São Paulo, segunda-feira, 12 de janeiro de 2004

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LUTA PELO PODER

Grupo do presidente Khatami acusa conservadores, liderados pelo aiatolá Khamenei, de golpe pré-eleitoral

Irã cassa 2.000 candidaturas reformistas

Behrouz Mehri /France Presse
Deputados reúnem-se em protesto à cassação de reformistas


DA REDAÇÃO

A ala reformista do regime iraniano desencadeou ontem uma batalha política por sua própria sobrevivência, depois que pelo menos 2.000 de seus candidatos foram proibidos de participar da eleição de 20 fevereiro que renovará o Parlamento.
A proibição partiu do Conselho de Guardiães, instância suprema da República islâmica e cujos 12 integrantes foram todos nomeados pelo aiatolá Ali Khamenei, líder espiritual xiita e chefe da ala conservadora do regime.
Entre os vetados está Reza Khatami, irmão do presidente Mohammad Khatami. Reza Khatami dirige a Frente Iraniana de Participação Islâmica, o mais forte partido da coligação reformista.
O veto às candidaturas, que atingiu 80 dos 290 deputados que disputariam a reeleição, foi ontem qualificado de "golpe de Estado" pela bancada reformista. Em rota de atrito com os conservadores, ela entrará com recurso no Judiciário e tentará no mínimo forçar o adiamento das eleições.
"Não acredito que essa forma de fazer política seja compatível com os princípios do islamismo e da democracia", declarou o presidente Khatami, que chegou ao poder em 1997 eleito com uma plataforma reformista. Ele disse que discutiria as cassações com Khamenei, líder religioso máximo do Irã, e com o conselho.
Um porta-voz do conselho, citado pela agência Irna, disse que 2.030 dos 8.200 candidatos haviam sido vetados, mas deputados reformistas dizem que a cifra verdadeira é bem maior.
Circula entre os reformistas a informação de que os deputados cujas candidaturas foram vetadas são os mesmos que nos últimos meses escreveram cartas ao aiatolá Khamenei, exortando-o a adotar reformas democráticas.
Com a decisão do Conselho de Guardiães de cassar a candidatura dos reformistas proeminentes, cerca de 70 integrantes da bancada tomaram o plenário do Parlamento e disseram que poderiam boicotar as eleições.
Integristas, liderados por Khamenei, e reformistas, encabeçados por Khatami, participam de uma queda-de-braço desde que o segundo conquistou a Presidência da República islâmica.
Os reformistas são maioria no Parlamento, mas vários projetos arejantes, como o de maior liberdade de expressão, não entraram em vigor, em razão do veto do Conselho de Guardiães.
Os reformistas procuram modernizar as instituições, reforçar o poder dos tribunais laicos e abrandar a legislação moralizante que o aiatolá Khomeini impôs, em 1979, ao tomar o poder.
Mas os integristas islâmicos ganharam espaço político após os EUA invadirem o Iraque. A ênfase na defesa do território pátrio, sagrado para os xiitas, cresceu em razão da hipótese de o Irã ser o objetivo seguinte do presidente George W. Bush.
Há ainda a disputa entre uma concepção teológica do poder, segundo a qual Khamenei deve satisfação só a Deus, e uma concepção laica, para a qual ele e os demais dirigentes precisam sofrer o controle da sociedade.
Reformistas e integristas voltaram a se confrontar há pouco mais de três semanas, durante o terremoto em Bam. O aiatolá Khamenei se opunha à presença de equipes humanitárias estrangeiras, sobretudo dos EUA, e o presidente Khatami acreditava que a tragédia era uma oportunidade de quebrar o isolamento internacional de seu regime.

Com agências internacionais


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