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Revolta de Oaxaca é Chiapas ampliada
Para Margarita Dalton, estudiosa da revolta que paralisa Estado mexicano, estereótipo da submissão de índios está desatualizado
Antropóloga diz que educação e posse de terra conscientizaram indígenas; prédios públicos estão ocupados por movimento
RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL
Por muito tempo considerados "submissos", os indígenas
mexicanos lideram o maior
movimento de revolta social no
México, que praticamente deixou sem governo o Estado de
Oaxaca, no sul do país.
Uma greve de professores
iniciada em 22 de maio desembocou em uma revolta que uniu
indígenas, desempregados, sindicalistas e até grupos guerrilheiros, todos pedindo a renúncia do governador do Estado,
além de combate à pobreza regional.
Todos os prédios públicos estaduais estão ocupados pelo
movimento, que fundou a Assembléia Popular dos Povos de
Oaxaca (APPO).
"A insensibilidade do governador com os professores foi a
faísca que acendeu a fogueira
que estava pronta para arder",
disse à Folha a antropóloga e
historiadora Margarita Dalton,
do Centro de Estudos em Antropologia Social.
"O estereótipo do indígena
submisso que prevaleceu na
América Latina por muito tempo foi derrubado aqui. A consciência e a atitude deles mudaram. A partir da Revolução Mexicana, que fez a reforma agrária, e com a educação nas décadas seguintes, surgiram líderes
locais, intelectuais orgânicos,
que atuam nos movimentos sociais. Os pobres de Oaxaca estão lutando por seus direitos."
Oaxaca (pronuncia-se "oarraca") é o segundo Estado mais
pobre do México, depois de
Chiapas, justamente onde
eclodiu o movimento zapatista
em 1994, liderado pelo subcomandante Marcos. Os dois Estados são os de maior população indígena no país. Oaxaca
repete Chiapas, mas com possibilidade de mudar a política do
Estado na marra.
"Ao contrário de Chiapas, os
indígenas oaxaquenhos sempre tiveram terras. As fazendas
coloniais não funcionaram
bem no Estado porque os índios preferiam trabalhar seu
pedacinho. Esse é o ponto de
partida para uma atitude política diferente", diz Margarita.
Depois da confirmação, na
última terça-feira, de que o
conservador Felipe Calderón
venceu as eleições presidenciais de 2 de julho, depois de
dois meses de batalha jurídica,
a crise de governabilidade em
Oaxaca é o tema que ocupa as
manchetes dos principais jornais mexicanos.
Cidade sitiada
Para Margarita Dalton, que
mora em Oaxaca, o movimento
é espontâneo. "Todos os grupos
marginalizados se uniram por
um governo mais horizontal e
que dê respostas à pobreza. Até
os guerrilheiros fazem propostas na Assembléia e sugerem
mudanças na Constituição, ou
seja, optam pela via legal, não
só pela via armada."
Nos últimos dias, porém, o
movimento se tornou mais violento. Na quinta-feira, até os escritórios provisórios do governo foram tomados pelo movimento, e pichados com os dizeres: "Território da APPO".
Funcionários públicos e policiais foram amarrados e levaram um banho de tinta verde ao
tentarem impedir a ocupação
de uma repartição estadual. Há
apenas dez dias o governo nacional começou a fazer uma
mediação entre os manifestantes e o governo.
Como a greve dos professores atraiu a solidariedade dos
movimentos sociais após uma
violenta repressão policial, a
polícia agora tem ordem de não
intervir, e está praticamente
ausente do conflito.
Sem policiamento, a capital
do Estado, também chamada
Oaxaca, vive um toque de recolher. Às oito da noite, suas ruas
estão vazias. Lojas funcionam
com as portas fechadas. Cartazes informam: "Estamos trabalhando, toque a campainha".
Encarecida pelo turismo
Bem diferente do que costumava acontecer até maio. A cidade de Oaxaca era presença
constante em revistas americanas e européias de turismo. Tinha o centro histórico colonial
mais bem conservado do México e um dos mais vistosos da
América Latina. Em 2002, foi
proibida a abertura de um Mac
Donalds para não interferir no
patrimônio arquitetônico.
Cheia de turistas endinheirados, a cidade vivia um boom de
ateliês de arte, galerias e dezenas de lojas de artesanato. "A
cidade ficou muito cara para os
locais; essa é uma das causas
que motivou as reivindicações
salariais do magistério", diz a
antropóloga.
Oaxaca está quase irreconhecível agora. Foi sitiada por barricadas, que fecharam os acessos de veículos ao centro histórico. Ônibus incendiados servem de barreiras. Faltam frutas
e legumes no mercado municipal porque fornecedores têm
medo de entrar na cidade.
Os poucos turistas que ainda
se atrevem a visitar a cidade
vêem prédios coloniais e barrocos com a pichação, muito realista: "No hay gobierno".
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