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Lula pede papel maior para emergentes
"Externos" do G5 só entraram no último dia do encontro; resultado é que texto do grupo contradiz o documento só dos ricos
Trechos sobre patentes e
clima mostram divergências entre potências do G8 e os países em desenvolvimento convidados para a reunião
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL À ALEMANHA
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sugeriu ontem aos líderes do G8 (os sete países mais
ricos do mundo mais a Rússia)
uma inversão no formato até
agora adotado para ouvir países
emergentes como o Brasil.
"Eu propus que o G5 ou os
países convidados fossem chamados antes, que fizéssemos a
discussão antes, que disséssemos antes o que pensamos para
depois o G8 levar em conta a
existência de nossas propostas", afirmou Lula em entrevista coletiva ao final de sua participação na cúpula do G8+5 (os
cinco países externos ao grupo
principal convidados este ano e
que são África do Sul, Brasil,
China, Índia e México).
No formato adotado em Heiligendamm, a cidade alemã que
hospedou a cúpula 2007, o G8
aprova o documento final de
sua reunião e só no dia seguinte
(ontem) chama os cinco convidados externos. Estes cinco
mais a presidência do G8 (este
ano é da Alemanha) aprovam
um segundo documento, que
nada tem a ver com o texto final
da cúpula propriamente dita.
Lula argumentou, ante seus
pares, que o formato atual deu
margem a que "o documento
assinado pela Alemanha e pelo
G5 é um pouco contraditório
com o do G8".
Contradições
As duas contradições entre
os textos são estas:
1 - Mudança climática - "A
grande diferença, mais que divergência, é que o documento
G5+Alemanha enfatiza todo o
processo das Nações Unidas,
desde a conferência do clima (a
Rio-92), e enfatiza também o
fato de haver responsabilidades comuns mas diferenciadas
[no combate ao aquecimento
global]", como explicou o chanceler Celso Amorim.
Traduzindo: o G5 acha que
foram (e ainda são) os países ricos os principais responsáveis
pela emissão dos gases que causam o efeito estufa, que gera o
aquecimento global. Logo, eles
devem pagar um preço maior
para conter as emissões.
Já o G8, acrescenta Amorim,
"não diz que é contra isso, mas
enfatiza muito mais metas voluntárias para alguns países e
metas regionais. Vai por um caminho diferente e é curioso
porque de certa maneira a Alemanha assinou os dois".
De fato, Angela Merkel, a
chanceler alemã, fez questão de
chamar a atenção para o fato de
que, até 2012 (ano em que vence o Protocolo de Kyoto), haverá "emissões significativas dos
países em desenvolvimento".
Mais: comentou a observação
dos chineses de que emitem
per capita 1/3 dos gases emitidos pelos países industrializados, para depois ressaltar o fato
de que há, na China, 1,3 bilhão
de pessoas, o que torna o total
emitido bastante elevado.
2 - Propriedade intelectual
-O documento do G5+Alemanha reconhece o "papel crucial" da proteção aos direitos de
propriedade intelectual, mas
diz que tal proteção deve ser
feita "em conjunção" com "os
propósitos de proteção do ambiente e da saúde pública".
Tradução: sem essa ressalva,
fica mais difícil para o Brasil,
por exemplo, adotar o mecanismo de licença compulsória para importar medicamentos, como o fez recentemente com remédios para a Aids. O texto do
G8 não faz essa ressalva.
Lula não comentou se a sua
proposta de inverter a metodologia para o encontro do ano
que vem no Japão foi ou não
aceita. O formato exato da participação dos países emergentes será, na verdade, definido
no âmbito da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico,
clubão dos 30 países mais ricos
do mundo, do qual o Brasil só
não participa porque não quer).
O presidente brasileiro enfatizou também, na sua coletiva,
o otimismo que sente em relação a uma conclusão da Rodada
Doha de negociações comerciais, lançadas na capital do Qatar há seis anos e virtualmente
paralisadas desde então.
"Não se surpreendam se em
um tempo menor do que aquele que vocês esperam seja
anunciado um acordo", afirmou. É a enésima declaração
otimista de Lula sobre Doha
que acaba não conferindo com
os fatos posteriores.
Nesse capítulo, há plena
coincidência com o G8: o texto
final da cúpula, também pela
enésima vez, "urge dos ministros a cargo do comércio (...)
fornecer nas próximas semanas uma sólida plataforma para
as negociações".
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