São Paulo, domingo, 11 de abril de 2004

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ENSINO

Casa Branca privilegia a Patrick Henry, em Virgínia, que tem o objetivo de formar líder políticos ultraconservadores

Faculdade alimenta direita cristã dos EUA

RAFAEL CARIELLO
ENVIADO ESPECIAL A PURCELLVILLE (EUA)

Vinte e poucos anos, ainda virgens, os alunos da Patrick Henry College só pensam numa coisa: política.
Faculdade ultraconservadora, no currículo e na disciplina, seu objetivo manifesto -"por Cristo e pela liberdade"- é formar líderes políticos para a direita cristã. A instituição é uma das faces mais visíveis de um grupo que ganha espaço político sob o governo de George W. Bush: evangélicos de direita, contrários ao aborto, favoráveis à intervenção mínima do Estado em suas vidas e ao unilateralismo americano na política externa.
Com apenas quatro anos de existência e cerca de 240 alunos, 40 deles no último ano, a Patrick Henry tem oito estagiários na Casa Branca neste semestre (cerca de cem estudantes de universidades de todos os Estados Unidos trabalham a cada período no centro do poder do país).
Outros procuram -e encontram- trabalho como assessores de congressistas republicanos ou em importantes centros de estudos conservadores, como a Heritage Foundation, o mais importante "think tank" da direita.
Enquanto passeiam pelos corredores e gramados desse complexo em Purcellville, a pouco mais de uma hora de Washington, no Estado de Virgínia, têm de seguir um código moral estrito: não podem fumar (mesmo ao ar livre) nem beber; ninguém deve beijar em público; mãos dadas só enquanto caminham; as televisões nos dormitórios não pegam a MTV.
E não importa a distância que estiverem das salas em que têm aulas como "os fundamentos bíblicos da liberdade", dos prédios que, com suas colunas gregas, imitam as construções da época da independência do país, da livraria em que podem comprar "Ronald Reagan e Deus: Uma Vida Espiritual", devem manter, segundo os preceitos evangélicos, sua castidade intacta.
"A fornicação é claramente proibida pela Bíblia", diz Robert Stacey, chefe do departamento de ciência política da escola.
Ele reconhece Bush como um aliado da direita cristã. Questionado se o fato de o presidente ser um republicano conservador influencia no número de estudantes da Patrick Henry na Casa Branca, Stacey diz: "É claro. Você poderia encontrar outras faculdades que já tiveram maior presença na Casa Branca. Estão esperando a sua vez".
A relação entre religião e política é clara, também, para ele. "A verdade de Deus está em todos os campos. Não há física secular ou física cristã -é tudo a mesma coisa. Quando estudamos política, estamos estudando idéias que Deus criou. Liberdade e igualdade não podem ser separadas de Deus, são parte da criação."
Além de Bush, ele cita outros fatores que contribuem para o aumento da penetração política do corpo de alunos da faculdade: "A proximidade de Washington e o fato de os fundadores dessa escola já serem desde antes politicamente ativos".
O presidente da instituição, Michael Farris, é também o fundador da Associação de Defesa Legal da Escola em Casa, que apóia o direito de pais insatisfeitos com a escola pública de retirarem seus filhos de lá e ensiná-los em casa.
Scott Woodruff, que integra a associação, enumera entre os motivos de insatisfação da direita cristã com o sistema público de ensino o avanço da educação sexual "liberal" e a queda dos padrões de "disciplina" e qualidade dos colégios. Mais de 90% dos alunos da Patrick Henry, ele diz, foram em algum período de suas vidas educados em casa.
A escola é vista como centro estratégico para as batalhas políticas e culturais que não cessam de acontecer nos EUA -casamento gay, limites ao direito de aborto ou, simplesmente, quantidade de impostos a serem pagos.
"Estamos num momento importante da nossa cultura -as coisas podem ir numa direção ou noutra", afirma Stacey. "Essa é a geração em que isso vai ocorrer."
Integrante dessa geração (na faculdade, todos brancos, anglo-saxões e protestantes), Gabe Ballard, 22, tinha acabado de conseguir um emprego na Heritage Foundation no dia em que conversou com a Folha.
Quando fala sobre política externa, diz que "o mais importante [para os EUA] é defender os próprios interesses". Afirma ainda que os Estados Unidos devem "tomar cuidado" ao lidar com a ONU. "Não devíamos sacrificar nossa segurança, nossos interesses" ao negociar com outros países, declara.
Seus colegas Christy Ross, 21, e Matthew DuMee, 21, namoram. Matthew, que trabalha uma vez por semana no Congresso, com o deputado republicano Trent Franks, teve de pedir autorização ao pai de Christy, que quer trabalhar num "think tank" conservador, para sair com ela.
Ele participa do time de debates da Patrick Henry. Já ganhou alguns torneios, em que duplas têm de, alternadamente, defender tanto a posição contrária quanto a favorável sobre determinado assunto.
"Houve apenas uma vez em que me neguei a argumentar favoravelmente sobre algo", diz. "O tema era sexo antes do casamento. A dupla adversária, ao expor argumentos contrários, disse que cristãos não podem fazê-lo porque a Bíblia diz assim. Não argumentei favoravelmente, disse apenas que o que eles falavam era um truísmo, uma obviedade. É óbvio que cristãos devem seguir a Bíblia. Ganhamos."


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