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EUA
Após servir como porta-voz do regime radical afegão deposto em 2001, Sayed Hashemi causa polêmica como estudante
Ex-membro do Taleban vira aluno de Yale
LEILA SUWWAN
DE NOVA YORK
Sayed Rahmatullah Hashemi,
27, está acostumado a bombardeios. Aos quatro anos, fugiu do
napalm da invasão soviética ao
Afeganistão. Aos 22, dos mísseis
norte-americanos em Candahar,
mais uma vez se refugiando no
Paquistão. Mas não estava pronto
para o bombardeio midiático que
iria enfrentar na sua nova vida
nos EUA, estudando na prestigiosa Universidade de Yale.
Depois de cursar um semestre
despercebido, foi descoberto há
duas semanas pelo "New York Times" e virou "o taleban de Yale".
Hashemi, de fato, foi embaixador
itinerante do regime Taleban e esteve nos EUA defendendo o tratamento dispensado às mulheres, a
destruição de estátuas budistas de
1500 anos e o asilo dispensado a
Osama Bin Laden apenas meses
antes dos atentados do 11 de Setembro. Hoje, é "aluno especial"
da faculdade que educou o presidente George W. Bush.
"De certa forma eu sou a pessoa
mais sortuda do mundo. Poderia
ter ido parar em Guantánamo,
mas acabei em Yale", disse Hashemi ao "Times".
Agora Hashemi se recusa a falar
com a imprensa. Não respondeu
aos contatos feitos pela Folha por
meio de colegas. A universidade
se recusa a intermediar contatos.
Encontrado no campus pela rede
de televisão conservadora Fox
News, ameaçou chamar a polícia
para preservar sua privacidade.
Não sem motivo. Ele é o centro
de uma polêmica no campus sobre o "benefício de sua presença".
Senadores questionam a concessão do seu visto. E a própria Fox
dedicou horário nobre a ataques.
Da túnica e turbante à mochila e
calça jeans, a trajetória de Hashemi ficou apagada no fogo cruzado. É descrito como "porta-voz
do aparato terrorista" ou "amigo
de Bin Laden". Yale é agressivamente criticada por excessos em
seu pluralismo e liberalismo, não
menos porque Hashemi seria
"desqualificado" -estudou apenas até a quarta série antes de freqüentar uma madrassa islâmica.
Uma passagem do documentário "Fahrenheit 9-11", de Michael
Moore, foi repetida à exaustão.
Nela, o jovem e mais barbudo
Hashemi, em visita oficial aos
EUA em março de 2001, rebate
uma ativista que o questiona sobre a violência do Taleban contras
as mulheres: "Tenho pena do seu
marido. Você deve dar muitas dificuldades a ele".
A Fox estimula a expulsão de
Hashemi. "O "sr. Taleban" precisa
ir. Yale precisa mandá-lo embora
agora. Sem um certificado de um
instituto de desprogramação
[mental], não há lugar para ele na
América", disse o comentarista
John Gibson.
"Esperamos que os cursos ajudem [Hashemi] a entender o contexto amplo de conflitos mundiais", disse a Yale em comunicado. "Esperamos que os críticos reconheçam que universidades são
lugares que precisam lutar para
aumentar o entendimento, especialmente a respeito dos temas
mais difíceis que a nação e o mundo enfrentam."
Procurada, a universidade não
quis dar maiores esclarecimentos.
Hashemi foi aceito em um programa especial que concede créditos universitários, mas não é
aluno de graduação. Muitas faculdades de artes liberais dos EUA
avaliam que experiência profissional ou de vida podem substituir estudos formais, contanto
que outros requisitos sejam
preenchidos. Seu visto foi concedido pelo governo do país.
Se hoje precisa se esquivar de repórteres e do debate incendiário
de seus colegas sobre patrulhas
ideológicas e suas supostas ligações terroristas, Hashemi era antes um aluno discreto e, segundo
o "Times", grato pela oportunidade de mudar sua vida e oferecer
um futuro melhor para a família
-sua mulher e dois filhos vivem
em Quetta, no Paquistão.
Ele mora fora do campus, janta
no refeitório kosher e faz aulas como "Terrorismo: Passado, Presente e Futuro". Tenta driblar o
deslocamento cultural, os coloquialismos da língua e os formalismos acadêmicos.
Desde a última vez em que esteve em Yale, há cinco anos, para
defender o Taleban em um debate, argumenta que muita coisa
mudou. Disse ter sido um diplomata jovem e idealista, recrutado
pela chancelaria como tradutor.
Depois do exílio na infância, ingressou no Taleban com 16 anos
(declarou ter 18) porque via o grupo como uma força estabilizadora
depois da retirada soviética, num
país destroçado pela guerra que
foi parcialmente financiada pelos
EUA, aliados dos mujahidin.
Subiu os escalões rapidamente e
fez muitos contatos -do jornalista americano que o ajudou a
chegar a Yale ao próprio Bin Laden, que viu palestrar em 1998,
após os atentados da Al Qaeda às
embaixadas dos EUA na África.
Hashemi conta que, já como
embaixador itinerante, começou
a questionar as defesas que fazia
de seu governo e teve desentendimentos ao retornar da viagem aos
EUA. Não passou muito tempo e
as Torres Gêmeas foram destruídas. A chancelaria debandou e
Hashemi fugiu para o Paquistão.
Só teve a ficha "liberada" depois
de diversos interrogatórios de autoridades americanas em Cabul,
em que explicou não ser associado às alas radicais do Taleban e
sim ligado a ex-chanceler do regime, Wakil Ahmed Mutawakil,
considerado um moderado.
O ano letivo em Yale acaba em
dois meses, e Hashemi se refugiará no Paquistão esperando saber
se a faculdade vai resistir às pressões e aceitar sua matrícula formal como candidato a um dos
mais cobiçados diplomas universitários dos EUA.
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