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CONFERÊNCIA CONTRA O RACISMO
Após sucessivos adiamentos devido à discussão sobre o Oriente Médio, texto reconhece escravidão como crime contra a humanidade
Documento final de Durban é aprovado
FERNANDA DA ESCÓSSIA
ENVIADA ESPECIAL A DURBAN
Depois de superar o impasse final sobre o Oriente Médio, a Conferência das Nações Unidas contra o Racismo, a Discriminação
Racial, a Xenofobia e a Intolerância Correlata terminou ontem, em
Durban (África do Sul). A escravidão e o tráfico de escravos foram
considerados "crimes contra a
humanidade".
A reunião, que começou em 31
de agosto e terminou com um dia
de atraso, produziu dois documentos: uma declaração de princípios e um plano de ação contra
o racismo. A aplicação dos dois
textos é recomendada aos países,
mas não é obrigatória.
O consenso exigido para a aprovação dos textos saiu, no entanto,
enfraquecido: só 99 dos 173 países
que participaram do encontro
acompanharam a sessão plenária
final, ocorrida por volta das 17h
de ontem (12h em Brasília).
Cerca de dez países apresentaram restrições aos documentos,
que serão incluídas no relatório final, a ser escrito pela brasileira
Edna Rolland.
Na declaração de princípios,
não há um pedido de desculpas
explícito pela escravidão e pelo
colonialismo tal como exigiam os
países africanos. A UE (União Européia) e os Estados Unidos eram
contra essa proposta.
Também não há referência a reparações aos países afetados por
esse dois fatos históricos. O texto
final fala apenas em "medidas efetivas para reverter as consequências" dos atos do passado.
O colonialismo ficou fora da definição de crime contra a humanidade. O texto afirma que o colonialismo levou ao racismo e causou sofrimento e que isso deve ser
lamentado e evitado.
Quanto às desculpas, o máximo
permitido pela UE foi o seguinte:
"A conferência nota que alguns
membros da comunidade internacional tomaram a iniciativa de
se arrepender, expressar remorso
ou apresentar desculpas e pede
àqueles que ainda não contribuíram para restaurar a dignidade
das vítimas que encontrem caminhos apropriados para fazê-lo".
O representante da UE declarou
que a decisão da conferência não
implicava responsabilidade judicial, ou seja, não deveria abrir caminho para que países afetados
pela escravidão entrem na Justiça
para exigir reparações.
Para esses países, a declaração
reconhece a necessidade de programas de desenvolvimento em
áreas como alívio das dívidas (e
não o perdão imediato, como
queriam os africanos), erradicação da pobreza e acesso aos mercados dos países desenvolvidos.
Na avaliação do embaixador
brasileiro Gilberto Saboia, os
acordos foram os possíveis. "Foi
importante o reconhecimento do
sofrimento provocado pelos fatos
do passado. Por outro lado, há
uma ambiguidade necessária,
principalmente sobre as reparações. É um debate que não está
encerrado aqui."
A alta comissária da ONU para
Direitos Humanos, Mary Robinson, disse ser normal que os documentos finais contenham reservas. "Cada um quer que se fale de
si mesmo, mas a conferência tem
de falar pelo todo", afirmou.
Oriente Médio
Os debates sobre o Oriente Médio dominaram a conferência até
o último minuto. Países árabes
exigiam que o documento final
acusasse Israel de práticas discriminatórias e racistas contra os palestinos, o que não era aceito pelos
Estados Unidos, pela UE e por outros países, inclusive o Brasil.
Insatisfeitos, EUA e Israel abandonaram a reunião. Após mais de
uma semana de negociações, chegou-se a um acordo final que não
fazia referência a supostas práticas discriminatórias por parte de
Israel, mas reconhecia o direito
dos palestinos à auto-determinação e a um Estado independente.
Quando o texto estava para ser
aprovado ontem, países árabes, liderados pela Síria, pressionaram
o plenário a rediscutir o tema, e a
UE ameaçou deixar o encontro.
A presidente da conferência,
ministra das Relações Exteriores
da África do Sul, Nkosakana Dlamina Zuma, fez um apelo desesperado no plenário aos delegados.
"Não vamos deixar que essa conferência sofra um colapso", disse.
Finalmente, a proposta síria foi
rejeitada, e Zuma encerrou a reunião: "Não ouço objeções, o documento está aprovado".
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