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A MORTE DO PAPA
Conclave deve durar mais de 3 dias devido a pouco contato
Cálculo é feito por cardeais eleitores, que
aproveitam período para ampliar
convívio
DO ENVIADO ESPECIAL A ROMA
O conclave que elegerá o sucessor de João Paulo 2º não terminará antes de três dias. Muito mais
provavelmente, levará cinco dias.
A expectativa é de um dos 116
cardeais eleitores (o 117º, o filipino Jaime Sin, não irá por estar
doente). Ele prefere não ter o nome publicado. A lógica por trás
do prazo é simples de explicar:
1) mesmo um cardeal eleitor
com mais de sete anos de trabalho
na Cúria Romana, o governo do
Vaticano, e que diz conhecer cerca de 70% de seus pares, não acha
que o conhecimento é suficiente
para lhe permitir definir o voto.
É natural, portanto, que cardeais que jamais trabalharam na
Cúria tenham ainda mais dificuldades. Um deles, aliás, vindo do
Leste Europeu, preferiu conversar
em latim com seu colega do lado,
em reunião da Congregação Geral
(espécie de Congresso que governa a igreja até a escolha do papa).
Não falava italiano, que é a língua franca do cardinalato.
O cardeal americano Francis
George, arcebispo de Chicago, assume abertamente essa lógica:
primeiro, diz que os cardeais hoje
se conhecem melhor que no passado, por causa de constantes encontros, como os sínodos.
Mas conhecer alguém é diferente de "desenvolver relações profundas", o que seria necessário
para votar com segurança, na opinião do cardeal de Chicago.
O raciocínio de George é mais
psicológico que teológico: "Mesmo que você conheça alguém a
partir de encontros, não pode saber se o conhece bem. Não sabe
como ele reage numa crise";
2) por isso tudo, os cardeais estão aproveitando esse período
pré-conclave para aprofundar o
conhecimento de seus pares.
Esperam, para os próximos
dias, que seja distribuído um "kit"
com um resumo biográfico de todos (o resumo -e não só dos cardeais eleitores- já está disponível na internet, no endereço do
Vaticano - www.vatican.va).
Olho no olho
A Folha quis saber do cardeal
que com ela conversou se ele votaria com base no resumo biográfico ou se preferiria uma conversa
"olho no olho". A resposta foi a
previsível: a conversa é indispensável, a não ser, é claro, no caso
daqueles cardeais sobre os quais o
conhecimento é mais profundo.
Um segundo elemento importante para definir não necessariamente o nome do futuro papa,
mas o perfil de igreja que se deseja
para o futuro surgirá na quinta.
O capuchinho Raniero Cantalamessa fará, com os cardeais que já
estiverem em Roma, uma reflexão sobre o tema. Cantalamessa é
o teólogo que mais vezes o papa
João Paulo 2º convidou para esse
tipo de exercício intelectual-teológico nas cerimônias de Páscoa.
Depois, já trancados a chave na
capela Sistina, os cardeais terão
uma segunda jornada de reflexão,
comandada dessa vez por um de
seus pares, cujo nome o Vaticano
prefere manter ainda em reserva.
O fato de um teólogo muito
próximo de João Paulo 2º ter sido
incumbido da primeira reflexão
significa que a sombra do papa
morto se prolongará até o conclave que escolherá seu substituto?
Não necessariamente. Se houvesse alguma intenção de influenciar o futuro, o testamento de
João Paulo 2º conteria alguma reflexão sobre os próximos anos,
coisa que não aconteceu. Nem é
da tradição dos papas, aliás.
A única sombra que ele deixará
ao sucessor é a avaliação de que
"seus sapatos são grandes demais", na metáfora do cardeal
Walter Kasper, presidente do
Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos.
Significa que a dimensão alcançada pelo papa é difícil de ser repetida por qualquer um dos cardeais.
É razoável supor que os cardeais
conversem sobre nomes, por serem também políticos, pertencentes à igreja que é o mais antigo
partido político do planeta. Mas
os que conversam com os jornalistas se recusam a especular em
torno de nomes. No máximo, admitem que, iniciado o conclave,
poderão perguntar a um colega
sobre um determinado prelado.
Essas conversas tendem a começar a ser intensificadas a partir
do dia 17. É nesse dia que os cardeais eleitores vão se instalar no
Hotel Santa Marta.
O Santa Marta, em geral ocupado por funcionários e dirigentes
da Cúria, será esvaziado neste domingo. A semana seguinte será
usada para limpeza e para o serviço de varredura destinado a impedir qualquer tipo de escuta.
Por enquanto, os cardeais estão
espalhados por toda Roma. Dos
quatro eleitores brasileiros, três ficam no Colégio Pio Brasileiro, a
um quilômetro do Vaticano. São
Eusébio Scheid (Rio), Cláudio
Hummes (São Paulo) e José Freire Falcão (emérito de Brasília).
Só dom Geraldo Majella (Salvador) fica na Casa do Clero em Roma, a cinco quadras da praça São
Pedro e, por extensão, da basílica
de São Pedro, em cuja capela Sistina, os cardeais escolherão o novo
papa, vigiados pelo afresco "O
Juízo Final", de Michelangelo.
(CLÓVIS ROSSI)
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