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ATRÁS DAS GRADES
População carcerária no país chega a 2 milhões
Número de presos bate recorde nos EUA
MARCIO AITH
DE WASHINGTON
Leis criminais severas e um sistema judicial extremamente conservador fizeram a população carcerária nos EUA chegar a 2 milhões de presos neste ano, a maior
do mundo tanto em termos absolutos quanto proporcionais e um
recorde histórico.
Essa explosão carcerária nos Estados Unidos representa uma população atrás das grades que
equivale à população de países inteiros, como a Eslovênia, ou de cidades como Salvador (BA).
Os governos federal e estaduais
dos EUA gastam hoje cerca de
US$ 40 bilhões para construir e
manter presídios, pagar os 600
mil funcionários e alimentar os
presos. Isso representa quase
duas vezes o valor do PIB (total de
riquezas produzidas) do Uruguai.
Em Estados como a Califórnia,
na Costa Oeste do país, gasta-se
mais hoje para cuidar dos detentos do que em educação.
O número de presos nos Estados Unidos chegou a tal nível que
passou a afetar indicadores básicos da economia norte-americana e acabou por transformar a população carcerária numa das mais
cobiçadas fontes de lucros para a
iniciativa privada.
Incapazes de compor a força de
trabalho oficial no país, os 2 milhões de encarcerados são considerados tão vitais para manter
baixo o índice de desemprego estatístico quanto o desempenho da
economia.
Economistas dizem que, se os
níveis de encarceramento fossem
hoje iguais aos que eram há dez
anos, quando havia apenas 700
mil presos, a taxa de desemprego
no país, que atualmente está em
torno de 4%, já estaria se aproximando de 6% e, talvez, tivesse até
influenciado a política de juros
praticada pelo Fed (o banco central dos EUA).
"Trata-se de um mundo que
costumava ficar esquecido do
mundo real. Mas ele ficou tão
grande que passou a afetar toda a
população norte-americana, disse à Folha Allen Beck, estatístico-chefe do Departamento de Justiça
dos Estados Unidos e responsável
pelo censo nos presídios.
Beck considera que, hoje, "é
praticamente impossível encontrar alguém do lado de fora que
não seja parente ou que não conheça um preso ou um funcionário de um presídio".
Pelas grandes possibilidades de
lucro que oferece, o sistema carcerário despertou imediatamente a
atenção do setor privado dos Estados Unidos.
O interesse corporativo nos
condenados vai muito além de
atividades tradicionalmente ligadas ao sistema carcerário, como a
construção e a administração privada de presídios -que hoje é
um dos negócios mais lucrativos
nos Estados Unidos e um modelo
que começa a ser exportado para
diversos países.
Lucro com orelhões
Um exemplo das ricas possibilidades de lucros está sendo dado
pela disputa de empresas telefônicas para colocar orelhões dentro
dos presídios. Como os presos só
podem se comunicar com o mundo externo por telefone e por
meio de ligações a cobrar, um
único orelhão instalado dentro de
uma prisão norte-americana dá
ao seu dono um faturamento estimado de US$ 15 mil, cinco vezes
maior do que aquele obtido de
orelhões de rua.
A empresa que detém o monopólio dos telefones nos presídios
da imigração americana, a RCNA,
cobra US$ 22 por uma chamada
de 15 minutos da Costa Leste para
a Oeste. A imigração leva 35%
desse valor. A AT&T, a Sprint e a
MCI cobram dos presos e de seus
familiares seis vezes o custo normal de uma chamada de longa
distância dentro dos EUA.
Duas companhias, formadas
por ex-agentes penitenciários e
militares, estão controlando a administração de presídios nos EUA
e acumulando lucros altos.
A líder de mercado, a Corrections Corporation of America, administra 6% (ou 120 mil presos)
de toda a população carcerária no
país. Ganha diretamente do Estado cerca de US$ 25 por preso, ou
US$ 3 milhões por mês.
Mas seus lucros não se limitam
a isso. As leis dos Estados Unidos
permitem que elas vendam a
mão-de-obra dos detentos para
companhias privadas e negociem
com empresas de telefone.
As razões que produziram essa
explosão carcerária remontam ao
começo da década de 90, quando
novas leis antidrogas dobraram
as penas e retiraram benefícios judiciais a reincidentes. Entre os
anos de 1990 e 1999, a taxa de encarceramento aumentou de 1 para cada 218 residentes nos Estados
Unidos para 1 em cada 147.
Para reforçar essa tendência, a
taxa de condenação da Promotoria federal dos Estados Unidos
passou de 57% no começo da década para 87% hoje. É a mais alta
da história.
O perfil da população carcerária
reflete os problemas da sociedade
norte-americana como um todo e
castiga especialmente as minorias. Dentro da população de homens entre 20 e 39 anos, estima-se
que 11% dos negros, 4% dos hispânicos e 1,5% dos brancos estejam na cadeia.
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