São Paulo, sábado, 09 de junho de 2007

Próximo Texto | Índice

Lula pede papel maior para emergentes

"Externos" do G5 só entraram no último dia do encontro; resultado é que texto do grupo contradiz o documento só dos ricos

Trechos sobre patentes e clima mostram divergências entre potências do G8 e os países em desenvolvimento convidados para a reunião

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL À ALEMANHA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sugeriu ontem aos líderes do G8 (os sete países mais ricos do mundo mais a Rússia) uma inversão no formato até agora adotado para ouvir países emergentes como o Brasil.
"Eu propus que o G5 ou os países convidados fossem chamados antes, que fizéssemos a discussão antes, que disséssemos antes o que pensamos para depois o G8 levar em conta a existência de nossas propostas", afirmou Lula em entrevista coletiva ao final de sua participação na cúpula do G8+5 (os cinco países externos ao grupo principal convidados este ano e que são África do Sul, Brasil, China, Índia e México).
No formato adotado em Heiligendamm, a cidade alemã que hospedou a cúpula 2007, o G8 aprova o documento final de sua reunião e só no dia seguinte (ontem) chama os cinco convidados externos. Estes cinco mais a presidência do G8 (este ano é da Alemanha) aprovam um segundo documento, que nada tem a ver com o texto final da cúpula propriamente dita.
Lula argumentou, ante seus pares, que o formato atual deu margem a que "o documento assinado pela Alemanha e pelo G5 é um pouco contraditório com o do G8".

Contradições
As duas contradições entre os textos são estas:
1 - Mudança climática - "A grande diferença, mais que divergência, é que o documento G5+Alemanha enfatiza todo o processo das Nações Unidas, desde a conferência do clima (a Rio-92), e enfatiza também o fato de haver responsabilidades comuns mas diferenciadas [no combate ao aquecimento global]", como explicou o chanceler Celso Amorim.
Traduzindo: o G5 acha que foram (e ainda são) os países ricos os principais responsáveis pela emissão dos gases que causam o efeito estufa, que gera o aquecimento global. Logo, eles devem pagar um preço maior para conter as emissões.
Já o G8, acrescenta Amorim, "não diz que é contra isso, mas enfatiza muito mais metas voluntárias para alguns países e metas regionais. Vai por um caminho diferente e é curioso porque de certa maneira a Alemanha assinou os dois".
De fato, Angela Merkel, a chanceler alemã, fez questão de chamar a atenção para o fato de que, até 2012 (ano em que vence o Protocolo de Kyoto), haverá "emissões significativas dos países em desenvolvimento". Mais: comentou a observação dos chineses de que emitem per capita 1/3 dos gases emitidos pelos países industrializados, para depois ressaltar o fato de que há, na China, 1,3 bilhão de pessoas, o que torna o total emitido bastante elevado.
2 - Propriedade intelectual -O documento do G5+Alemanha reconhece o "papel crucial" da proteção aos direitos de propriedade intelectual, mas diz que tal proteção deve ser feita "em conjunção" com "os propósitos de proteção do ambiente e da saúde pública".
Tradução: sem essa ressalva, fica mais difícil para o Brasil, por exemplo, adotar o mecanismo de licença compulsória para importar medicamentos, como o fez recentemente com remédios para a Aids. O texto do G8 não faz essa ressalva.
Lula não comentou se a sua proposta de inverter a metodologia para o encontro do ano que vem no Japão foi ou não aceita. O formato exato da participação dos países emergentes será, na verdade, definido no âmbito da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, clubão dos 30 países mais ricos do mundo, do qual o Brasil só não participa porque não quer).
O presidente brasileiro enfatizou também, na sua coletiva, o otimismo que sente em relação a uma conclusão da Rodada Doha de negociações comerciais, lançadas na capital do Qatar há seis anos e virtualmente paralisadas desde então.
"Não se surpreendam se em um tempo menor do que aquele que vocês esperam seja anunciado um acordo", afirmou. É a enésima declaração otimista de Lula sobre Doha que acaba não conferindo com os fatos posteriores.
Nesse capítulo, há plena coincidência com o G8: o texto final da cúpula, também pela enésima vez, "urge dos ministros a cargo do comércio (...) fornecer nas próximas semanas uma sólida plataforma para as negociações".


Próximo Texto: Escudo antimíssil seguirá, diz Rice
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.