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ARTIGO
Gaza, o bumerangue
NICHOLAS D. KRISTOF
DO "NEW YORK TIMES"
Em um momento no qual Israel está bombardeando Gaza
para tentar esmagar o Hamas,
vale lembrar que o governo israelense ajudou a fomentar o
crescimento do grupo.
Quando o Hamas foi fundado, em 1987, a maior preocupação israelense era o Fatah, de
Iasser Arafat. Calculando que
aqueles muçulmanos fundamentalistas dedicariam seu
tempo a orar, Israel permitiu
que o Hamas crescesse como
contrapeso ao Fatah.
O que estamos vendo no
Oriente Médio é a Síndrome do
Bumerangue. O terrorismo
árabe ajuda a reforçar o apoio
aos políticos israelenses de direita, que tomam medidas severas contra os palestinos, os
quais por sua vez respondem
com mais terrorismo. Os extremistas de lado a lado sustentam-se mutuamente, e os dois
lados tornam a vida do oponente a pior possível.
Visitei Gaza na metade do
ano passado e encontrei entre
os palestinos uma ambivalência que americanos e israelenses não parecem compreender.
Muitos moradores de Gaza
desprezam o Fatah como corrupto e incompetente e desgostam do excesso de zelo e da repressão do Hamas. Mas quando
estão sofrendo e se sentem humilhados, a ideia de que o Hamas está contra-atacando é
emocionalmente satisfatória.
É certo que Israel foi alvo de
profundas provocações, neste
caso. Quando um vizinho está
bombardeando seu território,
Israel precisa fazer algo.
Mas o direito israelense a fazer alguma coisa não inclui fazer qualquer coisa. Desde que
os ataques de artilharia da faixa
de Gaza foram iniciados, em
2001, 20 israelenses morreram
em explosões de foguetes ou
morteiros, segundo grupos israelenses de direitos humanos.
Isso não justifica uma invasão
terrestre aberta que causou a
morte de mais de 760 pessoas
(entre as quais é difícil distinguir militantes e civis).
O que Israel poderia ter feito
como resposta razoável? Bombardear os túneis pelos quais
armas são contrabandeadas para Gaza seria uma resposta proporcional, caso Israel tivesse se
limitado a isso, e o mesmo vale
para ataques aéreos contra determinados alvos do Hamas.
Uma abordagem ainda melhor
teria sido aliviar o cerco a Gaza,
e talvez criar um ambiente no
qual o Hamas poderia ter aceitado prolongar o cessar-fogo
expirado em dezembro. Quase
qualquer coisa teria sido melhor do que reagir com violência e gerar mais bumerangues.
"Essa política não está tornando Israel mais forte", aponta Sari Bashi, diretora executiva da Gisha, organização israelense de defesa dos direitos humanos que trabalha em questões relacionadas a Gaza. "O
trauma que 1,5 milhão de pessoas vêm sofrendo em Gaza terá efeitos de longo prazo sobre
nossa capacidade de conviver."
A estratégia de Israel vem
sendo a de causar sofrimento
aos cidadãos palestinos comuns na esperança de gerar má
vontade para com o Hamas. É
por isso que, a partir de 2007,
Israel reduziu os embarques de
combustível para as empresas
de energia e água de Gaza -e
hoje, depois dos bombardeios,
800 mil moradores de Gaza estão sem água corrente.
"A política israelense para
Gaza é divulgada como uma política de combate ao Hamas,
mas na verdade é uma política
contrária ao 1,5 milhão de habitantes de Gaza", diz Bashi.
Todos nós sabemos que a solução mais plausível para a confusão no Oriente Médio é a
criação de dois Estados. É difícil ver como poderemos chegar
lá, de onde estamos, mas um
passo seria fortalecer o presidente Mahmoud Abbas e sua
Autoridade Nacional Palestina.
Em vez disso, as informações
iniciais são de que o ataque a
Gaza está concentrando a ira
dos árabes em Abbas e vizinhos
moderados como a Jordânia, o
que solapa o esforço de paz.
Barack Obama disse relativamente pouco sobre Gaza. Inicialmente, dadas as provocações do Hamas, isso era compreensível. Mas à medida que a
invasão terrestre aumenta o
custo em vidas, ele precisa se
unir aos líderes europeus no
apelo por um cessar-fogo -e,
ao assumir a Presidência, precisa prover a verdadeira liderança de que o mundo precisa.
Aaron David Miller, veterano
negociador americano de paz,
sugere no novo e excelente livro "The Much Too Promised
Land" [a terra prometida demais] que os presidentes deveriam oferecer amor a Israel,
mas "amor severo". Assim, que
Obama encontre sua voz e ofereça amor severo a Israel.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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