São Paulo, domingo, 09 de maio de 2010

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Governo Zuma, 1, patina na África do Sul

Mandatário, que celebra um ano no poder, acumula críticas por não contrariar aliados, mas goza de crédito junto à massa

Táticas populistas bastaram para acalmar protestos logo no início do mandato, mas analista vê "bomba relógio social prestes a explodir"

FÁBIO ZANINI
DE JOHANNESBURGO

Ao completar o primeiro aniversário como presidente sul-africano, Jacob Zuma acumula críticas pela fraca liderança e dificuldade de contrariar aliados. A massa empobrecida, no entanto, ainda lhe dá crédito.
O que é consensual entre admiradores e detratores é o fato de Zuma ter tido um movimentadíssimo ano no poder.
O presidente teve um filho fora dos muitos casamentos, fez um teste público de Aids, enfrentou megaprotestos e viu um rapaz de 29 anos em seu partido agir desgovernado, revivendo o espectro de um confronto racial. Nos intervalos, gerenciou o final da preparação do país para a Copa e encontrou tempo para mediar a eterna crise no Zimbábue.
A maior dor de cabeça é Julius Malema, líder da ala jovem da sigla governista, que no país tem poder desproporcional -basta dizer que foi nela, nos anos 40, que Nelson Mandela iniciou sua carreira.
"O presidente demorou muito a agir e só o fez quando era tarde", diz Alana Bailey, vice-presidente do Afriforum, uma ONG que defende direitos da minoria africâner (descendentes de holandeses).
Em março, Malema desafiou Zuma entoando uma antiga canção de protesto cujo refrão pede "mate o bôer", termo que designa fazendeiros brancos.
Pouco depois, foi assassinado em sua fazenda Eugene Terreblanche, líder de um grupo radical africâner, por um negro.
O crime aparentemente não teve caráter político, mas cenas associadas ao apartheid, com cercas de arame farpado separando negros e brancos, retornaram. Zuma só então proibiu Malema de cantar.
A relutância em puxar a orelha do jovem radical tem relação com o fato de Malema ter apoiado Zuma em um momento constrangedor de sua Presidência. No início do ano, o anúncio de que o presidente havia tido um filho fora de seus muitos casamentos escandalizou um país que enfrenta a pior epidemia de Aids do mundo.
O presidente se desculpou, aceitou que dava um mau exemplo e conseguiu a façanha de terminar seu primeiro ano elogiado por ONGs de combate à Aids. "Ele fez gestos importantes e rompeu de maneira clara com a era do negacionismo", diz Katherine Tomlinson, pesquisadora sênior da Treatment Action Campaign, principal ONG do setor.
A referência ao "negacionismo" remete ao governo do ex-presidente Thabo Mbeki (1999-2008), que questionava a ligação entre a doença e o vírus HIV e receitava beterrabas para doentes, em vez de drogas de efeito comprovado. O "gesto" é o fato de Zuma ter aceitado se testar em público, estímulo a que homens façam o mesmo.
A economia foi uma sombra permanente no período. Zuma assumiu em meio à recessão mundial e não teve tempo de esquentar a cadeira antes de protestos em favelas pararem o país por duas semanas.
O presidente procurou ganhar os manifestantes na base do carisma, visitando comunidades carentes e aparecendo de surpresa na casa de prefeitos indolentes para checar se já haviam saído para o trabalho.
Mais importante, manteve a política econômica ortodoxa que herdou. "O país manteve seu bom desempenho na política monetária. A moeda se valorizou, e os juros puderam baixar, o que deve levar a um ciclo de crescimento", afirma Eustace Davie, diretor da Free Market Foundation, um centro de estudos sul-africano.
Para o segundo ano, a pauta é geração de empregos, segundo Davie. "Há uma bomba relógio social prestes a explodir", diz.


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