São Paulo, domingo, 10 de setembro de 2006

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Morte obriga mulher e filho a trabalhar; médico de RO nega ter assinado óbito

DA REPORTAGEM LOCAL

Planejada para melhorar de vida, a tentativa de emigrar de Ronaldo Ribeiro piorou a situação de sua família. Sua mulher, uma dona-de-casa que estudou até a 6ª série, agora trabalha de faxineira. Já o filho mais velho, de 16 anos, virou empacotador de supermercado.
Apesar de ter estranhado a certidão de óbito de Rondônia -aonde o marido nunca teria colocado o pé-, Andréa não denunciou o caso: "Não faz diferença, não vai trazer ele de volta". A viúva não soube explicar por que os atravessadores lhe enviaram um atestado de óbito, já que o documento poderia ter sido emitido pelo Itamaraty -onde, aliás, está em tramitação.
Andréa Marcolino diz desconhecer as pessoas que levaram Ronaldo. "Ele mesmo resolveu tudo. A única coisa que eu sei que ele fez, porque a gente é pobre, não tem dinheiro, é que ele empenhou a casa que a gente tinha." Segundo ela, "um colega" do marido prometeu lhe "arrumar um serviço" fora do país.
"A gente ia continuar morando, e ele ia trabalhando e mandando o dinheiro aos poucos. Quando ele acabasse de pagar, eles voltavam a casa para a gente. Só que, como ele não chegou, mandaram os papéis de novo da casa com meu nome."
Depois de reaver a escritura, a família vendeu a casa por R$ 12 mil e se mudou de Tarumirim para Ouro Branco, também em Minas, onde vive o irmão de Andréa. Lá, mora com os dois filhos e uma sobrinha.
"Depois que ele morreu é que comecei a trabalhar. De faxineira. Graças a Deus, até que a gente não está precisando assim de ajuda... O meu pequenininho, sim, de 12 anos, tem problema, é albino. Ele vai para a escola especial de manhã, aí a minha sobrinha, que mora com a gente depois que a mãe morreu, arruma almoço pra ele."
Confrontado com a versão da viúva, o motorista Antônio da Paz reafirmou que o seu amigo Ronaldo Ribeiro morreu em Chupinguaia (RO). "Quem está destruindo a viuveza [sic] do atestado é ela", disse, nervoso.
Antônio descreveu Ronaldo como "moreno claro, mais para claro", sem contradizer a foto do passaporte. "Ele era divertido que nem uma nota de R$ 100. Quando você pega uma nota de R$ 100, não fica alegre?".
O motorista, no entanto, não soube indicar nenhuma outra pessoa em Rondônia que houvesse conhecido Ronaldo.
A reportagem procurou o médico que aparece como signatário da declaração, Gilberto Póvoas Jr. Ele negou conhecer o caso e disse que raramente assina atestados de óbito por ser ginecologista e obstetra. "O único atestado recente que assinei é de um paciente que teve o pescoço cortado com uma garrafa de uísque."
Andréa disse que seu marido queria apenas juntar dinheiro o suficiente para montar um negócio. "Ele me disse: "Se Deus quiser, nós vamos melhorar, eu não quero ir para ficar rico. Quero ir para ganhar um dinheirinho, abrir uma oficina"."
A família espera agora o envio dos pertences de Ronaldo. "É um cordão com uma cruzinha. E acho que tem de ter as roupinhas que levou, né?" (FM)


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