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Lisboa sedia 2ª Cúpula África-Europa
Em meio a saia justa entre o Reino Unido e o Zimbábue, encontro de 53 líderes visa incrementar relações comerciais
Documentos da primeira reunião, há cinco anos, não foram implementados; cuidado com o ambiente também está na pauta
VITORINO CORAGEM
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE LISBOA
Hoje e amanhã Lisboa será o
centro da política internacional. Se vierem todos os convidados, a 2ª Cúpula África-Europa contará com a presença de
53 chefes de Estado e de governo africanos, além dos 27 líderes dos países da União Européia. Sete anos após a primeira
reunião, no Cairo, Egito, os líderes políticos voltam a se juntar para discutir os problemas
que afetam os dois continentes.
Um forte aparato de segurança foi montado para o evento, o
maior já realizado no país.
Além da aprovação dos dois
documentos-base sobre a nova
parceria UE-África, a Estratégia Conjunta e o Plano de Ação,
o encontro deve aprofundar
cinco pontos essenciais: a paz e
a segurança; a democracia e os
direitos humanos; o comércio,
a infra-estrutura e o desenvolvimento; as migrações; e a
energia e alterações climáticas.
A África tem sido assolada
por guerras, pobreza e doenças.
"Democracia plena" só existe
para 1,2 milhão de africanos,
em um universo de mais de 800
milhões. É mais fácil ter um celular do que viver numa democracia no continente. A sua população representa 12% da
mundial, fazendo da África o
terceiro maior continente, depois da Ásia e das Américas.
A União Européia, com quase
500 milhões de habitantes, é o
seu maior parceiro comercial.
Segundo o Eurostat, foram
transacionados 218 bilhões
no ano passado. Os produtos
mais adquiridos da África pelos
27 Estados da UE são os combustíveis (51,5% do total em
2006), minérios e metais (14%)
e gêneros alimentícios (9,7%).
Discórdia
As divergências comerciais
entre os dois blocos serão abordadas na cúpula, podendo levantar alguma discórdia. No
entanto o chanceler português,
Luís Amado, ameniza a situação, ressaltando que serão discutidas "no âmbito de um debate que envolverá toda a problemática do desenvolvimento e
do investimento na África".
O Plano de Lisboa prevê o reforço do controle das normas,
padrões e qualidade dos produtos africanos. No que diz respeito às habituais dificuldades
de financiamento de programas de ajuda, o documento indica algumas alternativas, como o uso do Fundo Europeu
para o Desenvolvimento e do
Instrumento de Cooperação
para o Desenvolvimento, bem
como de instituições financeiras e internacionais.
As alterações climáticas serão outro dos temas de debate,
promovendo-se uma política
energética sustentável no continente africano.
De acordo com o relatório
anual do Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento Humano (PNUD), divulgado
na semana passada, a África será provavelmente o continente
mais afetado pelas conseqüências das alterações climáticas,
apesar de ser o menos poluidor.
Polêmica
A presença do ditador do
Zimbábue, Robert Mugabe, 83,
na cúpula tem gerado polêmica, pois o primeiro-ministro do
Reino Unido, Gordon Brown,
recusou-se a participar devido
à sua presença. Só nesta semana Portugal emitiu um visto para Mugabe. Quanto ao premiê
português, José Sócrates, também arranjou uma solução para
escapar do aperto de mão. A
Presidência portuguesa informou que não haverá a protocolar troca de cumprimentos. A
posição oficial é a de que as delegações dos 80 países, e ainda
de outros participantes e observadores, atrasariam o início
dos trabalhos.
O estranhamento entre Reino Unido e Zimbábue levou ao
adiamento da segunda cúpula,
em 2003. Londres adota desde
2000 sanções à ex-colônia africana e acusa Mugabe de violação dos direitos humanos.
Em declarações à agência Lusa, Louis Mitchel, o comissário
europeu do Desenvolvimento e
Ajuda Humanitária, defende
que as atenções não devam estar só no ditador do Zimbábue,
"tal a importância dos assuntos
que serão discutidos e que dizem respeito aos dois continentes". "Se falharmos, Lisboa
ficará na memória como uma
enorme oportunidade perdida", diz Mitchel.
Prisão
Na primeira Cúpula África-Europa, em 2003, traçaram-se
algumas linhas de cooperação
entre os dois continentes, assim como foi adotado um plano
de ação e uma declaração, mas
não foram implementados.
A eurodeputada socialista
Ana Gomes declarou que muitos dos líderes africanos que virão a Lisboa "deveriam estar na
prisão". No entanto, sublinha
que "a Europa tem de dialogar
com toda a gente, mesmo com
interlocutores menos recomendáveis".
Por outro lado, um grupo de
escritores africanos e europeus, como o nigeriano Wole
Soyinka, a sul-africana Nadine
Gordimer e o tcheco Vaclav
Havel criticou, declarou em
uma carta aberta publicada em
jornais africanos e europeus
que a falta de liderança empobrece a moral.
O olhar da Europa estará sobre Lisboa neste fim-de-semana. O continente africano viu,
durante séculos, os seus recursos humanos e naturais serem
explorados pelas potências européias. Os seus dirigentes vão
tentar aproveitar, mais uma
vez, essa oportunidade para ter
algo a dizer em relação ao seu
futuro. Em pleno final do ano,
depois de se saber, por exemplo, através do relatório anual
da ONU, que a Aids não pára de
matar na África, importa saber
se as palavras se transformarão
em atos.
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