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CORRIDA ARMAMENTISTA
Tratado de 91 com a Argentina será usado para tentar convencer Índia e Paquistão a cessar testes atômicos
Brasil exibe modelo para acordo nuclear
RUI NOGUEIRA
em São Paulo
Na rivalidade nuclear entre indianos e paquistaneses, os países
desenvolvidos e com arsenal atômico escolheram o subdesenvolvido Brasil para desempenhar
uma dupla função: oferecer o
acordo com a vizinha Argentina
como modelo para negociar uma
solução entre Índia e Paquistão e
assumir um papel ativo nas negociações internacionais.
Brasil e Argentina assinaram em
91 um acordo que autoriza comissões dos dois países a contabilizar
e controlar todos os materiais nucleares e a receber inspetores em
todas as instalações de pesquisa,
civis e militares.
O Brasil ganhou essa projeção
por ter ratificado praticamente todos os tratados de controle de programas de pesquisa nuclear para
fins pacíficos e bélicos.
A proposta de usar o acordo nuclear Brasil-Argentina como modelo de negociação foi feita pela
Cnen (Comissão Nacional de
Energia Nuclear), em Brasília, e
levada pelo presidente Fernando
Henrique Cardoso ao governo
norte-americano. Os EUA encaminharam a proposta à AIEA
(Agência Internacional de Energia
Atômica), que reuniu segunda-feira, em Viena, a sua junta de
governadores (órgão executivo).
O diretor-geral da AIEA, Mohamed al Baraddai, telefonou ontem
para a Cnen e disse que a junta de
governadores acatou a proposta
brasileira como forma de estimular Índia e Paquistão a negociarem
sem a interferência das potências
que reclamam dos testes e ameaçam com sanções, mas têm armas
nucleares -situação classificada
pelo governo indiano de "hipócrita".
A disputa regional entre a Índia
hinduísta e o Paquistão muçulmano é histórica e culturalmente
mais acirrada (entraram em guerra três vezes) do que a que existia
entre Brasil e Argentina até ao início das negociações para a criação
do Mercosul, nos governos José
Sarney e Raul Alfonsín (anos 80).
O traço comum está no uso que
as Forças Armadas e os governos
de Índia e Paquistão fazem da pesquisa nuclear como forma de afirmação regional e dissuasão pelo
medo.
Nos anos 70, quando Brasil e Argentina eram dominados por regimes militares, as Forças Armadas
montaram programas de pesquisa
com fins claramente bélicos.
Ganharia a corrida quem primeiro conseguisse explodir um
artefato nuclear.
Com a redemocratização e a crise econômica, mais a vigilância e a
pressão crescente dos EUA, que
barganharam a ajuda econômica
em troca do fim da aventura nuclear, os dois países partiram para
uma negociação diplomática encerrada com a criação da Abacc
(Agência Brasileiro-Argentina de
Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares).
Foi esse papel de bom moço na
questão nuclear, que o Brasil vem
desempenhando desde o governo
Sarney (85-89), quando começou
a ser desmontada a rivalidade nuclear com a Argentina, que levou
agora o G-8 (grupo dos sete países
mais ricos e Rússia) e a AIEA a
empurrar o Itamaraty para o cenário da negociação internacional.
Um papel que o governo brasileiro
aceita de bom grado.
Terça, no Senado
A Folha apurou que no encontro
com o presidente Bill Clinton, domingo passado, em Camp David
(EUA), FHC confirmou a iminente ratificação, pelo Senado, do
TNP (Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares).
A mensagem presidencial
apoiando o TNP foi encaminhada
ao Congresso em junho do ano
passado e deve ser votada na Comissão de Relações Exteriores e
Defesa Nacional, do Senado, na
próxima terça-feira. Dos tratados
internacionais importantes, é o
único que falta ratificar.
Até chegar ao TNP, o Brasil assinou o acordo com a Argentina, o
Tlatelolco (não-proliferação entre
países latino-americanos), o Quatripartite (com a AIEA), o com o
chamado "Clube de Londres"
(que autoriza o país a ser supridor
de materiais nucleares) e o MTCR
(Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis).
A postura contra a pesquisa nuclear para fins bélicos foi reforçada no governo FHC com a decisão
de assinar o TNP, o tratado que
enfrentava a oposição mais organizada entre setores das Forças
Armadas e da diplomacia. Esses
setores consideram o TNP discriminatório -não acaba com o arsenal nuclear existente.
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