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ARTIGO
"Realistas" de Washington miram Moscou
DANIEL VERNET
DO "MONDE"
Os Estados Unidos estudam
uma mudança em sua estratégia global, com o objetivo de resolver a crise nuclear iraniana.
O chamado clã dos "realistas",
que ganhou força no Departamento de Estado, considera o
Irã o problema mais importante para a diplomacia americana
e acha todas as soluções propostas são más. Assim, busca
uma saída da alternativa -"catastrófica", como diz Nicolas
Sarkozy- entre "bombardear o
Irã ou aceitá-lo com a bomba".
A primeira hipótese é defendida pelo vice-presidente Dick
Cheney. A segunda, rejeitada
pelos "realistas" -assim como
a primeira- corre o risco de se
confirmar se o Irã não renunciar ao programa nuclear. A
busca da terceira via passa por
Moscou, como nos bons velhos
tempos do mundo bipolar.
Não é por acaso que os diplomatas da escola Kissinger vêm
retornando ao primeiro plano,
depois de marginalizados pelos
neoconservadores após o 11 de
Setembro. Seu raciocínio é o seguinte: após os muitos reveses
sofridos no Oriente Médio, os
EUA não podem se permitir
um novo fracasso com Teerã.
Os russos, que não têm interesse em ter um Irã nuclearizado,
deveriam mostrar-se mais cooperativos. Putin, aliás, seria
mais firme com o Irã do que
suas declarações levam a supor.
Putin é também mais flexível
com os EUA reservadamente
do que em público. O discurso
da tensão lhe é útil internamente; porém, os russos vêm
demonstrando algum interesse
pelas propostas feitas pela EUA
em relação ao escudo antimísseis e ao Tratado sobre Forças
Convencionais na Europa
(FCE). Para assegurar-se da
cooperação de Moscou sobre o
dossiê iraniano, os EUA deveriam ser menos rígidos em relação a outros temas ligados ao
leste da Europa. Essa é a tese
dos "realistas".
Bob Blackwill, conselheiro
de Condoleezza Rice no Departamento de Estado, desenvolveu a tese numa conferência
trilateral em Viena. Entre os temas que, para os americanos,
podem ser secundários se comparados ao Irã, merecem ser recordados: o Kosovo e a Geórgia.
Em relação ao primeiro,
Washington poderia mostrar
menos pressa em reconhecer a
independência da Província e
buscar um entendimento com
a Rússia. Quanto à Geórgia, ela
procura obter o chamado Plano
de Ação para tornar-se membro da Otan, a aliança militar
ocidental. Os EUA tinham previsto entregá-lo na cúpula da
Otan de abril de 2008. Agora,
Tbilisi corre o risco de ser vítima da troca de favores entre
Washington e Moscou.
O sucesso dessa estratégia
depende das "linhas vermelhas" fixadas pelas partes. A
ampliação da Otan rumo ao leste era uma da linhas para a Rússia. Será que ela a abandonará
em troca de concessões sobre
outros pontos controversos, ou
mesmo de uma partilha de poder com os EUA e os europeus
em assuntos do velho continente? O chanceler russo, Serguei Lavrov, não economiza
elogios à "troika" que negocia
sobre o Kosovo, como se ela
prefigurasse o diretório a três
na Europa que Moscou deseja
desde a queda do comunismo.
Essa abordagem reforçaria o
presidente russo, consagrando
sua tática de tensão controlada
com o Ocidente. Para os defensores do "realismo", esse é o
preço a pagar. Mas não é certo
que Bush esteja disposto.
Tradução de CLARA ALLAIN
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