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Em 5 anos, Nova Orleans renasce branca
Maioria negra, retirada à força em megaenchente causada pelo Katrina em 2005, vê influência política se esvair
Prefeito da cidade é o 1º branco a ocupar o cargo desde 78; praticamente todos os órgãos eletivos locais embranqueceram
Gary Coronado - 30.ago.2005/Associated Press
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Moradores encaram inundação no centro de Nova Orleans
ANDREA MURTA
ENVIADA ESPECIAL A NOVA ORLEANS
A tragédia do furacão Katrina em Nova Orleans completa cinco anos neste mês
com um legado que vai muito
além das casas ainda destruídas da cidade: o equilíbrio de
poder foi totalmente realinhado, e a clivagem racial,
aprofundada.
A maioria negra, que sofreu retirada forçada durante
a enchente ocorrida após o
furacão, viu sua dominância
sobre a política das últimas
décadas ir se esvaindo até
que praticamente todos os
órgãos eletivos locais "embranqueceram".
Foi eleito neste ano o primeiro prefeito branco (Mitch
Landrieu) desde 1978. Na Assembleia Municipal, só há
um negro. Até o conselho de
educação tem maioria branca. E não há hoje um líder político negro que reagrupe a
comunidade. Antes do Katrina, as instituições tinham
maiorias negras.
Moradores e estudiosos
afirmam que a virada é resultado de um esforço deliberado. O primeiro plano de reconstrução da cidade previa
fazer parques nos bairros negros devastados. Para onde
os antigos moradores voltariam? De preferência, para
lugar nenhum.
O plano acabou vetado,
mas a reconstrução se focou
nas regiões de maior renda.
Bairros turísticos e de negócios estão recuperados. Já
a área do Baixo Distrito 9 (Lower 9th Ward), bairro negro
que sofreu um verdadeiro
tsunami quando as barragens se romperam e a água
dos rios inundou Nova Orleans, segue cheia de mato e
casas destruídas.
Quando a Folha visitou o
bairro, um dos poucos presentes, Craig Converse, 40,
nascido e criado ali, contou
que voltara havia só pouco
mais de um mês. "Aquele vizinho morreu na enchente,
aquele outro também", dizia,
apontando lotes vazios. "O
resto não sei onde está."
Lance Hill, diretor do Instituto Sulista de Educação e
Pesquisa da Universidade
Tulane, desconfia das estimativas de população da cidade. "As cifras são infladas.
É só andar no centro para ver
o abandono." Ele rejeita os
dados de que a população já
voltou a corresponder a 80%
da era pré-Katrina (355 mil).
"De 30% a 40% dos pobres
nunca voltaram."
O voto negro caiu junto. De
até 65% do total antes do Katrina, passou a até 53% na última eleição.
CLIVAGEM
Hill, que é branco, define o
motivo da mudança: racismo. Diz que a aristocracia
branca de Nova Orleans nunca se conformou em perder o
poder político pela mudança
demográfica.
"Brancos ricos abertamente aproveitaram a oportunidade" do Katrina, diz. "Houve um movimento real para
impedir a volta dos negros."
A cidade ainda é hostil aos
desalojados. Faltam empregos, e o único hospital público continua fechado.
Para a advogada de direitos civis Mary Howell, "a polarização e a divisão racial estão mais profundas hoje do
que há muito, muito tempo".
Figura icônica na cidade, Howell lembra que "muita gente disse em 2005 que estávamos melhores sem [os negros]". "Esse é um legado
muito doloroso do Katrina."
Até o especialista em reconciliação Ervin Staub, que
atuou em Ruanda após o genocídio, diagnosticou "trauma étnico em massa".
Mas, se expôs uma disputa
de poder, o furacão evidenciou a resiliência dos nativos.
Uma pesquisa de 2008 indicou que 75% dos ainda desalojados queriam voltar. "O
povo é quase inquebrável",
diz Howell. "A determinação
de lutar por suas casas e de
ser daqui, lutar por este lugar, foi e é enorme."
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