São Paulo, domingo, 11 de janeiro de 2009

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Hillary revelará posição de Obama

Em sabatina da futura secretária de Estado dos EUA pelo Senado, atenções se voltam para política sobre Israel

Sessão acontece nesta terça; críticos veem divergências entre chanceler, mais linha-dura, e o presidente eleito, contrário a isolar o Hamas

DANIEL DOMBEY
DO "FINANCIAL TIMES", EM WASHINGTON

Hillary Clinton vai romper o quase-silêncio da equipe Barack Obama sobre os combates na faixa de Gaza na próxima semana, quando apresentar seu pensamento sobre o Oriente Médio e outros temas.
A provável próxima secretária de Estado dos EUA será alvo das atenções em todo o mundo, depois de outros países terem assumido a liderança na busca por um cessar-fogo e depois de o presidente eleito, que tomará posse em 20 de janeiro, ter se limitado a emitir generalidades vagas sobre o conflito.
Talvez o símbolo mais marcante do dilema com que Washington se confronta tenha sido a abstenção do governo de George W. Bush, na semana passada, na resolução do Conselho de Segurança da ONU pedindo um cessar-fogo em Gaza. Alguns a veem como mais uma prova da relutância dos EUA em censurar Israel; outros, especialmente em Israel, interpretam o fato de Washington não ter vetado como um dos mais importantes sinais dos últimos anos de distância entre os EUA e Israel. São as posições de Hillary Clinton em política externa, e não dúvidas quanto a suas chances de ser ratificada como secretária de Estado, que deverão estar ao centro das atenções na audiência no Senado, terça-feira, para confirmar sua nomeação.
"Ela tem uma candidatura muito forte", disse Richard Lugar, o republicano de mais alto nível na Comissão de Relações Exteriores do Senado.

Diálogo com Hamas
Um foco das atenções será o Hamas. Obama já excluiu publicamente a possibilidade de contatos diretos com a organização islâmica, mas até mesmo o governo Bush afrouxou sua política de isolamento total dela ao incentivar o Egito a mediar o cessar-fogo entre Hamas e Israel expirado em dezembro. Mas as promessas de Obama e Hillary de concentrarem sua atenção no processo de paz assim que subirem ao poder chegam contra o pano de fundo de um apoio maior dos EUA a Israel nos últimos 15 anos, depois que o ex-presidente George H.W. Bush (1989-1993) usou garantias de empréstimos para pressionar o país.
Na semana passada, o Senado americano aprovou por unanimidade uma resolução declarando que "se posiciona ao lado de Israel", e ontem a Câmara deveria ratificar uma medida semelhante. Nos últimos dez anos, Hillary também se mostrou aliada confiável de Israel. Durante sua disputa com Obama pela indicação presidencial democrata, ela avisou que os EUA poderiam "obliterar" o Irã no caso de um ataque nuclear contra Israel, explicando que o pensamento da Guerra Fria em relação à dissuasão poderia ajudar a frustrar as ambições de Teerã.
No ano passado, na conferência anual do grupo pró-Israel Aipac, Hillary disse que rejeita a hipótese de negociar com o Hamas enquanto este se negar a reconhecer Israel.

Moderação
Mesmo assim, alguns analistas acreditam que ela possa abrandar suas posições, uma vez instalada no cargo. "O tipo de atitude linha-dura que vimos emanando dela vai diminuir quando ela estiver em seu novo papel", diz Steve Clemons, da fundação New America, um instituto de estudos com sede em Washington. "Sua campanha já terminou, e ela não será mais senadora por Nova York, que representa um dos maiores e mais ricos bolsões de contribuintes judeus no país."
Boa parte do trabalho do dia-a-dia com relação a Israel e palestinos deve ser confiado a um novo enviado para a região, que trabalhará com Dennis Ross, o ex-alto funcionário do Departamento de Estado selecionado para exercer um papel mais amplo no trato com o Irã, acusado por muitos analistas americanos de travar uma guerra por procuração contra Israel, por meio do Hamas e do movimento xiita libanês Hizbollah.
Um terceiro enviado, Richard Holbrooke, que foi embaixador na ONU durante o governo Bill Clinton, deverá trabalhar com o Afeganistão e Paquistão. Anne-Marie Slaughter, acadêmica de Princeton prevista para exercer um alto cargo político no Departamento de Estado comandado por Hillary Clinton, disse em uma conferência em Washington nesta semana que o novo governo não tratará de Israel-palestinos isoladamente, mas como um de uma série de problemas interligados. "O presidente eleito Obama e a secretária Hillary enxergam o Oriente Médio como uma área que vai de Israel à Índia", disse ela.
Mas alguns observadores especulam que Hillary pode ter dificuldade em criar uma voz própria forte se os enviados especiais adotarem papéis de destaque, enquanto figuras em outros setores do novo governo -quer seja o vice-presidente eleito Joe Biden ou o secretário Robert Gates (Defesa)- também procuram determinar as diretrizes da política externa. Richard Armitage, ex-sub secretário de Estado sob George W. Bush, disse ao "Financial Times": "Parece-me que é sempre melhor começar com menos enviados especiais, em lugar de começar com muitos e ter que reduzi-los".
O maior risco de todos é de uma divergência com Obama, que durante as primárias partidárias falou sobre o Irã em tom consideravelmente mais moderado que Hillary. Os inimigos do novo governo, dentro e fora do país, já estão atentos para tais tensões. "A verdadeira dúvida de política externa no primeiro ano será quanto tempo vai levar para que Hillary e Obama entrem em conflito aberto", disse um ex-funcionário da administração Bush.

Tradução de CLARA ALLAIN


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