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Guarda de Emmanuel mudou de mãos pelo menos quatro vezes
Filho da refém Clara Rojas com guerrilheiro das Farc está sob cuidados de mãe substituta em lugar não revelado
Menino de três anos tem atraso no desenvolvimento psicomotor e fala pouco;
custódia deve ser concedida a avó em até duas semanas
FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A BOGOTÁ
Em três anos e meio de vida,
Emmanuel trocou de custódia
ao menos quatro vezes. Foi
duas vezes internado e esteve à
beira da morte. Por meio de depoimentos, a Folha busca reconstituir a história da criança
no centro do maior revés político recente das Farc (Forças
Armadas Revolucionárias da
Colômbia), que tem comovido
a Colômbia e o mundo.
Emmanuel nasceu em julho
de 2004 num precário acampamento das Farc na selva no sudeste do país. É filho de Clara
Rojas, assessora da candidata
presidencial Ingrid Betancourt
e seqüestrada com ela em fevereiro de 2002, e do guerrilheiro
Juan David, o Rigo.
Por conta da situação de
guerra, as Farc proíbem tanto
relações amorosas de guerrilheiros com reféns quanto mulheres grávidas e crianças nos
acampamentos. Há relatos de
abortos feitos em guerrilheiras
e de punição dos envolvidos.
De Rigo, sabe-se apenas que foi
separado de Clara logo após a
descoberta da relação.
O parto, muito difícil, ocorreu em condições precárias.
Emmanuel teve o braço esquerdo fraturado. Mãe e filho
foram separados poucas semanas depois. O curto período
que passaram juntos foi marcado pela saúde frágil da criança,
piorada pela falta de recursos.
As poucas informações dessa
época são do policial John
Frank Pinchao, que viu o menino "um par de vezes" antes de
fugir em abril passado, após
nove anos no cativeiro. "Clara
gritava o nome do menino e
lhes pedia que a deixassem vê-lo. A guerrilha não lhe dava
atenção. Durante uma marcha,
voltamos a vê-lo, mas já estava
com uma guerrilheira chamada
Rosa", diz Pinchao. Emmanuel
tinha o braço engessado.
Entrega
No início de 2005, as Farc entregaram o bebê ao camponês
José Crisantemo Gómez Tovar,
morador da inóspita zona rural
do departamento de Guaviare,
no sudeste colombiano. No depoimento, dado à Promotoria
em troca de proteção em 2 de
janeiro, ele detalhou como recebeu a criança e depois perdeu
sua guarda para o Estado.
"Nós vivíamos num sítio na
margem do rio Inírida, em Guaviare. De uma hora para outra,
chega uma lancha, descem um
senhor e uma senhora com um
menino nos braços e eles dizem: "Trazemos esse menino
para que o curem de picadas de
inseto e consertem o braço.'"
De poucos recursos e família
numerosa -tinha cinco filhos
na época-, Gómez Tovar disse
ter sido obrigado a fugir porque
as Farc estavam tentando recrutar seu filho de oito anos.
De canoa, a família chegou a
El Retorno, um povoado de
poucos recursos, em julho de
2005. Ali, levou Emmanuel ao
hospital. Mas a sua saúde estava tão ruim que o menino foi
imediatamente levado à capital
do departamento, San José.
No prontuário médico de
Juan David -como Emmanuel
foi registrado por Goméz Tovar
(ele sabia o nome do pai)-
constam: maltrato, negligência,
desnutrição, malária, diarréia
aguda, leishmaniose e fratura
no úmero (osso do braço).
Os vários indícios de maus-tratos fizeram com que o hospital procurasse o Instituto Colombiano de Bem-Estar Familiar (ICBF). Uma decisão judicial deu a guarda de Emmanuel
ao Estado, e, em seguida, o garoto foi levado a Bogotá.
Mãe substituta
Na capital colombiana, ele foi
posto aos cuidados de uma
"mãe substituta" -como são
chamadas as mulheres contratadas pelo ICBF para cuidarem,
em suas próprias casas, de
crianças abandonadas.
Ontem, a reportagem esteve
na rua Dez, bairro de Santa Rita, onde Emmanuel viveu até
recentemente -hoje, é mantido em lugar não divulgado pelo
governo. Trata-se de um bairro
de classe média, com sobrados
geminados. A casa e o nome da
mãe substituta estão sob sigilo.
O bracinho esquerdo, no entanto, continuou sendo um
problema. No último dia 31 de
outubro, Emmanuel foi operado para corrigir a fratura.
Em dezembro, as Farc pressionaram Gómez Tovar a devolver-lhes o menino. Haviam
prometido levá-lo ao presidente Hugo Chávez junto com a
mãe. A tentativa frustrada fez
com que o governo colombiano
iniciasse uma investigação da
identidade de Emmanuel.
Segundo disse a diretora do
ICBF, Elvira Forero, em entrevista coletiva, Emmanuel hoje
apresenta atraso no desenvolvimento psicomotor e fala pouco. Mas é "um menino feliz, doce e amoroso".
Com a confirmação de sua
identidade por teste de DNA na
semana passada, a guarda do
menino deve passar para a avó,
Clara González de Rojas, em
até 15 dias.
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