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ANÁLISE
Bombas "boas" e bombas "ruins"
NEWTON CARLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA
Há bombas "ruins", como as
que o Irã pretende ter, segundo a
inteligência ocidental, e bombas
"boas", como as da Índia, legitimadas na prática pelo acordo que
o presidente George W. Bush assinou com os indianos. Foi o que
disse alguém com ironia em Washington.
Categorias que tiveram maior
visibilidade com a reunião, em
Nova York, de diplomatas e especialistas de 182 países para ver como andava o Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP). Data
de 1968 e nasceu com a missão de
tornar-se o principal instrumento
de contenção do que a ONU considera a maior ameaça à humanidade, a vulgarização das armas de
destruição em massa.
Os EUA caem em cima dos alvos de sempre, Irã, Coréia do
Norte etc. É o terreno das bombas
"ruins". Mas o tratado não contém somente cláusulas de bloqueio do acesso de novos países
ao "seleto" clube nuclear. Com
suas assinaturas as potências fundadoras se comprometeram a reduzir seus arsenais de modo gradativo, até a eliminação total.
Nada disso se cumpre. As portas do clube são violadas, com os
"bons" gozando de tolerância.
Não importam as leis, importa o
comportamento, observou um
colunista americano. As bombas
pretendidas pelo Irã entram na
categoria de "ruins", intoleráveis,
porque os aiatolás iranianos são
"desestabilizadores".
A Índia, pelo contrário, e também Israel e outros detentores ou
possíveis detentores de bombas
"boas", toleradas, cumprem rituais de "estabilização" com uma
arquitetura desenhada sobretudo
pelos EUA. Mas o perigo maior é
outro, alertou um ex-secretário de
Defesa dos EUA, Robert McNamara, em artigo de capa na "Foreign Policy" intitulado "Apocalypse Soon". Ou o Apocalipse
que nos ronda. McNamara chama a política armamentista americana de "imoral, ilegal, militarmente desnecessária e perigosa".
O arsenal nuclear (4.500 ogivas
ofensivas) é mantido como o
componente principal do poder
militar americano.
O ilegal é o não respeito à cláusula de redução do TNP. O imoral
se supõe que seja o poder conferido a uma pessoa, o presidente dos
EUA, para ordenar disparos atômicos. Mas eles podem também
acontecer por acidentes e esse é
um dos riscos maiores, segundo
McNamara.
Há tonalidades de desespero em
seu artigo, a partir da convicção
de que os EUA, com sua política
de armamentismo atômico, constituem a idéia de um "Apocalypse
Soon" e, ainda por cima, num
contexto de irrelevância militar.
Atacar um poder nuclear "seria
suicídio". Fazê-lo contra inimigo
não nuclear "seria militarmente
desnecessário, moralmente repugnante e politicamente indefensável".
A B61-11, engenho nuclear da
categoria arrasa-quarteirão, pode
ser relacionada como prova de
que os EUA desenvolvem novas
armas atômicas, em desrespeito
às regras do tratado de 1968. Engenhos "bons", na visão oficial
americana.
Em duro artigo de condenação
ao "perigoso" acordo com a Índia, o ex-presidente Jimmy Carter
lembrou que nos últimos cinco
anos (referência indireta ao governo Bush) os EUA abandonaram muitos dos acordos de controle de armas nucleares negociados desde os anos 50. A "legitimização", na prática, do acesso indiano ao clube das potências nucleares "é mais um passo na abertura da caixa de Pandora da proliferação nuclear". Véspera do vale-tudo nuclear.
O jornalista Newton Carlos é analista de questões internacionais
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