúl Alfonsín (1983-1989), gerou "grande quantidade de requerimentos judiciais de informação com classificação de segurança confidencial". Por isso, "qualquer limitação ao acesso da informação e documentação poderia obstruir uma investigação completa e, por extensão, impedir o esclarecimento dos fatos, o julgamento e a punição dos responsáveis".
Teve início no mês passado o julgamento de 19 acusados de crimes contra a humanidade cometidos na Esma (Escola de Mecânica da Marinha), o principal centro de detenção e tortura do regime.
A Argentina contabiliza 30 mil desaparições forçadas pela ditadura e a apropriação de 500 bebês nascidos em cativeiro.
O decreto firmado por Cristina diz que "a atuação das Forças Armadas durante a vigência do terrorismo de Estado demonstra que a informação e documentação classificada com caráter confidencial não esteve destinada à proteção dos interesses legítimos próprios de um Estado democrático, mas, ao contrário, serviu para ocultar a ação ilegal do governo".
Segundo o texto, manter o sigilo sobre os documentos seria "contrário à política de memória, verdade e justiça que o Estado vem adotando desde o ano de 2003 [início da Presidência de Néstor Kirchner]".
Os Kirchner fizeram da aproximação com entidades de defesa dos direitos humanos e do atendimento a parte de suas demandas um dos eixos principais de sua gestão, mas são criticados pela oposição por supostamente usarem o enfrentamento com a ditadura como cortina de fumaça para desviar a atenção dos problemas reais enfrentados pela Argentina.
Cristina atribuiu "aos dinossauros que ainda estão por aí" a ameaça que sofreu, em dezembro passado, durante um voo de helicóptero da residência de Olivos até a Casa Rosada.
Uma interferência fez soar a marcha militar das Camélias, espécie de hino da ditadura, e a expressão "Matem a égua!".
A ameaça ocorreu no dia do início do julgamento da "causa Esma". Ontem, foi anunciada a detenção de um radioamador suspeito de praticar a interferência. Ele se recusou a depor.


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