|
Próximo Texto | Índice
Escândalo da mala derruba funcionário de Kirchner
Demitido leva culpa por "carona" a venezuelano que seria dono de dólares suspeitos
Em ano eleitoral, é a quarta baixa no governo argentino por suposta corrupção; presidente diz que nunca se fiscalizou tanto no país
RODRIGO RÖTZSCH
DE BUENOS AIRES
O governo argentino demitiu
ontem o presidente do Ente
Regulador de Pistas, Claudio
Uberti, por ter dado carona em
um avião ao empresário venezuelano Guido Antonini Wilson, que tentou entrar na Argentina, no sábado, com uma
mala com US$ 790,5 mil.
Em ano eleitoral, é o quarto
funcionário do governo de Néstor Kirchner demitido por suspeitas de irregularidades. A
mulher do presidente, Cristina
Fernández de Kirchner, é a
candidata favorita à eleição
presidencial de outubro.
Antonini Wilson, que na última terça-feira deixou a Argentina rumo a Montevidéu, foi denunciado ontem pela procuradora criminal Maria Luz Rivas
Diez por suposto contrabando.
A investigação de Diez por
enquanto não inclui Uberti
-contra quem, no entanto, foi
aberta outra apuração, na Justiça Federal, em resposta a uma
denúncia de Ricardo Mussa,
empresário peronista. Mussa,
que diz ter testemunhado a
chegada do avião ao aeroparque de Buenos Aires, no último
sábado, disse que Uberti ameaçou os funcionários da Alfândega de demissão caso não o deixassem passar. O Cessna 750 X,
fretado pela estatal de energia
Enarsa, vinha da Venezuela.
O anúncio da demissão foi
feito logo no início do dia por
Julio de Vido, ministro do Planejamento, a quem Uberti era
subordinado. "Em decorrência
de erros que se cometeram no
contexto de sua visita [de Uberti] à Venezuela, incorporaram-se ao avião pessoas alheias à delegação original e concebemos
isso como um erro. Ele o admitiu e, obviamente, solicitamos a
ele que renunciasse", afirmou
De Vido.
Dois pesos
O governo argentino adotou
uma posição diferente em relação ao presidente da Enarsa,
Exequiel Espinoza, que também estava no avião. "Ele não
tem nada a ver com este tema.
Claro que continua no cargo",
disse o chefe-de-gabinete, Alberto Fernández.
Fernández atribuiu a responsabilidade pelo ocorrido
aos funcionários da PDVSA (estatal venezuelana do petróleo)
que estavam no Cessna. "Houve um abuso da boa-fé dos funcionários argentinos por parte
dos funcionários venezuelanos,
que pediram para trazer uma
pessoa que tinha uma mala
com semelhante quantidade de
dinheiro, sem que ninguém o
soubesse."
Na realidade, a única prova
de que a mala pertencesse a
Wilson é o fato de ele ter se
identificado como seu proprietário. Como não havia fundo
falso na mala, a polícia alfandegária interpretou que não houve tentativa de esconder o dinheiro, motivo pelo qual o episódio foi enquadrado a princípio como infração aduaneira.
Isso permitiu que Wilson não
fosse detido e deixasse o país na
terça de manhã.
A oposição não se deu por satisfeita com a demissão de
Uberti, porém, e cobrou a exoneração do próprio De Vido.
"De Vido e toda a gente que o
acompanha institucionalizaram um mecanismo de corrupção", disse o presidente da oposicionista UCR (União Cívica
Radical) e candidato a vice na
chapa de Roberto Lavagna, Gerardo Morales.
O deputado Adrian Pérez,
aliado da candidata à Presidência Elisa Carrió, levantou a hipótese de que o dinheiro fosse
uma contribuição ilegal para a
campanha de Cristina Kirchner. "Já havíamos dito que
Uberti e De Vido apareciam como arrecadadores [na campanha presidencial de 2003]. Hoje estamos diante do mesmo arrecadador às vésperas de uma
campanha eleitoral. Pode ser
um modus operandi", disse.
A legislação argentina proíbe
doações de campanha de cidadãos, governos ou empresas estrangeiros.
O presidente Néstor Kirchner, no entanto, disse que a sucessão de escândalos é fruto do
trabalho de controle e fiscalização de seu governo, "que não
esconde nada".
"Pela primeira vez na Argentina se combate a sério a corrupção. Fazemos os controles
em todas as áreas que temos
que fazer, caia quem caia. Vou
em busca da verdade permanente", afirmou Kirchner, que
disse ainda não pôr a mão no
fogo por ninguém.
Próximo Texto: Perfil: Ministro forte é pivô de nova crise Índice
|