São Paulo, sábado, 11 de março de 2006

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ARTIGO

É preciso derrotar Berlusconi

UMBERTO ECO

Estamos diante de um prazo dramático. Desde 2001, a Itália decaiu em todas os sentidos: o respeito pelas leis e a Constituição, a situação econômica, o prestígio internacional. Se tivermos de passar por mais cinco anos de governo do Pólo das Liberdades (a coalizão de direita encabeçada por Silvio Berlusconi), sendo representados diante do mundo por gente como Roberto Calderoli (ministro obrigado a renunciar por ter usado uma camiseta estampada com caricaturas do profeta Muhammad, o que desencadeou tumultos sangrentos na Líbia) e pelos mais recentes recrutas da Força Itália, os impenitentes do fascismo em versão Saló, o declínio de nosso país será inexorável e, possivelmente, definitivo.
É por essa razão que o encontro marcado de 9 de abril é diferente de todas as eleições que já tivemos até agora: antes, tratava-se de escolher quem iria governar, sem precisar temer a chegada de um governo que colocasse as instituições democráticas em risco. Desta vez, trata-se simplesmente de salvar essas instituições. Os partidos de oposição procuram atrair os votos dos indecisos que votaram no Pólo e sentem-se traídos. Eles cumprem seu dever, mas creio que seja preciso aplicar um raciocínio diferente.
Não são os indecisos que votaram na direita na última vez que representam o risco maior nestas eleições (ou eles vão votar como antes, por convicção ou por preguiça, ou vão se abster). Considero que seja necessário esforçar-se para convencer os eleitores de esquerda decepcionados.
Nós os conhecemos; eles são muitos, e este não é o lugar para discutir as razões de sua insatisfação. Mas é a eles que convém recordar que, se se deixarem levar por esse descontentamento, vão contribuir para deixar a Itália nas mãos daqueles que conduziram o país à ruína. Nenhum descontentamento, mesmo que seja inteiramente justificado, pode comparar-se ao medo de uma involução fatal de nossa democracia, à indignação de todo democrata sincero diante do massacre que vem sendo feito das leis, da separação dos Poderes, do próprio sentido do Estado. É isso que cada um de nós deve repetir a seus amigos indecisos e decepcionados. É deles e de seu engajamento que vai depender que a Itália possa evitar ser, por mais cinco anos, um terreno de rapina de pessoas que não sabem defender senão seus interesses privados.
Mesmo se esses amigos tiverem decidido exercer seu espírito crítico com toda equanimidade (saber criticar seu próprio campo é sinal de honestidade intelectual), eles devem sacrificar seus sentimentos, por enquanto, e se juntar a nós no esforço coletivo.
Convencer, é esse o dever e a tarefa de todos aqueles que, nos últimos anos, participaram das discussões cidadãs. O navio corre o risco de afundar. Que cada um retorne a seu posto.


O semiólogo italiano Umberto Eco é autor, entre outros, de "O Nome da Rosa" e "A Misteriosa Chama da Rainha Loana".
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Tradução de Clara Allain


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