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Irã é problema do mundo todo, diz israelense
Às vésperas de chegar ao Brasil para visita, presidente Shimon Peres diz que ameaça nuclear iraniana não deve preocupar só Israel
Político confia na diplomacia como saída para conflito com Teerã, mas não espera que Brasil possa servir de ponte entre país persa e Ocidente
MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM
Apesar da enorme desconfiança que ronda o assunto em
seu país, o presidente de Israel,
Shimon Peres, ainda acredita
na diplomacia como o melhor
caminho para resolver o impasse nuclear com o Irã.
Para Peres, 86, que desembarca no Brasil na terça-feira
para visita oficial de cinco dias,
o programa atômico do Irã não
pode ser visto como um problema apenas de Israel. Esta será
uma de suas mensagens na
conversa privada que terá com
o presidente Lula e também deverá marcar o discurso que fará
no Congresso Nacional.
Menos de duas semanas após
a visita de Peres, será a vez do
presidente do Irã, Mahmoud
Ahmadinejad, ser recebido por
Lula em Brasília. Cauteloso, o
presidente israelense não comenta as escolhas da diplomacia brasileira, mas não esconde
o que pensa de Ahmadinejad.
"Estou visitando o Brasil e
não pretendo debater o tema
Ahmadinejad. Espero que Lula
seja um homem de valores",
disse Peres em conversa com
jornalistas brasileiros. "Sobre o
presidente do Irã, todos sabem
quem ele é. Ele prega a destruição de Israel, nega o Holocausto, fornece armas ao terror. É
suficiente. Não quero impor
nossas opiniões ao governo
brasileiro."
O argumento de que o Brasil
pode servir de ponte entre o Irã
e o Ocidente, é visto com ceticismo por Peres, um veterano
em negociações diplomáticas.
"Talvez sim. Mas não tenho
essa expectativa", diz Peres.
"Para promover a paz é preciso
combater a ameaça do terrorismo e recrutar apoio à causa da
paz. Se o Brasil está ciente destes desafios, gostaria de vê-lo
participando mais."
Segundo o presidente israelense, há um consenso entre as
principais potências mundiais
de que é preciso conter as ambições nucleares do Irã. "Israel
não quer monopolizar o problema iraniano", afirma. "O Irã
é um problema do mundo, não
apenas de Israel."
Sentado no relativamente
modesto gabinete presidencial,
cercado de imagens da história
de Israel, da qual ele próprio é
um dos últimos símbolos vivos,
Peres fala de forma pausada, a
voz baixa. Deixa claro que considera o atual regime iraniano
uma ameaça, mas vê alternativas ao uso da força.
"Eu não colocaria uma ação
militar no topo das opções. Temos que fazer tudo o que for
possível para encontrar uma
solução pacífica", diz.
Vencedor do Nobel da Paz de
1994, pelo acordo com os palestinos que hoje parece estar
num beco sem saída, Peres
acredita que um acordo é inteiramente possível. E critica a
decisão da liderança palestina,
de não retomar as negociações
enquanto Israel não congelar a
construção de assentamentos
na Cisjordânia.
"No começo, os palestinos se
recusavam a negociar, e continuam assim até hoje. Eu digo:
meu Deus, se trata-se apenas
de 3% ou 4%, vamos tentar negociar, vamos fechar essa diferença. Eles não deveriam rejeitar essa negociação", diz.
"Erro de julgamento"
Peres chega ao Brasil num
momento de desgaste da imagem internacional de Israel,
causado pela investigação da
ONU que acusou o país de cometer crimes de guerra em Gaza, no inicio do ano. Na avaliação do presidente, o Brasil cometeu "um erro de julgamento", ao votar a favor do Relatório Goldstone, que enumerou
as conclusões da investigação.
"O único crime de Israel é
não ter maioria na ONU", queixa-se Peres afirmando que há
"uma maioria automática" na
organização contra Israel.
"Quando a Liga Árabe, a Conferência Islâmica e o bloco dos
não alinhados se juntam, não
nos sobra muita chance."
Visto durante anos em Israel
como uma das personalidades
mais controvertidas da política
e um perdedor nato de eleições,
Peres é hoje uma das figuras
públicas mais respeitadas do
país. Sua transformação em
consenso nacional começou a
se cristalizar em 1995, quando
teve que substituir o premiê
Yitzhak Rabin, assassinado por
um radical judeu.
Para muitos, foi ali também
que o processo de paz começou
a morrer. Peres discorda. "Foi
uma interrupção que prejudicou, ou atrasou, o processo de
paz. Mas a maioria dos israelenses quer a paz, e ela se mantém viva", afirma Peres.
Leia a íntegra da
entrevista com Peres
www.folha.com.br/0931013
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