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SILÊNCIO
Falta de pistas sobre o arsenal de Saddam, um dos motivos da guerra, faz a coalizão evitar o assunto
EUA "esquecem" armas proibidas
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Estados Unidos e Reino Unido
não se declaram frustrados por
não terem ainda encontrado os
supostos arsenais de armas químicas e bacteriológicas, evocados
como primeiro pretexto para a
ação militar contra o Iraque.
Desde quarta-feira, quando tropas dos EUA tomaram conta de
Bagdá, as armas de destruição em
massa são raramente evocadas
pela coalizão anglo-americana.
Anteontem, em sua mensagem
pela TV iraquiana, o presidente
George W. Bush disse de forma
bastante genérica que os objetivos
da coalizão eram limitados: "poremos fim a um regime brutal, cuja agressividade e armas de destruição em massa fazem dele uma
ameaça singular para o mundo".
O assunto foi indiretamente
evocado, ontem, no briefing de
Ari Fleischer, porta-voz da Casa
Branca. Um jornalista perguntou
quando Bush oficializaria a vitória norte-americana na guerra. O
porta-voz respondeu que o problema estava associado aos objetivos de de desarmar o Iraque e libertar o povo iraquiano.
Como o jornalista insistisse que
"desarmar" significava identificar
arsenais químicos e bacteriológicos, Ari Fleischer desconversou.
O diálogo está no site da Casa
Branca. Nenhuma agência de notícias considerou relevante transformá-lo em despacho. É como se
os supostos arsenais de armas
proibidas fossem um tema jornalístico já meio fora de moda.
Em meio ao fluxo ainda imenso
de despachos sobre o Iraque, dois
personagens de menor escalão tocaram ontem no assunto. O embaixador do Reino Unido na
França, John Holmes, declarou-se
preocupado com a possível emigração de cientistas envolvidos
nos programas de material bélico
do Iraque, o que permitiria que
outros países produzissem armas
bacteriológicas e químicas.
Por sua vez, o general britânico
Adam Ingram disse que a operação de busca ainda levaria algum
tempo, porque estaria na dependência de indicações a serem fornecidas por cientistas iraquianos.
Tal roteiro foi evocado ao longo
da guerra por militares norte-americanos, em meio a falsas pistas sobre a localização dessas armas e a patética confusão, em Najaf, de agentes químicos com o
que, em verdade, tratava-se de
produto fertilizante.
O comando das operações, no
Qatar, repetiu reiteradamente que
as armas "poderiam" ser utilizadas quando as tropas estrangeiras
penetrassem em Bagdá. Isso não
ocorreu. Por três possíveis razões:
Saddam e seu Estado Maior já haviam desmoronado, usar armas
químicas daria aos anglo-americanos a justificativa para a guerra,
ou, o que é também possível, essas
armas não existiam.
A localização de máscaras iraquianas de proteção contra gases
tóxicos mereceria duas interpretações. A propaganda norte-americana disse ser uma "prova" de
que Saddam utilizaria tais armas.
Mas a lógica também deixa aberta
a hipótese de os iraquianos acharem que os EUA poderiam fazê-lo, como forma de atribuir o arsenal ao inimigo e com isso justificar a invasão do Iraque.
Na última terça-feira, o jornal
inglês "The Guardian" publicou
um texto de ceticismo até um
pouco agressivo. Relata, por
exemplo, que 12 locais altamente
suspeitos já foram analisados,
sem sucesso, pelas tropas anglo-americanas.
O jornal também lembra que o
general Hussein Kamel, que caiu
em desgraça e se exilou em 1995,
disse à ONU que, sob sua supervisão, os arsenais químicos teriam
sido destruídos.
Eles podem ter sido em tese refeitos, mas não há provas de que
isso tenha ocorrido. Hans Blix,
chefe dos inspetores da ONU, disse esta semana em entrevista ao
jornal "El País", reproduzida pela
Folha, que, antes da guerra, sua
equipe vasculhou com cuidado
todos os locais indicados pelos
serviços norte-americanos de inteligência. Nada encontrou.
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