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São Paulo, sexta-feira, 09 de maio de 2003

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Mercosul deixa a Alca como última prioridade

DO ENVIADO ESPECIAL

O candidato Néstor Kirchner jogou a Alca (Área de Livre Comércio das Américas) para um lugar remoto na lista de prioridades do Mercosul, em entrevista coletiva após encontro com o presidente brasileiro. "A tarefa de hoje é a construção do Mercosul", disse Kirchner. A prioridade seguinte seria a integração sul-americana, conforme, aliás, a posição e o empenho do governo brasileiro.
Só depois "iremos dando os passos seguintes", afirmou o candidato. Apenas em 2005, o ano em que deve terminar, pelo cronograma original, a negociação da Alca, é que o Mercosul pensaria "nos tempos e mecanismos" para levá-la adiante.
De quebra, Kirchner ainda mencionou que o mundo muda velozmente, insinuando que, até 2005, o interesse pela Alca pode até ter mudado ou acabado.
Lula, no encontro com o argentino, também pôs toda a ênfase na necessidade de fortalecimento do Mercosul e da integração da América do Sul em geral, o que está de acordo com a prioridade da política externa brasileira exposta nos discursos de posse de Lula e do chanceler Celso Amorim.
Lula, como Kirchner, acha que uma América do Sul mais integrada teria condições melhores para as negociações "em todas as frentes", o que inclui a Alca.
Na conversa entre os dois, no entanto, o tema Alca foi mencionado de forma muito genérica, conforme a Folha apurou.
O Itamaraty, por sua vez, nega que também o governo brasileiro esteja reduzindo a prioridade que dedica à Alca.
Mesmo a hipótese de propor adiar para 2007 o prazo para fechar a negociação, com a qual se especulou nesta semana, é desmentida.
Mas a especulação tem um fundamento: o Caricom (grupo dos países caribenhos) propôs, no mês passado, postergar as negociações ou fechar um pacote bem mais modesto, incluindo apenas acesso a mercados (ou seja, redução tarifária).
Se o pacote ficar mais reduzido, o Brasil perde na negociação agrícola porque só cairiam barreiras tarifárias, quando o protecionismo norte-americano se dá pela via não-tarifária.
Além disso, trabalha contra a Alca ou contra o prazo de 2005 a resistência à negociação de entidades da sociedade civil, próximas do PT. Há um permanente debate entre dialogar com o governo sobre os rumos da negociação ou insistir em recusar simplesmente a Alca.
Por isso, admite-se no Itamaraty que "continua sendo possível um gesto de chutar o pau da barraca", ouviu a Folha. Mas é uma possibilidade remota ao menos por ora.
Já o pouco caso de Kirchner para com o projeto de integração hemisférica foi tão palpável que a Folha perguntou ao candidato se seria correto afirmar que ele não mostrou "o menor entusiasmo" com a Alca.
"O senhor o está dizendo", devolveu o candidato, que leva em torno de 30 pontos percentuais de vantagem sobre o ex-presidente Carlos Menem, este sim um entusiasta do relacionamento com os Estados Unidos.
Durante seus dez anos de gestão (1989/99), Menem orgulhava-se de manter "relações carnais" com Washington, conforme expressão de seu chanceler Guido di Tella.
Kirchner diz que, se eleito, não haverá "relações carnais" com ninguém, nem mesmo no Mercosul, o seu projeto de integração preferido. "Serão relações solidárias, claras e concretas, para enfrentarmos juntos a exclusão, a fome e a quebra da região", afirmou. (CR)


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