São Paulo, domingo, 09 de maio de 2010

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Radicalização marca rota de paquistanês

Educado e de classe média, autor do atentado frustrado de Nova York abraçou ideias extremistas nos últimos dois anos

Segundo relato de pessoas próximas, Faisal Shahzad teve de lidar com problemas financeiros e se enfureceu com ataques americanos

DO "NEW YORK TIMES"

O casamento deles foi arranjado: dois filhos de famílias paquistanesas proeminentes, jovens de bom nível educacional cujo enlace foi intermediado por um amigo comum.
Na cerimônia, seis anos atrás em Peshawar, os homens e as mulheres dançaram separadamente mas também juntos - "naquela época, era algo raro", recorda um convidado.
Quando voltaram aos EUA, os colegas dele na fabricante de cosméticos Elizabeth Arden celebraram com uma pequena festa no escritório.
O marido, Faisal Shahzad, tinha fotos da mulher, Huma Mian, em sua mesa no escritório da Arden em Connecticut.
Os dois compraram uma casa nova por US$ 273 mil, em Long Hill Avenue, Shelton, a 55 km da empresa. Quando se mudaram, Mian estava grávida, segundo vizinhos.
Enquanto transcorria mais um dia do interrogatório de Shahzad sobre o carro-bomba que ele admitiu ter estacionado na Times Square no dia 1º, surgiam novas notícias sobre o casal, acompanhadas por especulações quanto à radicalização de Shahzad. Conhecidos dizem que ele mudou nos últimos 12 meses, tornando-se cada vez mais reservado e religioso.
No ano passado, relatam amigos paquistaneses, ele chegou a pedir ao pai, Bahar ul-Haq, oficial reformado da Força Aérea paquistanesa, permissão para combater no Afeganistão. Haq recusou, segundo o relato, lembrando que o islã não permite que um homem abandone mulher e filhos.
Um dos convidados das núpcias disse em e-mail enviado do Paquistão que "não havia sinais de que Shahzad fosse extremista". Mas foi nos dois últimos anos, depois de mudar de emprego e ter dois filhos, que "começou a falar mais sobre o islã".
"A recessão os prejudicou", disse o convidado, que não quis ter seu nome publicado. O banco JPMorgan Chase recorreu à Justiça para executar a hipoteca sobre a casa em Shelton, que o casal abandonou às pressas, deixando para trás brinquedos e roupas.
Em fevereiro, ele alugou um apartamento em Bridgeport, Connecticut. O senhorio diz que nunca viu sua mulher.
Shahzad, 30, parece ter seguido uma trajetória conhecida de frustração, crescente religiosidade e, por fim, violência.
Nascido e criado no Paquistão, como parte de uma família de classe média, teve formação privilegiada.
Amigos da família dizem acreditar que Haq esteja escondido no oeste do Paquistão, onde a família é dona de plantações de trigo. A mulher de Shahzad, que, ao que se crê, também está no Paquistão, tem paradeiro desconhecido.
Nascida no Colorado em família de origem paquistanesa, ela se casou com Shahzad pouco depois de se formar em contabilidade, em 2004, e se mudou para o Connecticut, onde ele estava fazendo mestrado.
Os Shahzad não se relacionaram com os demais moradores do quarteirão em Shelton.
Não se sabe onde, como ou por que Shahzad veio a se radicalizar. Ahmad, o amigo oriundo de Mohib Banda, especulou que a transformação pode ter suas raízes em Karachi.
Um amigo de Shahzad foi detido em uma mesquita supostamente ligada a um grupo militante de Karachi, na terça.
"A questão é determinar quem colocou Faisal nesse caminho", disse Ahmad. "O Faisal barbudo que agora vemos é diferente do velho Faisal. Ele era como você ou eu, bem apessoado, liberal e uma pessoa ativa".
Segundo o governo paquistanês, Shahzad viajou ao Paquistão 13 vezes nos últimos sete anos. A queixa-crime apresentada contra ele na terça-feira diz que retornou aos EUA em fevereiro depois de uma estadia de cinco meses no Paquistão.

Hostilidade anti-EUA
Outro amigo da família, Kifayat Ali, diz que Shahzad talvez tenha se enraivecido com as ações militares americanas e se contaminado pela hostilidade anti-EUA que reina no Paquistão. "A pessoa vê a brutalidade no Afeganistão e Iraque. Essas cenas a afetam", diz Ali.
Uma antiga executiva da Elizabeth Arden diz que Shahzad nunca pediu pausas especiais para suas orações. "Creio que ele era um sujeito normal", ela diz. "Mas não é sempre assim? São sempre os normais, aqueles que você não acredita que farão algo assim."


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