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Comediante se descobriu árabe depois de atentados
Filho de pai palestino, Dean Obeidallah transforma preconceito em comédia
Sobrenomes árabes e muçulmanos começam a ocupar palcos de Nova York para mostrar como são suas vidas e fazer auto-ironia
GUSTAVO CHACRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA,
DE NOVA YORK
Os melhores amigos do comediante árabe-americano
Dean Obeidallah, 36, antes do
11 de Setembro, tinham nomes
como John, Michael, Andrew.
Na época, como gosta de dizer
nos seus shows, ele ainda era
um "branco" nos Estados Unidos. Após os ataques, passou a
andar com pessoas chamadas
Ahmed, Said, Mohammed. "Virei um árabe."
De pele bem clara, nascido
em New Jersey, com mãe italiana e pai palestino, torcedor do
time de beisebol Yankees, freqüentador do Village, vestido
com roupas da Banana Republic e da Gap, Obeidallah se descreve como um jovem americano comum de Nova York. "Não
tenho nada a ver com aqueles
terroristas."
O problema, segundo Obeidallah, é que outros americanos
passaram a olhar pessoas de
origem árabe e/ou islâmica de
uma forma diferente. No seu
show, ele descreve situações
constrangedoras que passou a
enfrentar desde os atentados e
que são comuns entre árabes e
muçulmanos nos EUA.
"Passaram a me perguntar:
Você conhece o Bin Laden? Por
que vocês árabes são tão revoltados? Nossa, você é árabe mas
parece tão simpático." O pior,
diz ele, são os amigos que aparecem e dizem em tom brincadeira: "Se você souber de algum
atentado, me avise".
Logo após o 11 de Setembro,
Obeidallah afirma que sua vida
mudou completamente, pois o
ódio contra pessoas de origem
árabe cresceu nos EUA. Um
primo dele chegou a ser agredido na escola em um dos mais de
500 ataques contra árabes e
muçulmanos.
Como não tem a aparência
estereotipada de árabe e tem o
inglês como língua nativa, muitas pessoas não percebem que
estão diante de uma pessoa de
origem árabe. "Já escutei várias
vezes de americanos que todos
os árabes deveriam ser mortos", afirma no espetáculo chamado "Eu vim em paz", que estava em cartaz em Nova York
até a semana passada.
Descoberta de origens
Com a vida afetada pelos ataques, Obeidallah começou a se
apegar às suas origens, viajando ao Oriente Médio e estudando mais a história da região. E,
da mesma forma como os judeus fazem por meio do já conhecido humor judaico, passou
a ver o lado engraçado no fato
de viver em Nova York sendo
árabe no pós-11 de Setembro.
Hoje, assim como Jerry Seinfeld e Larry David faziam nos
anos 80 com o judaísmo, sobrenomes árabes e muçulmanos
aos poucos começam a ocupar
os palcos dos clubes de comédia de Nova York para mostrar
como é a vida deles e também
para ironizar um pouco o islamismo. Em novembro, ocorre o
quarto festival anual de comédia árabe-americana.
Obeidallah já é figura constante em programas de TV e em
artigos de jornais americanos.
Assim como a iraniana (que é
persa, não árabe) Negin Farsad.
Na sua apresentação, ela conta
a história de sua ida ao Irã para
o casamento da prima. Antes,
compara a vida das duas. Enquanto uma nasceu na Califórnia, estudou em Nova York e
perdeu a virgindade em Paris, a
outra nunca deixou o Irã e se
casou virgem sem nunca ter
beijado o futuro marido.
Crítica do atual governo iraniano, ela descreve a vida de parentes em Teerã.
"Não interessa o que ocorra
no país, meus primos dizem:
Espere pela mudança do regime. Já o meu tio fica bebendo
uísque escondido no banheiro e
relembrando a época do xá [Reza Pahlevi, deposto na Revolução Islâmica de 1979], quando
podia freqüentar boates em
Teerã e sair com uma mulher
diferente por noite. Já o primo
gay tem que se contentar em
organizar casamentos e dar
opiniões sobre as roupas das
parentes", conta Farsad no seu
espetáculo.
Obeidallah afirma que muitos apontam os árabes como os
novos negros dos EUA. "Seria
bom se fosse assim, com craques no basquete, música e estilo de se vestir copiado por todos." Mas, para o comediante,
segundo sua declaração no fim
do seu espetáculo, "os árabes e
os muçulmanos são a nova
União Soviética".
"Até surgir um novo inimigo,
os árabes serão colocados como
os maus da história", afirma
Obeidallah, mostrando no telão
uma lista de 350 filmes, todos
anteriores a 11 de Setembro,
que colocam os árabes entre os
vilões. ""Poseidon", "Black Sunday", "De Volta para o Futuro" e
até mesmo vários filmes pornográficos", diz ele.
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