São Paulo, domingo, 11 de abril de 2010

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Líder indiciado busca legitimação no Sudão

Após 24 anos sem eleições multipartidárias, sudaneses vão às urnas hoje e devem reeleger Bashir, que já governa há 21 anos

Acusado pelo Tribunal Penal Internacional de crimes de guerra, presidente vê seus principais rivais desistirem de candidaturas antes do voto


FÁBIO ZANINI
ENVIADO ESPECIAL A CARTUM (SUDÃO)

Omar al Bashir está sorridente, segurando uma lança na mão direita e vestindo uma pele de leopardo sobre o terno cinza. "Al Bashir. Símbolo de unidade e paz", diz o cartaz, espalhado pelas ruas de Cartum.
O presidente do Sudão não poupou esforços e faz campanha que ocupa 90% dos postes da capital. Sua aposta é um resultado convincente na eleição que começa hoje e vai até terça. Bashir busca, além de prorrogar um governo que já dura 21 anos, um voto de confiança popular um ano após ter sido indiciado pelo Tribunal Penal Internacional por crimes de guerra e contra a humanidade cometidos contra populações da região de Darfur (oeste).
Para isso, ele conta com a ajuda inesperada da oposição. A maioria dos seus competidores retirou-se da disputa presidencial na última semana.
Saíram, entre outros, o Partido Umma, ligado ao influente movimento sufi (braço do islã), e o Movimento de Libertação do Povo Sudanês, que se restringiu a disputar o pleito em sua base, o sul do país.
O governo americano condenou o boicote, e há uma sensação entre observadores internacionais de que a oposição saiu apenas porque antecipou uma derrota arrasadora.
A eleição perdeu parte de seu lustro, mas ainda é possível chamá-la de histórica. É o primeiro voto multipartidário em 24 anos. E pode ser o último do Sudão, maior país da África, como hoje o conhecemos.
Em janeiro de 2011, dez Estados do sul do país farão plebiscito para decidir sobre sua independência. A perspectiva é que daí resulte uma nova nação de 10 milhões de pessoas.
Esse foi um dos pontos-chave do acordo de paz assinado em 2005 entre o norte sudanês, árabe, e o sul, etnicamente mais próximo de países centro-africanos como Quênia e Uganda.
Como diz o cartaz de Bashir, a promessa do presidente é de "unidade", evitando a independência do sul, e paz em Darfur. Há o temor de que a divisão do país desencadeie novo conflito.
O presidente tem outro trunfo na mão, a economia. As margens dos rios Nilo branco e azul, que se juntam no centro de Cartum, aos poucos se transformam em laboratório para arquitetos. Surgem prédios gigantescos, em formatos inusitados, que caberiam na paisagem de Dubai.
No recém-inaugurado Afra Mall, primeiro shopping da cidade, é fácil achar admiradores do presidente. "Toda semana temos delegações de investidores chegando", diz Mohammed el Tayeb, 37, contador no Banco Central sudanês.
No ano passado, mesmo com a recessão global, o PIB cresceu 4%, puxado pela produção de petróleo e investimentos chineses. Em 2010, a previsão do FMI é de aumento de 5,5%.
Nesse ambiente, a preocupação com Darfur, região empobrecida a 1.000 km de distância, é secundária. "A corte internacional é injusta, porque viu a situação de apenas um lado. Bashir nunca teve chance de se defender", diz o policial Mohammed Ahmed Ali, 40.
Na entrada do shopping, outro pôster mostra Bashir sorridente. Mas desta vez a imagem sobrepõe a de empregados do local. "Os trabalhadores do Afra Mall estão ao lado de seu líder, Omar al Bashir, e condenam o indiciamento pela corte internacional", diz o letreiro.


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