São Paulo, domingo, 09 de setembro de 2007

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Mineração reacende expansão econômica em Potosí

Opulência e insegurança convivem lado a lado nas minas de prata locais, onde 22 mil morreram neste ano na região de Cerro Rico

DO ENVIADO A POTOSÍ

Símbolo da exploração mineira européia durante a América colonial, Potosí e a sua aparentemente inesgotável montanha de prata vivem de novo uma forte expansão econômica provocada pela mineração. A boa notícia é que, agora, o dinheiro fica em mãos bolivianas. Mas a exploração caótica perpetua as péssimas condições de trabalho, multiplicando acidentes com morte.
Explorado há 462 anos, o Cerro Rico financiou a Europa durante dois séculos com a sua prata -estima-se que cerca de 62,5 mil toneladas do metal foram retirados dali. Hoje, os mesmos túneis coloniais são usados para extrair principalmente estanho e zinco, cujos preços no mercado internacional reativaram a mineração da cidade, praticamente paralisada entre 1985 e 2005.
Obviamente, Potosí nunca voltará à importância do século 16, quando a exploração mineira a transformou em uma das maiores cidades do mundo, à frente até de Paris e Madri.
Ainda assim, o rápido crescimento impressiona: de uma população de 139 mil habitantes, em 2001, a cidade hoje abriga cerca de 200 mil pessoas. No Cerro Rico, visível de praticamente qualquer lugar da cidade, o número de mineiros que se arriscam nos milhares de túneis saltou de 4.000, em 2004, para os atuais 16 mil.
Há sinais de opulência em todos os lados. Nas apertadas ruas do centro histórico, é comum um Hummer obrigar as pessoas a entrarem nos vãos das portas para não serem atropeladas. Nos bairros operários, há vários veículos de luxo estacionados diante de casas ou das lojas de artigos para mineração, onde se vende dinamite sem qualquer controle.
Outro orgulho recente é o time local, o Real Potosí, cujo dono é um empresário ligado à mineração: pela primeira vez, ganhou o campeonato boliviano (ajudado em parte por jogar a 4.070 metros de altitude).
Praticamente todos os mineiros que trabalham nas minas são índios quéchuas, quase todos recém-chegados do interior em busca dos altos salários para os padrões bolivianos. Muitos iniciantes têm 13, 14 anos. Um mineiro iniciante recebe hoje cerca de R$ 26 por dia, contra apenas R$ 7,5 de três anos atrás.
Há 20 anos, o principal modo de exploração do Cerro Rico é por meio de cooperativas, fundadas pelos poucos mineiros que não deixaram a cidade em 1985, quando houve uma forte queda dos preços. Hoje, ser sócio de uma cooperativa significa empregar até dezenas de mineiros novatos e ser parte de uma crescente força política.

Mortes
Com mais trabalhadores novatos, os acidentes letais não param de crescer. De janeiro até a semana passada, 22 mineiros morreram em acidentes no Cerro Rico, segundo dados da polícia. Já é o dobro de mortes registradas no ano passado.
Nas cooperativas, os equipamentos de segurança se resumem a botas e capacetes e muita superstição: as entradas das minas estão todas respingadas de sangue de lhamas sacrificadas em troca de proteção. Uma piada lúgubre diz que as mães aconselham as filhas a casarem com os mineiros porque "têm dinheiro e morrem primeiro".
"São várias cooperativas, umas com bom capital, outras iniciando, e as que estão iniciando entram com risco. O Cerro é como um formigueiro, buracos, por todos lados, buracos. Nem o próprio governo pode promover uma política de segurança no lugar", disse à Folha o prefeito de Potosí, René Joaquino. (FM)


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