São Paulo, sábado, 07 de novembro de 2009

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CLÓVIS ROSSI

O real, a moeda do século 21?


O Brasil quer sua moeda como parte da cesta que, algum dia, substituirá o dólar como reserva internacional


QUASE CASUALMENTE , o ministro da Fazenda, Guido Mantega, deixa cair uma frase que pode soar excesso de ufanismo, durante conversa com a Folha: o Brasil, diz o ministro, quer, sim, que sua moeda faça parte da cesta que algum dia, eventualmente, substituirá o dólar como moeda internacional de reserva.
A Folha observa, obviamente, que, antes de que essa pretensão tenha alguma chance de materializar-se, seria preciso que o real fosse uma moeda conversível, dessas que você leva no bolso, chega a Nova York, Londres ou Tóquio, vai à casa de câmbio do aeroporto e troca pela moeda local.
O ministro não se dá por vencido: nas atuais condições de temperatura e pressão, o Brasil é um grande negócio para investidores estrangeiros, que, por isso mesmo, deveriam ter o maior interesse em negociar com o real da mesma forma que fazem com as moedas conversíveis, que, aliás, nem são muitas.
Difícil dizer se Mantega está com um projeto para o futuro próximo ou se está apenas contaminado pela euforia incontida que marcou a presença de autoridades brasileiras, comandadas pelo presidente Lula, em Londres na quarta e na quinta-feira.
Parece razoável aceitar que não é um projeto para o governo Lula. Faltam apenas 13 meses e alguns dias para que ele termine, tempo absolutamente insuficiente para que se dê a troca do dólar por alguma outra moeda de reserva ou uma cesta delas.
Até porque, o próprio ministro diz que essa substituição, se e quando vier a ocorrer, "não se dará por definição, mas pela prática". Ou seja, não adianta alguém, por muito importante que seja, dizer que é preciso criar uma alternativa ao dólar. A realidade é que a criará, se e quando se derem as condições.
O quando dificilmente será no curto ou médio prazo, a julgar pela comparação que faz para o jornal "Financial Times", Helmut Reisen, chefe de pesquisas do Centro de Desenvolvimento da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, o clubão dos 30 países mais ricos do mundo (o Brasil não faz parte porque não quer).
Reisen lembra que o Reino Unido perdeu a posição de maior economia do mundo em 1872 e a de maior exportador mundial em 1915, nos dois casos para os Estados Unidos. Mas a libra esterlina só foi destronada (pelo dólar, óbvio) em 1945. Mesmo que os Estados Unidos sejam ultrapassados pela China hoje, dia 7 de novembro, só em 2059 o yuan atropelará o dólar, se esse parâmetro histórico se repetir.
Não é muito provável que Lula e Mantega estejam no poder até lá, mas nem por isso a questão do real como parte de um esquema alternativo ao dólar deveria ser desconsiderada com ligeireza. É possível até que, na megalomania que exibe, Lula ache que o real deve ser "O" substituto, não parte de um esquema alternativo.
O que importa é que, se o Brasil pretende mesmo ser, como disse Lula em Londres, o país do século 21, a sua moeda tem que iniciar o mais depressa possível a subida ao topo. Mas, atenção, a escalada não tem nada a ver com o valor atual do real em relação ao dólar. Ele está sobrevalorizado (51% segundo Mantega), não valorizado, o que é muito diferente.


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